GOTAS DE REFLEXÃO - EVANGELHO DOMINICAL
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14.02.2010
VI Domingo do Tempo Comum - ANO C - Verde
__ “Um anúncio que transforma o mundo: As Bem-Aventuranças!” __
Comentário: Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs!
Com este domingo inicia-se a leitura do discurso da "planície", com que Lucas apresenta a nova lei: a vida moral do cristão. No fundo toda moral natural se pode resumir nesta norma: age segundo aquilo que és. A ação moral está incluída na linha da natureza. Na Bíblia as coisas são diferentes. As bem-aventuranças não são lei, mas evangelho. A lei abandona o homem às próprias forças e não o incita a adaptar-se à ela até o extremo. O evangelho, ao contrário, põe o homem diante do dom de Deus e o incita a fazer desse inexprimível dom o fundamento de sua vida. Jubilosamente,
entoemos cânticos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos
em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Jr 17,5-8): - "Maldito o homem que confia no homem e faz consistir sua força na carne humana, enquanto o seu coração se afasta do Senhor."
SALMO RESPONSORIAL (Sl 1): - "É feliz quem a Deus se confia!"
SEGUNDA LEITURA (1Cor 15,12.16-20): - "Se se prega que Cristo ressuscitou dos mortos, como podem alguns dizer entre vós que não há ressurreição dos mortos?"
EVANGELHO (Lc 6,17.20-26): - "Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus!"
- “BEM AVENTURADOS OS POBRES”
Reflexão do Evangelho por Diácono José da Cruz
Há sempre quem veja a predileção de Deus pelos pobres, neste evangelho, apenas como uma forma de consolo aos pobres que sofrem neste mundo.Uma espécie de slogan “Sofra agora e goze depois”. Esse pensamento reforça o sistema explorador e opressor e ao mesmo tempo acalma e acomoda o pobre, tirando dele a vontade de lutar pelos seus direitos. Não é preciso lutar para mudar a situação pois é Deus que quer assim.
Embora neste evangelho Lucas fale literalmente da pobreza e riqueza material, é preciso prestar atenção em um detalhe: Jesus proclama as Bem Aventuranças olhando para os seus discípulos, que naquele momento era um grupo numeroso em meio à multidão.O evangelho não compactua com a pobreza, conseqüência da ganância e egoísmo do homem, a Igreja de Jesus Cristo terá sempre de ter uma palavra de ajuda e de esperança a favor da massa empobrecida, principalmente dos países da América Latina, onde de maneira vergonhosa e pecaminosa ainda temos uma massa de miseráveis ao lado de grandes conglomerados econômicos e latifundiários, que com seu poder coloca os governantes e legisladores a seu serviço.
No evangelho de Lucas o sermão das Bem aventuranças é situado em uma planície, após Jesus e seus discípulos terem descido da montanha assinalando assim, que Deus vem ao encontro do homem, como resposta ao seu sofrimento, como proposta de uma vida nova em uma sociedade onde não haja mais divisões entre classes sociais. Mas quem dará atenção e acolhimento a este projeto?
A primeira leitura responde que o homem tem duas alternativas: poderá ser feliz e bendito se souber fazer a escolha certa para viver bem esta vida, confiando no Senhor e no plano de Salvação, ou então será maldito se confiar em outro homem, não na pessoa mas nos projetos humanos que sempre são falhos, porque atribuem um valor absoluto a coisas que passam e que são transitórias. O Diretor proprietário de um grande império econômico que a vida inteira acumulou sua fortuna de maneira egoísta, nunca se importando com o projeto de Deus e muito menos com as pessoas, na hora derradeira de sua vida mergulhará em uma crise profunda, extremamente dolorosa porque irá constatar aterrorizado que fez a escolha errada ao colocar toda sua confiança e esperança de felicidade nos bens materiais, dos quais não levará consigo um único centavo para a outra vida.
Não foi Deus que dividiu a humanidade entre ricos e pobres, essa divisão é conseqüência do pecado, a desgraça que há de cair na vida de um rico que nunca se importou em conhecer Deus e o seu projeto de Salvação, não é castigo divino mas apenas conseqüência de sua escolha.
A referência do evangelista é sempre o Reino de Deus onde se fazer pobre pelo reino não significa ser masoquista, passando fome e toda sorte de privações pois isso, com toda certeza Deus nunca desejou, como também ele não faz de suas bênção uma varinha mágica que enriquece e dá prosperidade a algumas pessoas transformando pobres em ricos e ricos em milionárias, como tenta ensinar certa corrente religiosa defensora da teologia da prosperidade. Nada na vida de fé acontece em um passe de mágica pois este não é o método de Deus.
Portanto, ser bem aventurado e feliz diante do evangelho, não é apenas uma questão de ter ou não ter muitos bens materiais, mas sim de ter se tornado discípulo do Senhor, vivendo a vida de acordo com os valores do seu reino que é a justiça e a paz, conseqüência da igualdade, partilha e fraternidade. Quem trilha este caminho, sem se desviar para os tentadores atalhos que o mundo nos coloca, será feliz e bendito porque confiou e colocou toda sua esperança, não naquilo que o mundo oferece mas sim na vida nova que vem da graça de Deus, e que se estende para muito além dos limites da nossa vida biológica.
É para estes benditos e benditas que o evangelho traz a boa nova, pessoas que não estarão isentas de sofrimentos, privações e até perseguições, por terem optado pelo evangelho de Cristo, que desafia e põe em cheque o conceito de felicidade que o mundo nos ensina, porque mostra-nos no Senhor Ressuscitado, que esta vida terrena é apenas caminho para se chegar na verdadeira vida, sonhada, desejada e construída ainda nesta nossa peregrinação por este mundo.
Nossas comunidades cristãs nas quais participamos, já aderiram com fidelidade a proposta que Deus nos faz em Jesus Cristo, ou pelo contrário, acabamos trazendo para dentro da comunidade certos valores sedutores que o mundo nos apresenta? A resposta a essa pergunta nos indicará se pertencemos ou não ao grupo dos Bem Aventurados...
José da Cruz é
diácono permanente da Paróquia Nossa S. Consolata-Votorantim -
e-mail:jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Pe. Françoá Rodrigues – VI Domingo do Tempo Comum (Ano C)
Olhos para ver!
Diego não conhecia o mar. O pai, que se chamava Tiago, levou-o ao sudeste para que tivesse a alegria de descobrir o mar. Quando chegaram, lá estava o imenso mar por trás daquelas dunas altas, imponente e esplendoroso. O menino ficou mudo de beleza, olhava e não conseguia abarcar toda a grandeza do mar. Depois de alguns minutos, gaguejando e tremendo pediu ao pai: “por favor, me ajuda a olhar”.
