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COM MEUS BOTÕES...

Criação e colaboração do Diácono José da Cruz de Votorantim-SP, Contos com diálogos do sonhador - O Dreamer - com o velho e sábio botão - O Marechal.

Índice desta página:
. LIBERDADE
. NAMORO
. LAÇOS DE FAMÍLIA
. AÇÃO EFICAZ
. DOCES LEMBRANÇAS
. CAMINHOS
. A NECESSIDADE DO POBRE


LIBERDADE

Morreu no último sábado o Tonho Bode, como era mais conhecido, principalmente na Barra Funda onde circulava, manquitola nos últimos tempos, apoiado em um porrete, utilizado como bengala.

Eu refletia sobre sua vida, quando vi as crianças saindo à tarde da escola da Barra Funda, algumas com cara de desapontadas porque não iriam mais “aporrentar” o andarilho, que ao ser insultado, batia enfezado com o porrete na calçada.

___Olha Botão, será que esse homem foi feliz, sendo quase a vida toda um mendigo caminhante?

___O que você sabe sobre ele? --- perguntou-me Marechal, sentado na beira do bolso.

Em segundos veio-me a lembrança breves contatos que tive com ele, eu o chamava de Senhor Antonio, para conquistar a sua confiança, dei-lhe um prato de comida em um final de ano, que ele colocou em um saco de plástico imundo, para comer depois, conforme falara. Arranjei-lhe um porrete novo, porque alguém por malvadeza tinha dado sumiço no que usara. Certa noite de chuva dei-lhe uma carona e ele, após alguns minutos dentro do carro começou a gritar que eu ia jogá-lo no rio, e tive de desembarcá-lo no meio da chuva.

___Muito pouco sei sobre ele, que tinha uma família que tentou ajuda-lo de muitas formas, mas ele nunca quis ajuda, parece que sentia prazer em vagar ao léu, sem eira nem beira, dormindo às vezes onde a cachaça o derrubava.

___Está explicado então --- comentou Marechal --- era uma opção de vida do Senhor Antonio.

___Mas Botão, que coisa mais absurda optar em viver desse jeito?

___A sociedade tem suas regras e normas sociais, que estabelece padrões de vida, até para os mais pobres, quem desconhece ou ignora esse padrões de conduta, são considerados loucos e desajustados.

___ E o Tonho Bode era exatamente o que? ---Perguntei em tom provocador.

___ Era um homem livre que rastejava pelas ruas uma aparente miséria, preço da sua liberdade. Deve ter morrido feliz, porque fez na vida aquilo que mais lhe dava gosto, e nunca o que a sociedade lhe quis impor.O padrão de felicidade, baseado no Ter e no Poder, nunca seduziu o Senhor Antonio.--- concluiu Marechal, já no fundo do meu bolso.

O Dreamer
odreamer05@yahoo.com.br


NAMORO

Lendo o jornal deparei com um anúncio do dia dos namorados, onde aparecia um casal de namorados de mãos dadas, tendo à frente uma estrada ladeada de flores e uma frase sugestiva “Viver a dois é maravilhoso”.

___Olha aí Marechal, domingo é Dia dos Namorados, hoje em dia já nem se fala mais em namoro, mas apenas em “ficar”, o namoro deixou de ser meio para ser um fim.

___E isso é muito grave! ----argumentou o Velho Botão --- pois um namoro leviano deixa marcas dolorosas na vida dos jovens, alguns sofrem o resto da vida por conta das desilusões amorosas.

___Qual a melhor definição para o namoro?

___O namoro é uma fase de conhecimento, uma fase de aprendizado para a vida a dois.

___Ah Marechal, você está falando daqueles namoros à moda antiga, quando o jovem corava e gaguejava ao chegar perto da menina. Hoje em dia, a banalização da sexualidade fez o namoro perder o encanto!

O Botão não respondeu e desceu ao fundo do bolso interrompendo o debate. Mais tarde quando caminhava, avistei uma garça branca que sobrevoava toda a extensão do córrego Cubatão .
___Você já leu “Fernando Capelo Gaivota?” --- perguntou Marechal subitamente.