Eu acho que deveríamos pedir isso ao Senhor nesse domingo ao escutar as bem-aventuranças: felizes são os pobres, os que têm fome, os que choram, os odiados e perseguidos por causa do Reino; tristes são os ricos, os fartos e os que riem. Há aqui pelo menos uma aparente contradição. Quando vemos tanta fome, injustiça, choro e perseguições; francamente não resulta nada fácil ver que aí, precisamente aí, se encontre a felicidade; os pobres e os injustiçados geralmente não estão felizes por essa situação. Por outro lado, a riqueza, o fausto, a justiça estrita, as gargalhadas das grandes festas tampouco dão a felicidade, muitos ricos são tristes.
Precisamos pedir ao Senhor que nos ajude a olhar, que nos ajude a ver os verdadeiros valores. Onde está a realidade? Platão dizia que a realidade se encontra num suposto mundo das idéias e que nós vemos neste mundo somente um reflexo da autêntica realidade; no pensamento platônico, nós vivemos numa espécie de caverna e vemos apenas as sombras das realidades que se refletem na concavidade da mesma. Eu não diria que Platão tem toda a razão, não obstante é verdade que a realidade mais profunda é a que não se vê. Noutro dia falávamos que profeta é aquela pessoa que foi introduzida na maneira de ver de Deus e que, por isso, sabe quais são os planos do Senhor para a humanidade e para si.
Efetivamente, a solução para a felicidade não é transformar os pobres em ricos e os ricos em pobres, se assim fosse simplesmente estaríamos mudando a perspectiva do quadro, mas não estaríamos mudando a realidade. A Igreja Católica sempre insistiu, diante de posições radicais, na moderação das posturas: a sua missão, a da Igreja, é anunciar o Evangelho e dar os bens sobrenaturais para que todos se salvem. A missão da Igreja, logicamente, não é alheia à sorte do ser humano neste mundo, ela não fica indiferente diante da pobreza, da injustiça e da perseguição. A Igreja quer que todos os homens se salvem e essa salvação deve alcançar a pessoa humana em todas as suas dimensões. Daí a defesa que a mesma Igreja faz de que todos tenham o necessário para passar uma vida digna e sóbria, também materialmente.
Definitivamente, um pobre feliz, um odiado venturoso e um perseguido ditoso só pode ser realidade quando se considera o porquê das coisas segundo o Evangelho: “por causa do Senhor” (cf. Mt 5,11). Diante das adversidades, o discípulo de Cristo, ciente do valor da Cruz para a própria santificação, para o bem da Igreja e de toda a humanidade, terá uma reação sobrenatural porque compreendeu que a cruz faz parte da vida do cristão e quem sem a cruz não se pode ser cristão (cf. 1 Cor 1,17-31). Somente se aceitarmos que a cruz é essencial no cristianismo, entenderemos que os apóstolos estavam contentes ao sofrerem pelo nome de Jesus (cf. At 5,41), que São Paulo padecesse sofrimentos com alegria (cf. 2 Cor 11,16-33), que tantas pessoas souberam entregar-se ao serviço dos outros. Também nos dias de hoje, há tantos bons cristãos que sabem ver: irmãzinhas de caridade nos hospitais, creches e orfanatos; comunidades religiosas que se dedicam a cuidar dos aidéticos e dos leprosos; pais de família sacrificando-se pelas suas famílias sem mentalidade de vítimas; mães verdadeiramente heróicas que trabalham, cuidam da família, da casa, dos filhos, e ainda encontram tempo para dedicar-se a obras assistenciais; jovens cristãos que vivem santamente num ambiente saturado de libertinagem, orgias e avareza; vozes que se levantam contra leis e planos de leis totalmente inumanos (vários aspectos do PNDH-3, por exemplo)… Acaso não são esses os pobres de espírito, os que têm fome da justiça de Deus, os perseguidos por causa do reino de Deus, os que agora choram porque o sacrifício custa (e é normal que custe!)?
Essas pessoas têm olhos para ver, Deus lhes concedeu uma visão clara das coisas. São profetas, são servos de Deus, são felizes.
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Comentário Exegético – VI Domingo do Tempo Comum - Ano C
feito por Pe Ignácio, dos padres escolápios (extraído do site http://www.presbíteros.com.br)
Segunda Leitura - 1Cor 15, 12. 16-20
INTRODUÇÃO: Se Cristo não ressuscitou a fé nEle não tem sentido. Portanto, a ressurreição total – corpo e alma- é o artigo base de nossa fé. E a visão de Cristo ressuscitado não é uma aparição, mas uma manifestação corporal do que atualmente é o Cristo e que futuramente seremos nós. Pois em Cristo estamos representados como primícias de uma vida futura. Esta passagem é a melhor refutação dos modernos que veem na ressurreição de Cristo uma aparição sem forma corporal, mas interna do ressuscitado.
O ANÚNCIO: Se, pois Cristo é anunciado que ressuscitou dos mortos, como dizem alguns entre vós que não há ressurreição os mortos?(12). Si autem Christus praedicatur quod resurrexit a mortuis quomodo quidam dicunt in vobis quoniam resurrectio mortuorum non est. RESSUSCITOU: Paulo usa o verbo Egeirö [<1453> =resurgere]que propriamente significalevantar-se, erguer-se, como da cama ou de estar dormido; daí, despertar. A ideia é que, de novo, se toma posse das faculdades. A diferença com anastënai é que este se empregava com o surgir das obras e egeirö com o despertar do sono. Propriamente, no grego clássico existe o verbo Anistëmi [<450>= surgire] levantar-se, que tem dois significados: levantar-se, como em Mt 89, 9, quando Mateus, ao ouvir as palavras de Jesus, deixou tudo e levantando-se O acompanhou, ou ressuscitar quando o Filho do homem se levanta dos mortos, que anteriormente usa Mateus para dizer que o Batista ressurgiu dentre os mortos (14,2) e Lucas, como comparado a um dos antigos profetas, agora ressuscitado (9,8). É o verbo que usa Marcos para afirmar que a donzela ressurgiu, ou se levantou da cama (5, 42). É o verbo das profecias de sua paixão que os discípulos não entendiam o seu significado de ressurgir dentre os mortos (Mc 9, 10). By the way, este detalhe indica uma testemunha ocular do fato, que não seria fácil de recordar a não ser como uma viva recordação do sucesso,transcrito pelo evangelista. Anistëmi é o verbo usado por Pedro em seu discurso de Pentecostes (At 2, 24). Verbo que usa João para dizer que os crentes serão ressuscitados no último dia (6, 44), assim como os que comem sua carne e bebem seu sangue (6, 54). Marta também crê nessa ressurreição, embora não soubesse que Jesus era ressurreição e vida (Jo 11, 24-25). Usado frequentemente nos Atos, Paulo só usa o mesmo 4 vezes em suas cartas (Rm 14, 9 e 15, 12; Ef 5, 14 e 1 Ts 4,14).No que diz respeito a Egeirö com o significado de ressurgir dos mortos, temos a demostração dada diante dos enviados pelo Batista: os leprosos curados, os surdos ouvem e os mortos ressurgem (Mt 11, 15) que parece dominar os milagres de Jesus, escolhidos nos evangelhos, pois um dos fins dos evangelistas era provar que tudo estava escrito e tudo estava cumprido, para terminar com o consumatus est (Jo 19, 30). Este verbo egeirö é o preferido pelo anjo para anunciar às mulheres a ressurreição de Jesus em Mt 28, 6-7, em Mc 16, 6 ou na primeira aparição em 16, 7. É também a palavra que Lucas emprega na aparição e anúncio das mulheres (24, 6 e 24, 34). João o usa em seu evangelho, mas só o usa uma vez após a ressurreição em Jo 21, 14, quando o evangelista resume as aparições: esta é a terceira vez que Jesus se manifestou a seus discípulos ressuscitado dos mortos. Em Paulo, a Vulgata traduz como surgere e suscitare dos romanos e do início de 1 Cor 6, 14 se traduz em ressurreição em 1Cor 15 nada menos que 12 vezes e só 2 como surgir. Duas vezes Paulo usa a palavra clássica Anastasis nekrön [ressurrectio mortuorum, ressurreição dos mortos] (1Cor 15, 13 e 15, 42). Neste sentido, surgir da morte, ou do sono da morte, ou chamar da morte para a vida e ressurgir dos mortos é que Paulo usa o egeirö, que não tem outro fim que uma vida nova, total com corpo e alma nCte trecho de 1Cor 15. NÃO HÁ RESSURREIÇÃO: Paulo sabia perfeitamente que na filosofia grega de seu tempo [neoplatonismo] a supervivência da alma era crença comum entre os de Corinto. A alma era imortal e como tal sobrevivia ao corpo. Não existia morte para ela. O corpo era que estava morto e dele esperavam nova vida e ressurreição os cristãos, exatamente como Cristo ressuscitou e seu corpo foi visto, assim será com os cristãos que nele puseram toda a sua fé e esperança. De outra forma, toda esta lógica e raciocínio de Paulo seriam inúteis. Os filosofastros de Corinto, negando a ressurreição dos corpos dos mortos, negavam a ressurreição do corpo de Cristo. E Paulo dedica este capítulo a demonstrar que Cristo ressuscitou, porque assim o testemunhava uma grande multidão, tanto especificamente como numericamente.
UMALÓGICA CONCLUSIVA: Se, portanto, mortos não ressurgem, nem Cristo ressurgiu (16). Nam si mortui non resurgunt neque Christus resurrexit. A epístolaevita os versículos 13 a 15 que traduzimos sem comentários: Se não há ressurreição dos mortos, então Cristo não ressuscitou [é o que dizem os modernos ateus ou agnósticos] (13). Se, pois Cristo não ressuscitou é vão o nosso anúncio e é vã a vossa fé [pois a ressurreição de Cristo é a base de ambas as afirmações] (14). Seríamos, pois, encontrados como falsas testemunhas de Deus, porque temos asseverado contra Deus já que ressuscitou o Cristo ao qual ele não ressuscitou, caso de que os mortos não ressuscitassem [os dois testemunhos, o de Deus e o dos apóstolos, estariam em contradição] (15). Vejamos agora a interpretação do versículo 16. Evidentemente, Paulo enfrenta uma filosofia contrária à ressurreição corporal. Segundo a mente ilustrada da época, era impossível a ressurreição de um corpo, já corrupto, pela ordem natural dos fatos. Como recompor instantaneamente um corpo totalmente anulado, do qual só existe um pouco de pó? Uma parte dos fieis de Corinto- provavelmente a mais ilustrada intelectualmente- só pensavam numa vida posterior da alma humana. Entrava dentro de sua filosofia e era socialmente correto. Mas o corpo, considerado na época como um cárcere da alma, para que viver com ele que só trazia dores e sofrimentos e era temporalmente dirigido à morte? Paulo argumenta com duas razões irrebatíveis: Um fato, e uma explicação. O fato é que um homem ressuscitou:Cristo. A explicação é que o corpo ressuscitado é o mesmo, mas diferente e Paulo usará a figura do trigo semeado como grão e que brota como espiga. Hoje usaríamos a crisálida e a borboleta.
SEM RESSURREIÇÃO NÃO HÁ FÉ: Se, pois Cristo não tem ressurgido, inútil também é vossa fé; ainda estais em vossos pecados (17). Quod si Christus non resurrexit vana est fides vestra adhuc enim estis in peccatis vestris. É a primeira conclusão negativa, deduzida do fato imaginário da falsa assunção da ressurreição de Cristo. O fato negado, temos que negar as conclusões: a pregação apostólica é privada de verdade e portanto falsa. A fé que vê em Cristo o Deus salvador é despossuida de toda base e consequentemente, também não somos libertos dos pecados e das consequências dos mesmos: a morte e a corrupção (Rm 6. 16 e 8, 21); pois se por um homem veio a morte, por outro, a ressurreição (1 Cor 15, 21).
OS MORTOS EM CRISTO: Portanto, também os que dormiram em Cristo pereceram (18). Ergo et qui dormierunt in Christo perierunt. Uma outra consequência é a de que os fieis mortos [dormiram em Cristo] pereceram ou se extinguiram, não estão mais vivos. Para Paulo como para os israelitas de seu tempo, uma vida sem corpo é uma vida de sombras, é mais parecida como o sono que com a vigília. Era a vida do Sheol. A comunicação da vida dos sentidos seria impossível e estariam todos eles dominados pelas sombras da morte (Jo,3, 5) em que tsalmaveth[<05757> =umbra mortis] repetida em salmos 23, 4 como sendo o vale da sombra da morte ou seja o sheol, será a matriz estéril da terra que jamais diz basta (Pr 30, 16) ou uma aflição extrema, como a daquele que se rebelou contra Deus (Sl 107, 10-14).