___Já li sim, essa pergunta é por causa da Garça branca que acabamos de ver?

___Não! --- respondeu Marechal --- é por causa do namoro, lembre-se da gaivota, ainda filhote, ensaiando os primeiros passos para o vôo na praia, narrados no livro.

___Lembrei-me! Mas depois, já adulta, ela supera suas irmãs, dando vôos rasantes mergulhando no infinito.

___Pois aí está --- filosofou Marechal --- no namoro ensaiam-se os primeiros vôos de um amor aparentemente fútil e leviano, exercita-se o coração para viver o amor na sublimidade que a vida a dois irá exigir no futuro .Os que aprendem a lição no namoro, constroem uma relação sólida, fundamentada no respeito, na comunhão de vida, e assim, como a gaivota, ganham as alturas do infinito sem medo dos desafios que virão.

___Espere Botão, e quando o namoro torna-se banal, causando as desilusões que você falou?

Marechal subiu a beirada do bolso e arrematou:
___Nesse caso, eles trocam um amor sublime por uma paixão fútil, levados pelo sentimento mesquinho, que faz do amor uma posse e nunca uma entrega. Esses serão eternamente filhotes de gaivota, atolados na lama da praia, nunca alcançarão o infinito, nem saberão que gosto tem o verdadeiro amor.

O Dreamer
odreamer05@yahoo.com.br


LAÇOS DE FAMÍLIA

Almoçava em um restaurante de certo nível, durante uma viagem, sendo que em uma mesa próxima, uma família tomava refeição. Em um dado momento percebi no rosto do pai um certo desconforto, porque o filho, estudado a se julgar pelo fino trato e conduta esmerada, lhe havia chamado a atenção por ele não estar se portando com a necessária educação ao manejar talheres e comer com a boca aberta, como um matuto.

___Veja Marechal --- falei ao Botão, que repousava no fundo do bolso --- as pessoas estão botando reparo no jeito macuco do pai comer, e o filho, provavelmente algum doutor a e julgar pelo anel de formatura no dedo anular, está morrendo de vergonha.

O Velho Botão subiu à beira do bolso para prestar atenção na cena que eu descrevera, e comentou:
___Que coisa mais feia e triste!

___Coisa feia mesmo! Esse pai deveria ter uma conduta melhor, para não envergonhar o filho. ---Emendei bastante provocativo.

Então o Botão teve um daqueles acessos de tosse por causa da sua indignação e argumentou:

___O pai deve ser de origem bem humilde vindo da roça, e sabe-se lá o sacrifício que o pobre diabo não deve ter feito, para que o filho pudesse estudar.

Eu já imaginava como a conversa iria terminar e resolvi por mais lenha na fogueira:
___Está certo Marechal, mas agora o filho é um doutor, de uma educação esmerada, enquanto que o pai continua um macuco ou um “Jeca”, como se diz agora.

O Botão olhou atentamente para a mesa, onde o pai, com ares de zanga, já estava em pé para deixar o local por não se sentir à vontade, e arrematou:

___As regras de educação, boa maneira e etiqueta são importantes no convívio social mas o amor, o afeto, a admiração e o respeito, devem estar nas relações familiares, acima de qualquer norma ou etiqueta pois o filho não deveria causar nenhuma mágoa no coração daquele que lhe deu a vida!

O Dreamer
odreamer05@yahoo.com.br


AÇÃO EFICAZ

Reparando nas cenas apelativas de erotismo, em uma das novelas durante o chamado horário nobre da TV, manifestei a minha indignação puxando conversa com o Marechal, que já estava pronto para o repouso da noite;

___Olha só Marechal, que pouca vergonha! Será que os diretores dessa novela não pensam que nesse horário há crianças e adolescentes diante da tela? Será que eles não pensam que a banalização do sexo destrói valores da família? Onde está a censura?

___Que ataque de moralismo é esse? As cenas só vão ao ar porque tem anunciantes e patrocinadores! – respondeu o Velho Botão, que não parecia interessado na conversa.

___E por que eles bancam um horário que exibe cenas como essa?—perguntei exaltado.

O Botão deu um sorriso irônico e comentou:
___Porque o Ibope nesse horário é alto, e a audiência das novelas puxa os anunciantes e uma coisa leva a outra.