CONSEQUÊNCIA NEGATIVA: Pois se nesta vida temos esperança em Cristo só, somos os mais miseráveis de todos os homens (19). Si in Christo sperantes sumus miserabiliores sumus omnibus hominibus. NESTA VIDA:ou seja, na vida que Paulo chama de animal (1 Cor 2, 14) a esperança em Cristo libertador do pecado e da morte é essencial; pois se a paga do pecado é a morte, a dádiva de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus (Rm 6,23). O cristão vive da fé, que é o fundamento das coisas futuras que se esperam e não são aparentes (Hb 11,1); ou como comentam outros, se esperamos felicidade neste mundo somos os mais MISERÁVEIS, eleeinoteros [<1652> = miserabilores]de eleeinos dignos de compaixão, como eram os pobres tolhidos que pediam esmola à beira dos caminhos e nas entradas do templo. Paulo fala dos apóstolos como sendo o lixo do mundo (1Cor 4, 13). Assim era o coitado que recebia toda a sujeira [katharmata] da cidade para aplacar os deuses e era sacrificado após um período curto de prazeres. Em Lm 3, 45 o profeta se queixa de que Javé faz de nós [os israelitas] um rejeito, um refugo [maocé <03973=abjectio] no meio dos povos. Não só renunciamos aos prazeres, honras e lucros do mundo, mas continuamente estamos expostos ao ódio, opróbio e perseguição do mesmo, que será nota característica dos discípulos de Cristo (Mt 10, 17-18 e23, 34). Logicamente , caso não haja ressurreição, a esperança no além devia ser substituída pela espectativa do amanhã.
PORÉM O FATO É INDISCUTÍVEL: Agora, porém, Cristo ressurgiu dentre os mortos, tornado-se primícias dos que adormeceram (20). Nunc autem Christus resurrexit a mortuis primitiae dormientium. Porém, toda essa suposição era inútil ante o fato de que Cristo tinha ressuscitado dentre os mortos. PRIMÍCIAS: Em grego Aparchë [<536>=primitiae] cujo significado era a oferta dos primeiros frutos que na Setuaginta é traduzida por primeiros frutos [reshiyth<07225>=primitiva]. A palavra é própria de Paulo (6 vezes, contra uma em Tiago e outra em Apocalipse). Assim, somos as primícias do Espírito, Epenetos são as primícias dos conversos na Ásia, e Cristo dos surgidos entre os mortos. Logo isso quer dizer que é o primeiro entre os ressuscitados dos mortos, ou dos que adormeceram. Por isso, Paulo afirma duas coisas: que o primeiro em ressuscitar é Cristo, e que sendo o primeiro, haverá outras ressurreições sucessivas, que Paulo pretende como primeiro argumento neste raciocínio. Logo haverá ressurreição e desta ideia depende nossa ulterior e definitiva felicidade.
Evangelho - (Lc 6. 17. 20-26)
BEMAVENTURANÇAS E IMPRECAÇÕES - (Lugar paralelo: Mt 5, 1-12)
INTRODUÇÃO: Antes da eleição dos apóstolos, Jesus passa a noite em oração. O relato continua com o que costuma ser chamado o pequeno inciso até o trecho 8, 3. Inicia-se com as bemaventuranças, nas quais Lucas omite grande parte de Mateus, porque não afetavam os gentios. Lucas apresenta 4 bemaventuranças e 4 imprecações que anunciam a inversão das situações no fim da vida. Cristo -argumenta um comentarista- não beatifica a pobreza como tal, porque ela é um mal. Como tal, o Deus bom deseja que seja superada. Porém OS POBRES, pelo fato de estarem nessa difícil circunstância, assim como todo aquele que sofre, será objeto da especial predileção de Deus, como deve ser objeto do amor preferencial da Igreja (J P II). Para os pobres temos o lado negativo da pobreza numa citação do AT: Afasta de mim falsidade e mentira, não me dês pobreza nem riqueza. Concede-me o pão necessário. Não seja que, saciado, renegue de ti e diga: Quem é o Senhor? Ou que, sendo pobre, roube e profane o nome de meu Deus. (Pr 30, 8-9). Esse é o desejo de todo ser humano correto, evitar a pobreza tanto quanto a extrema riqueza. Porém a vontade de Deus é a de ajudar o pobre para que não tenha a tentação de pecar contra Deus e os homens.Porém a pobreza tem um lado positivo: 1º) Deus manda cuidar dos pobres de modo especial. Assim o podemos ver em Êxodo: Se emprestas dinheiro a alguém de meu povo, pobre, vizinho teu, não serás usurário exigindo interesses. Se tomas em penhor o manto de teu próximo, o devolverás antes da posta do sol, porque esse é o único abrigo com que cobre seu corpo. Senão com que vai dormir? Se recorre a mim, eu o escutarei (Êx 2, 24-26). No NT especialmente na epístola de Tiago encontramos estas afirmações: A prática religiosa pura e sem mancha diante de Deus, nosso Pai, consiste em visitar os órfãos e as viúvas em suas tribulações e em se preservar dos vícios do mundo (Tg 1, 27). 2º) Deus tem um amor preferencial para com os pobres; Isso está demonstrado em Isaías 66, 2: Aquele em quem fixo meus olhos é o humilde, o de coração contrito, que treme diante de minha palavra. E no NT teremos a carta de Tiago que afirma: A prática religiosa pura e sem mancha diante de Deus, nosso Pai, consiste em visitar os órfãos e as viúvas em suas tribulações e se preservar dos vícios do mundo (Tg 1, 27). E ainda afirma: Não escolheu Deus os pobres segundo o mundo para serem ricos na fé e herdeiros do reino que prometeu aos que o amam? (idem 2, 5). Pelo que diz respeito AOS RICOS, Tiago será taxativo: Tendes vivido na terra em delícias e prazeres e tendes engordado para o dia da matança (idem 5, 5). O próprio Jesus o declarava na parábola do rico epulário e o pobre Lázaro: Recebestes teus bens durante a vida e Lázaro, porém os males; agora, porém, ele encontra aqui consolo e tu és atormentado (Lc 16, 25). Já o comentário às outras bemaventuranças será feito em sua respectiva citação. Somente diremos, nesta introdução, que existe uma diferença entre Lucas e Mateus muito notável: Lucas usa a segunda pessoa sem as adições de Mateus, de modo que as palavras de Jesus estão dirigidas a umas pessoas concretas, seus discípulos, que deixaram tudo (20), gente pobre por decisão própria, e, portanto com um alto sentido religioso. Vamos, pois ao comentário, versículo a versículo.
A MULTIDÃO: E tendo descido com eles, pôs-se de pé sobre um lugar plano e a companhia de seus discípulos e a grande multidão do povo de toda a Judeia e de Jerusalém e da costa de Tiro e Sidônia os quais vieram ouvi-lo e serem curados de suas enfermidades (17) e os atormentados por espíritos impuros eram curados (18). Et descendens cum illis stetit in loco campestri et turba discipulorum eius et multitudo copiosa plebis ab omni Iudaea et Hierusalem et maritimae Tyri et Sidonis qui venerunt ut audirent eum et sanarentur a languoribus suis et qui vexabantur ab spiritibus inmundis curabantur. Nestes versículos, vemos a moldura do marco em que Jesus vai pronunciar as bemaventuranças. Se Mateus tem a intenção de mostrar Jesus como um novo Moisés que fala da montanha, anunciando o programa do novo reino, Lucas parece querer mostrar um anúncio universal, pois a multidão é composta de todos os povos, tanto judeus (Judeia e Jerusalém) como gentios (Tiro e Sidônia). Para Mateus, Jesus fala à multidão e aos discípulos indiscriminadamente (5, 1) e Lucas dirige as palavras de Jesus, única e exclusivamente, a seus discípulos aos quais olha especialmente (6, 20). Mateus escreve para os judeus, adaptando-se aos seus costumes e idiossincrasia, e Lucas para os gentios, com o espírito de Paulo, que declarava descobrir o mistério escondido durante as gerações precedentes (Ef 3, 4-6).