___Pois é meu caro Botão, e o Telespectador que nada tem a ver com tudo isso, além de ser bombardeado com as propagandas, também tem a sua casa invadida por essas baixarias...

Marechal, que até então estava no fundo do bolso, subiu até a beirada gesticulando muito:
___Pois o Telespectador tem tudo a ver! Ele é o principal responsável!

___Espere Marechal, o telespectador é vítima e não réu! Há algo que eu possa fazer para acabar com o problema?

___Sim senhor, dá para acabar com o problema agora mesmo, é só você querer! - rebateu Marechal

___Ligar para a emissora e reclamar? Denunciar ao Ministério das Comunicações? Falar direto com o Presidente da República? Organizar uma passeata de protesto? Explique-me como?

Então o Velho Botão começou a descer lentamente ao fundo do bolso e arrematou:


___Essas ações ajudariam, mas não seriam uma solução imediata para o problema. Pegue o controle remoto e desligue o aparelho! Faça primeiro o que está ao seu alcance, só depois pense em uma ação em conjunto. O sistema irá a falência, se não tiver consumidor!

O Dreamer
odreamer05@yahoo.com.br


DOCES LEMBRANÇAS

Faço a minha caminhada em uma tarde de verão e como sempre, corto caminho pelo atalho atrás do terminal rodoviário, observando o rio Sorocaba que mais à frente se encontra com o córrego Cubatão, que vem dos lados da Barra Funda. Garças brancas voam por sobre as águas espreitando algum peixe. No trecho seguinte, sempre há pescadores no lazer agradável de final de tarde.

___Olha Marechal, aonde há pescadores e garças brancas sobrevoando, é sinal de vida nas águas do rio, parece que o velho “Sorocaba” remoçou, não é?

O Velho Botão, que durante a caminhada sempre fica postado na beira do bolso, colocou os óculos para enxergar melhor e concordou:

___Pois é, parece que o homem está criando juízo, com certeza vai demorar mais um pouco, para consertar o estrago que ele fez na natureza, ao poluir rios, lagos e fontes. O importante é que haja uma consciência permanente sobre essa questão e que ninguém se acomode.

Ficamos alguns instantes em silêncio enquanto prosseguia com a minha caminhada e quando passei pela antiga esquina das ruas Albertina Nascimento e Tarcísio Nascimento, recordei-me da casa paterna, que ficava naquela esquina e tinha ao fundo o bambuzal, onde me divertia na beira do rio.

___Olha Marechal, bem nesse lugar era o quarto onde eu dormia --- disse, apontando onde estava um carro estacionado --- ali ficava o corredor e a cozinha, e lembro da minha mãe, com seu tamanco barulhento naquele ploc-ploc de vai e vem pelo corredor.

E assim, nesse saudosismo reconstruí na lembrança a casa de número 280, das festas e bailes animados pela sanfona do mano mais velho, do violão do Carlito e do pandeiro do Vico.

___As lembranças são boas ou ruins? – quis saber o Botão.

___São boas --- respondi, suspirando saudoso, lembrando de mamãe, rodopiando pela sala com meu pai, dançando “Branca” – Valsa de Zequinha de Abreu, e prossegui a caminhada deixando para trás os anos 60.

___Feliz o homem que tem boas lembranças da infância e da família! Mas é melhor buscar a felicidade no dia de hoje, porque esse passado nunca mais voltará, e o dia de amanhã, nunca se sabe se vai chegar. – concluiu Marechal.

O Dreamer
odreamer05@yahoo.com.br


CAMINHOS

No último domingo, enquanto caminhava, notei o grande número de pessoas que vão as igrejas, dos mais diferentes credos e denominação religiosa, como todas essas pessoas também eu tenho essa mesma prática, que vem da infância, ensinado por meus pais.

____ Marechal, todas essas pessoas são boas e buscam o Bem, acho que só no final iremos saber quem estava no caminho certo, porque religião e futebol, não se discute, não é?

O Velho Botão olhou para dois grupos, que vinham de igrejas diferentes, e depois me disse, quando passávamos na Praça José Ermírio de Moraes.
___Pegue duas folhas daquela árvore ali à frente!