OS POBRES: Então, Ele, elevados seus olhos a seus discípulos dizia: Benditos os pobres porque vosso é o reino de(o) Deus(20). Et ipse elevatis oculis in discipulos suos dicebat beati pauperes quia vestrum est regnum Dei. O discurso está dirigido a seus discípulos.
DISCÍPULOS: A palavra grega é Mathetés<3101>, aluno ou discípulo. O verbo que dá origem à palavra é Matheö, aprender. Mateus também dirige o discurso aos discípulos. A palavra é mais abrangente que os doze, ou apóstolos, e inclui todos aqueles que de alguma maneira pretendem escutar Jesus e seguir seus ensinamentos como parte principal de suas vidas. A vós que me escutais, dirá no versículo 27. Jesus parece que, nesta época, profeticamente olha para um futuro próximo em que seus seguidores serão todos os que na primeira parte das bemaventuranças ele anuncia. Por isso dá a eles um motivo de esperança, que a primitiva cristandade não poderia esquecer. É uma constatação da realidade a acontecer no futuro, e, portanto é também um plano divino do que deveria suceder. Por isso, entre as três opções interpretativas deste trecho (promessa de graça, exortação ética e regime de vida da comunidade) optamos pela primeira. Deus está convosco -vem dizer o Mestre-, não vos preocupeis nem pela pobreza, nem pela fome, nem pela tristeza, nem pela perseguição. É muito pedir para aqueles que vivem num mundo que busca a riqueza, a saciedade, as festanças e os aplausos. Logicamente os acréscimos de Mateus transformam o que era um simples relato-promessa de graciosa providência divina, em regra de vida comunitária e, portanto em exortação ética de complemento essencial. O uso das chamadas passivas teológicas em que o agente sobre-entendido é o próprio Deus, confirma a escolha que fizemos dessa promessa contínua e providencial de Deus, sobre os que têm como prioridade a escuta evangélica. BEMAVENTURANÇAS: Talvez a tradução do plural do Makários (favorecido pela sorte) seja benditos de Deus, ou abençoados por Deus, melhor do que felizes ou ditosos. Na realidade, o Makários grego denota a felicidade interna de uma pessoa determinada. Por isso a fórmula é uma felicitação dada a um determinado sujeito pela sorte que lhe coube. Em hebraico existem dois verbos dos quais se origina o adjetivo bendito ou ditoso, dependendo do sujeito: Barak dirigido a Deus que significa bendito (Eulogemenos em grego) e Ashar do qual o Esher de ditoso, aclamado, para o homem a quem os demais consideram ditoso (makários em grego). Evidentemente, Jesus abençoa o homem e, portanto usou o Esher há-ish (bendito o homem). Em português podemos traduzir tanto feliz como bendito. Creio que esta última fórmula está mais em consonância com o espírito do evangelho, especialmente o de Lucas, pois é um anúncio da graça, do favor divino aos homens por parte de Deus (Lc 4,19). A razão de preferir bendito como tradução está reforçada pela segunda parte do hemistíquio em que o prêmio está na passiva [a chamada passiva teológica], e sabemos que o sujeito desses verbos é quase sempre Deus. A versão inglesa do King James traduz por Blessed (abençoado). Como nota, podemos dizer que estas felicitações são denominadas pelos expertos como macarismos, palavra inventada ou tomada do grego dos textos originais. POBRES: A palavra grega Ptochós <4434>, significa mendigo [beggar inglês] no sentido de pobreza material absoluta, e traduziria o Dal hebráico: é um pobre de solenidade, dos que pedem esmolas. A palavra Anaw (plural anawim e daí anawé Jahweh) significa humilde, impotente ou manso. O anawé Jahweh serão os piedosos de Javé. Vejamos como traduzem os setenta alguns textos em que entra o anawin: Os humildes experimentam Deus como seu apoio único no Sl 10, 17: “Senhor, atendeste o desejo dos humildes (Penes, grego=que vive do trabalho), tranquilizas seu coração, tens o ouvido atento”. Esperam em Deus e são guiados por Ele no Sl 37, 11:”Os Mansos (Prays= manso): possuirão a terra, gozarão de uma paz total”. São louvados por serem melhores que os orgulhosos em Provérbios 16:19: “Melhor ser humilde (Prays) de espírito com os humildes do que repartir o despojo com os soberbos”. Regozijam-se quando Deus é louvado e o buscam (Sl 69, 32-33 :”Vejam isso os aflitos (Tapeinos=baixo) e se alegrem; quanto a vós que buscais a Deus, que o vosso coração reviva. Porque Jahweh responde aos necessitados (Penes), e não despreza os seus prisioneiros. Isaías 61, 1 afirma que para tais pessoas (Ptochos) o Ungido do Senhor irá pregar. Lemos no Salmo 76: 8-9: “Eles têm consciência da aprovação divina e confiam que no eschaton (fim) Deus os salvará, ao levantar-se Elohim para julgar e salvar todos os humildes (Prays) da terra”. Tenho procurado a tradução grega dos setenta nas diversas citações. No versículo citado, entre parêntesis, está a palavra grega que traduz o anawim correspondente. A tradução que em grego dos setenta traz Ptochós (Is 61,1) hoje é traduzida por humildes na bíblia ecumênica, na italiana e na versão do King James; por abatidos em Nácar Colunga e atribulados em AV (versão autorizada evangélica). Unicamente a versão oficial espanhola segue o grego dos setenta e traduz pobres. Como temos visto, os tradutores gregos não usam uma única expressão para anaw e portanto não podemos simplesmente afirmar que essa expressão se reduz a pobres materiais, máximo que em grego comum significaria propriamente mendigos. Embora os pobres em geral pareçam ser os abençoados por Deus com a posse do Reino, esses pobres são aqueles aos quais dirige seu olhar [os discípulos] ou pelo menos são o modelo do qual os discípulos devem obter a lição que Jesus oferece nesta primeira bemaventurança. Parece que o discípulo é visado como aquele que é pobre, no sentido de gente indefesa, humilde, sem proteção, desamparada de todo recurso humano como é a riqueza, o poder, a sabedoria, o prestígio. Reduzir ao pobre econômico a bemaventurança é um risco exegético que podemos chamar de eiségese [de dentro para fora], ou uma interpretação dirigida por um princípio pessoal, anterior ao texto, o qual é assim iluminado, contrariamente a interpretação objetiva, ou exegética, em que o texto ilumina o intérprete. Isso porque o Ptochós grego [mendigo] não pode ser objeto direto da bênção divina como vimos na introdução e no comentário anterior, e sim o anaw do AT que significa humilde e que os setenta traduzem por Ptochós. POBRES EM ESPÍRITO: No lugar paralelo, Mateus usa esta expressão que lemos em Pr 16, 19 no original hebraico. Este versículo, traduzido pela AV diz: “Melhor é ser humilde de espírito (praythumosgrego, correspondente aoshafal <08217> ruachhebraico) com os humildes (tapeinoi <06035>ou anawim) do que repartir o despojo com os soberbos”. É uma consequência do versículo anterior que afirma a soberba preceder à ruína, e a altivez do espírito à queda. Voltando ao texto de Lucas das bemaventuranças, Pobres a secas, é a versão do terceiro evangelista. E esta tradução é a que usam comumente todas as versões. São aqueles a quem um autor diz que chamam às portas divinas clamando: Senhor, tende piedade. REINO DE DEUS: Mateus fala do Reino dos céus, expressão própria dos judeus, mas de difícil entendimento pelos gentios, para os quais o Reino de Deus tinha sentido. Dizer que o Reino é deles, significa que encontrarão facilidades para entrar nele. Que receberão o Reino como um privilégio e dom extraordinário, como uma mercê da benevolência divina. É entrar dentro do amor privilegiado de Deus, é o termo escatológico das verdadeiras bemaventuranças. Podemos partir da pobreza real para a pobreza voluntária que é basicamente a condição para a entrada no Reino, porque não se pode servir a dois senhores.(Mt 6, 24). A História é testemunha de que não unicamente a Ordem dos Templários, mas muitas outras, acabaram por acumular riquezas em demasia e ruíram estrepitosamente.
FAMINTOS E AFLIGIDOS: Abençoados os famintos agora, porque sereis saciados. Abençoados os que chorais agora, porque rireis (21). Beati qui nunc esuritis quia saturabimini beati qui nunc fletis quia ridebitis TENDES FOME AGORA: Dirigido a seus discípulos Jesus fala da fome. Como na bemaventurança anterior o problema não é espiritual mas material. A fome tem sido uma pandemia universal em determinadas épocas. Hoje mesmo, ela é o problema número um em certos países da África, Ásia e América do Sul. Que fome é essa? Mateus fala da fome de justiça, ou seja, de santidade ou honestidade, ou da justiça divina que significa santificação. As expressões de Lucas são universalmente mais humanas do que as de Mateus que são mais bíblicas e próprias das comunidades primitivas cristãs. Lucas omite “ter sede”, com o qual elimina a expressão vetero-testamentária de Isaías em 49, 10: Não terão fome nem sede. E 65, 13: Certamente os meus servos comerão enquanto vós passareis fome; certamente os meus servos beberão enquanto vós tereis sede. SEREIS SACIADOS: É uma referência ao banquete escatológico do Reino, como Is 25, 6: Jahweh dos exércitos prepara para todos os povos, sobre esta montanha, um banquete de carnes gordas, um banquete de vinhos finos, de carnes suculentas, de vinhos depurados. Ou Sl 107, 3-9: Eles erravam pelo deserto solitário…estavam famintos e sedentos …Ele saciou a garganta sedenta e encheu de bens a garganta faminta. O próprio Lucas fala tematicamente deste assunto em 14, 16-24 e promete esse banquete a todos os servos vigilantes (12, 37), a quem o amo sentará à mesa, cujo verdadeiro significado é a manumissão do escravo, através do banquete ou ad mesam, de maneira informal. Devemos ter cuidado ao interpretar ao pé da letra palavras que podem ter um significado simbólico porque expressam realidades escatológicas dos últimos tempos, absolutamente finais. Esta bemaventurança constitui a número quatro em Mateus. CHORAIS AGORA: Embora existam vários verbos para chorar, especialmente dakruö (derramar lágrimas), o klaiö deste parágrafo significa chorar a gritos como um menino. O agora indica que a promessa é para os últimos tempos, ou seja, a nova era do novo Reino. POIS RIREIS: É rara a expressão que em Mateus, no número dois, se traduz por: os que sofrem serão consolados. O choro, assim tão ostensivo, parece ligar esta bemaventurança com a seguinte, ou seja, com a opressão que causa dor e vítimas. Temos que recordar Lc 2, 25 e, portanto esperar a consolação de Israel como libertação dos inimigos. Na escatologia dos tempos de Cristo, não na escatologia final, serão os cristãos perseguidos pelos judeus. É exatamente o que lemos no salmo 126 nos versículos 1-2: “Quando o Senhor restaurou a sorte de Sião ( ……)nossa boca se encheu de riso”.
ÓDIO DOS HOMENS: Ditosos sereis quando vos odiarem os homens e quando vos expulsarem e injuriarem e proscreverem o vosso nome como malvado por causa do Filho do Homem (22). Beati eritis cum vos oderint homines et cum separaverint vos et exprobraverint et eiecerint nomen vestrum tamquam malum propter Filium hominis. Neste primeiro hemistíquio vemos quatro classes de injúrias, expressas com quatro verbos diferentes: ódio, expulsão, insulto, proscrição. Logicamente estas ofensas têm como causa a pessoa de Jesus ou o Filho do Homem, de quem são discípulos os assim maltratados. O verbo ESTE [<2075>=eritis] indica 2ª pessoa do plural, traduzido por sois. Ainda dirigido aos discípulos, para expressar uma esperança final e, portanto uma bênção divina, que prevalecerá sobre a aparentemente funesta circunstância inicial. Que esperarão dos homens os discípulos de Jesus? Lucas usa quatro verbos assim como Mateus em 5, 11. Entre ambos só um é comum: o insulto com oneidizö, traduzido ao latim por maledicere em Mateus, e exprobravere em Lucas, significa insultar num caso e injuriar no outro. Em Lucas é o ódio, o ostracismo (expulsão da sinagoga), o insulto e finalmente, a rejeição da pessoa (do nome no original) como maligna ou infame; tratando-se do nome, indica sua origem semítica ou talvez se refira ao nome de cristão. Na Shemoné Ezré, a oração das dezoito bênçãos, existia uma duodécima bênção contra os sectários (Birkat Há-Minim), introduzida pelo rabino Gamaliel em Jabné depois da destruição do segundo templo. Esta oração que alguns conhecem como Tefilá (prece) ou Amida (de pé) pela forma de ser realizada, tinha essa maldição contra os cristãos, devido à sua condição de discípulos de Cristo (Filho do Homem). O evangelho apócrifo de Tomás reduz este versículo ao ódio e à perseguição, que aparece no segundo hemistíquio em Mateus. RAZÃO: essa perseguição é a causa da alegria e do pular de gozo, porque a recompensa, propriamente o salário (misthós), é grande no céu, já que também seus pais fizeram o mesmo com os profetas. Sem dúvida que Lucas escreve este parágrafo, levado pela experiência como discípulo de Paulo, primeiro perseguidor, e logo perseguido ao mesmo tempo, que mostra a morte de Jesus como modelo da morte dos discípulos que seguem a linha dos verdadeiros profetas. RAZÃO: Ficai alegres nesse dia e exultai, pois eis o vosso prêmio grande no céu: já que, segundo essas coisas, fizeram aos profetas seus pais (23). Gaudete in illa die et exultate ecce enim merces vestra multa in caelo secundum haec enim faciebant prophetis patres eorum. Com esta frase Jesus iguala os seus discípulos perseguidos com os antigos profetas, que também foram maltratados no seu tempo pelos ancestrais. Com esta declaração Jesus reponde a uma pergunta futura: Como somos perseguidos por aqueles que eram os líderes espirituais de Israel, supostamente dirigidos por Deus para conservar a verdadeira religião? Jesus não responde diretamente a essa pergunta; porém, o exemplo é suficiente para afirmar que a perseguição da parte dos dirigentes religiosos de Israel não indica um juízo divino contrário, mas tudo pelo contrário: os profetas, que eram a verdadeira voz divina, foram perseguidos pelos que a si mesmo se intitulavam representantes de Moisés. Jesus dá o caráter de verdadeiros profetas a todos seus discípulos quando estes forem discriminados e perseguidos. Daí a alegria e a esperança de um prêmio [na realidade salário] por sua atuação diante da perseguição.