Obedeci ao Botão e com as duas folhas na mão, indaguei;
___Pronto, estão aqui, e agora?

___Examine com cuidado e veja se elas são igualzinhas ---- pediu-me.

Examinei atentamente e respondi:
___Bom, há algumas diferenças na textura das folhas, e nas ramificações de suas nervuras, mas o que isso tem a ver com o assunto em debate?

Marechal ajeitou os óculos que lhe caiam na ponta do nariz e argumentou:
___Examinadas em um microscópio, as folhas apresentarão outras diferenças maiores, e alguém que desconheça a sua origem, pensará que elas não são de uma mesma árvore.

___Hum...Você quer dizer que elas são iguais, porém diferentes ao mesmo tempo?

___Exatamente! --- disse Marechal – o sêmen do Bem foi espalhado pelo mundo, nas diferentes culturas e tradições, correntes filosóficas e religiosas, e essa semente é tão eficaz, que até quem afirma não crer em nada, busca esse Bem, de maneira incansável, por isso ---- finalizou o Velho Botão --- o diálogo é importante, porque leva as pessoas a descobrirem que, por caminhos diferentes, todos buscam o mesmo Bem, porque são todos de uma mesma árvore, alimentados por uma mesma seiva que provém de um único Ser supremo.


A NECESSIDADE DO POBRE

Perdi o sono pela madrugada, já quase no amanhecer, e tendo levantado iniciei com o Marechal um acalorado debate sobre a necessidade do pobre.

___Prá mim, não há necessidade maior que alimentação e moradia! Se a pessoa não se alimentar, não viverá! Veja, por exemplo, a história da família do Sêo Antonio, que um grupo de pessoas do bairro se reuniu para ajudá-lo.

___Sim, não resta a menor dúvida de que essa mobilização em torno da família do sêo Antonio é de fato muito bonita, mas não é esse o foco da nossa discussão.- disse Marechal.

___Claro que é! O grupo de moradores construiu um barraco para a família dele, lá na área verde, e ainda garante mensalmente uma cesta básica.

___Há quanto tempo ele está morando lá, nessas condições? – perguntou Marechal.

___Ah! Já vai pra dois anos, ele é doente e faz uns bicos, dois filhos catam papelão e assim vão levando, vivendo da caridade cristã, não têm outra escolha...

___Ah bom! Você chegou aonde eu queria. O que você vai comer no próximo domingo, com sua família? Tem algo programado?

___Domingo vamos almoçar fora com amigos, em um casarão que serve leitão a pururuca, tudo regado com uma boa cerveja. – respondi, com água na boca, pensando no almoço dominical.

___Está vendo? Você trabalha e tem o direito de escolher o que vai comer, e onde vai comer no domingo, com a sua família. E essa família que vive da caridade, o que vai comer no domingo?

Diante da pergunta fiquei calado alguns instantes, pensando na família do Sêo Antonio, e no que iriam comer no domingo. E diante do meu silêncio, que já dizia tudo, o Velho Botão concluiu:

___Percebeu a grande diferença? O pobre quer de volta a sua dignidade, para não ter mais que viver da caridade alheia, ele quer construir a sua casa do seu jeito, no Bairro que quiser, e no domingo decidir o que vai comer e onde vai comer com sua família.

No dia que isso acontecer --- disse o Botão, dando um suspiro --- as entidades assistenciais, filantrópicas sociais ou religiosas, serão extintas, as fábricas de Cesta Básica irão à falência, e você encontrará com o Sêo Antonio e a família dele, lá no casarão, degustando um delicioso leitão a pururuca, em uma tarde de Domingo!



ESTA PÁGINA É DEDICADA A CRIAÇÃO DO DIÁCONO JOSÉ DA CRUZ.


QUE DEUS ABENÇOE A TODOS NÓS!

Oh! meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno,
levai as almas todas para o céu e socorrei principalmente
as que mais precisarem!

Graças e louvores se dê a todo momento:
ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento!

Mensagem:
"O Senhor é meu pastor, nada me faltará!"
"O bem mais precioso que temos é o dia de hoje!    Este é o dia que nos fez o Senhor Deus!  Regozijemo-nos e alegremo-nos nele!".

( Salmos )

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