AS IMPRECAÇÕES: OUAI [<3759>=vae, ai]é a expressão que inicia cada uma das quatro imprecações ou maldições, em contraposição às bemaventuranças. A interjeição não é da literatura clássica, mas dos escritos do período romano, possivelmente uma transcrição do romano VAE. Esta interjeição indica mal ou desgraça para os que na sequência, são nomeados na frase ou parágrafo. Estas interjeições precedem no NT os malaventurados, segundo a providência divina, ameaçando-os com angústias, sofrimentos, aflições: São os ricos, os satisfeitos, os não oprimidos pelas preocupações, os que gozam de boa reputação, e que estavam ouvindo nesse momento as palavras de Jesus. A ênfase da recriminação recai sobre a precariedade de sua felicidade atual.
OS RICOS: Porém, ai (desgraçado fim) para vós os ricos porque recebeis vossa consolação (24). Verumtamen vae vobis divitibus quia habetis consolationem vestram. Já recebem sua Paráklesis, consolação ou conforto. Do grego podemos afirmar que já retêm em totalidade a felicidade que buscavam. Não terão mais oportunidade, nem maior da que já alcançaram. O grego plousioi indica uma riqueza opulenta, abastada, suficiente para não trabalhar e viver em abundância, como diz a parábola do rico opulento e epulário, em banquetes e vestidos finíssimos (Lc 16, 19). Eles dificilmente entrarão a formar parte do Reino e de sua ditosa bemaventurança (Mt 19, 23): Em verdade vos digo que um rico dificilmente entrará no reino dos céus.
OS FARTOS E OS ALEGRES: Ai para vós, os fartos, porque tereis fome; ai para vós, alegres agora, porque lamentareis e chorareis (25). Vae vobis qui saturati estis quia esurietis vae vobis qui ridetis nunc quia lugebitis et flebitis Como na segunda e terceira bênçãos, estas duas imprecações formam um só versículo. OS FARTOS: O verbo em particípio perfeito [empleplësmenoi<1705>, de empiplëmi, estar cheio] indica uma plenitude total, uma satisfação completa. A malaventurança está na ordem do Magnificat de Maria em Lucas 1, 53 : Encheu de bens os famintos e despediu vazios os ricos. OS ALEGRES: Usa Lucas o mesmo verbo [gelaö<1070>, resplandecer de alegria] que no versículo 21. É o riso franco e sonoro. Porque o lamento, como nos dias de luto, será o fim dos tais com o pranto correspondente. É o choro e lamento de Davi por causa da morte de seu filho Absalão (2 Sm 19, 2).
OS APLAUDIDOS: Ai, para vós, quando falarem bem de vós todos os homens; pois, segundo estas coisas, faziam aos falsos profetas os antepassados deles (26). Vae cum bene vobis dixerint omnes homines secundum haec faciebant prophetis patres eorum. Logicamente é o louvor como ministros da palavra de Deus, não como atores de teatro ou pessoas públicas da política ou das armas. Porque é assim que foram recebidos os falsos profetas que só falavam as coisas que agradavam os ouvintes. Esta imprecação é o oposto da Bemaventurança do versículo 22. Temos exemplos no AT: O rei de Israel reuniu 400 profetas que alegraram seu ego contra um só que foi contrário a sua vontade de luta.(1 Rs 22,6). Várias vezes Jesus contrapõe o seu evangelho aos tempos pretéritos até afirmar que não se pode consertar um pano velho com um remendo novo (Mt 9, 16).
CONCLUSÃO: Parece que esse início do discurso é uma preparação a seus discípulos de como é a realidade vista pelos olhos divinos, que são, em definitivo, os únicos verdadeiros. É também um chamado à autêntica e decisiva felicidade, contrária ao que os judeus da época esperavam do messiado do Ungido do Senhor. Está na linha do ouvistes, eu, porém vos digo (Mt 5, 25). Não são normas de conduta, mas promessas de futuro para os que encontram dificuldades em seguir estritamente o evangelho. Jesus põe diante dos discípulos a alternativa felicidade/desgraça e inverte os valores da sociedade. A uma situação pobreza/riqueza em que Deus está favorecendo os que mais têm no sentido total do termo (ver Mt 13, 12), a nova escolha de Deus é para os que menos têm, pois Ele completará a deficiência com sua abundância. O Rei-Deus escolhe o que o mundo despreza. Como o conto do bêbado que é salvo por um arrependimento final, Deus justifica os que os homens não conseguem amar.
PISTAS: 1) Devemos olhar os pobres, os famintos, os atribulados, os excluídos, como os preferidos de Deus. Tratá-los como se fossem os ricos, os abastados, os satisfeitos e os honrados e assim seguiremos as palavras de Jesus, expressão da vontade do Rei-Deus que os escolhe. Não porque sejam melhores eticamente, mas porque essa é sua vontade de mudar o mundo. De fato, se essa fosse também nossa escolha, o mundo que nós chamamos de injusto e estruturalmente pecador, seria bem diferente. A redenção revolucionária teria chegado aonde não chega a política humana, a economia de mercado e a distinção de classes sociais.
2)Segundo os fariseus, Deus está entre os que obedecem as exigências da lei; alguns cristãos afirmam que o encontramos na experiência interna de nossa intimidade; muitos não duvidariam de encontrá-lo na santidade dos ritos sagrados; os mais severos o esperam no juízo final e Teresa de Ávila nos deleita assegurando que se encontra entre as panelas. Sem tirar importância a cada asseveração, deveremos escutar com mais atenção as bemaventuranças para tirar conclusões pessoais, como seria o amor à pobreza voluntária, uma correta austeridade de vida, uma simplicidade de escolha, excludente de todo luxo e ostentação, e uma aceitação da crítica mordaz e da solidão de critério por não comungar com soluções fáceis e receitas egoístas em matéria como sexo, matrimônio, filhos e ética social e política.
3) A perseguição é a última das bemaventuranças. Hoje também a Igreja é perseguida, talvez tanto como era no Império Romano. Mas vejamos alguns dados esquecidos pela imprensa porque não são “notícia”: Foram 24 os missionários ou sacerdotes mortos violentamente no ano passado. No Paquistão os cristãos são perseguidos pelo fato de serem cristãos. Na Turquia a perseguição é ideológica e se impede expressar sua fé, marginalizando-os. O Cardeal Van Thuan passou onze anos preso , nove dos quais incomunicados no Vietname. O Bispo de Foochow, D José Zheng Chagcheng, acaba de morrer. Passou 1/3 de sua vida, 28 anos, na prisão, onde devido a seu testemunho aconteceram algumas conversões. E nessa mesma China tem sido queimados 3 mil templos cristãos, todos os bispos estão ou no cárcere ou detidos sob arresto domiciliar; quatro freiras em Moçambique estão ameaçadas de morte por terem delatado a subtração de órgãos de pessoas vivas, raptadas para tal operação. Subscrevo o que afirma um autor eclesiástico: A corrupção que invade o mundo em quase todos os níveis causa grandes derrotas à verdade e à justiça.
07.02.2010
V Domingo do Tempo Comum - ANO C - Verde
__ “Somos uma comunidade de Missionários!” __
Comentário: Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs!
Para anunciar a Deus, é preciso tê-lo "conhecido". Para conhecer a Deus é necessário que "Ele se revele". Não podemos atingir a Deus com nossos silogismos, encerrá-lo em nossos raciocínios. A revelação de Deus é ato soberanamente livre, é iniciativa sua, totalmente gratuita. O homem não tem poder sobre Deus. Ora, o profeta não anuncia uma doutrina abstrata, meramente humana, mas o Deus vivo; ele só é profeta se Deus se lhe revela, se o chama, se o envia. Revelação, vocação e missão estão estreitamente unidas. A Igreja só pode revelar o amor de Deus partilhando este amor com todos os seres humanos. Jubilosamente,
entoemos cânticos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos
em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Is 6,1-2a.3-8): - "Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos; toda a terra está repleta de sua glória."
SALMO RESPONSORIAL (Sl 137): - "Vou cantar-vos ante os anjos, ó Senhor, e ante o vosso templo vou prostrar-me."
SEGUNDA LEITURA (1Cor 15,3-8.11): - "O que vos transmiti, em primeiro lugar, foi aquilo que eu mesmo tinha recebido"
EVANGELHO (Lc 5,1-11): - "Não tenhas medo! De hoje em diante tu serás pescador de homens!"
- "CHAMADOS PARA O DESAFIO"
Reflexão do Evangelho por Diácono José da Cruz
Não sei se os quatro primeiros discípulos, André, Pedro, Tiago e João, estavam de bom humor ao serem chamados por Jesus á margem do Lago de Genesaré, quando trabalhavam duramente limpando suas redes dos “enroscos” que havia nelas, após uma noite de pescaria fracassada. É bom lembrar que tratava-se de um trabalho profissional e não de uma pescaria de lazer, como é uma prática mais perto da nossa realidade.
A proposta de Jesus ao grupo de pescadores parecera descabida, ele pedia-lhes para que insistissem em uma tarefa, que não dera certo ao longo de uma jornada inteira de trabalho noturno, de um jeito diferente, jogando as redes onde ele fosse indicar. Ora, que profissional aceitaria orientação de um estranho em seu trabalho? O horário era desfavorável, quem conhece o litoral sabe que os barcos pesqueiros trabalham à noite, e que de manhã é hora de contabilizar os ganhos com a descarga dos peixes na praia. A proposta vinha como um desafio e implicava em aceitar ou não a palavra de Jesus. Após terem aceitado, fizeram conforme o Senhor lhes ordenara e o resultado fora surpreendente: as redes não resistiram a quantidade de peixes apanhados, sendo necessário partilhar a tarefa com companheiros da outra barca.
Nas barcas de nossas comunidades o resultado do nosso trabalho nem sempre é o que esperamos, pois é preciso estar sempre preparados para o fracasso das “noites” em que as redes voltam vazias, com “coisas indesejadas” que somos obrigados a ‘limpar”, buscamos a santidade de uma vida em comunhão, na justiça, partilha e fraternidade e acabamos encontrando fofocas, intrigas, divisões, coisas que estão em nossa rede embora não façam parte da vida da comunidade, não as queremos, ninguém as deseja, mas elas estão lá, exigindo um trabalho de superação que requer muita paciência e compreensão. Quem já tirou enrosco de uma linha de pesca ou de uma rede, sabe que não é tarefa das mais fáceis.
E de repente, em meio a essa tarefa somos chamados como os primeiros discípulos à “irmos mais fundo”, avançando para águas mais profundas. Será que o nosso papel na comunidade é só ficar consertando as coisas que não deram certo? Claro que não!
A missão primária da igreja não é a excessiva preocupação com si mesma, sua estrutura e seu funcionamento, mas sim em anunciar aos de fora o evangelho de Cristo. Por experiência própria e muitas vezes por puro comodismo, achamos que o trabalho proposto por Jesus não dará nenhum resultado e na maioria das vezes em que o nosso coração nos pede mais ousadia na missão, acabamos preferindo as águas sempre rasas da nossa comunidade, grupo, pastoral, movimento ou associação onde é sempre muito fácil falar de Jesus e do seu evangelho, pois todos gostam, aceitam e até aplaudem! As pessoas vêm até nós e assim passamos o nosso tempo “pescando” no aquário, onde até causamos espanto e admiração, não pelo resultado do trabalho, mas apenas pela nossa performance e desempenho.
Não foi para isso que Jesus chamou os discípulos e nem é para isso que o Senhor nos chamou. Ser missionário é sair do nosso “mundinho” conhecido e entrar na realidade das pessoas, lá onde elas estão e vivem, feiras livres, shopings, grandes avenidas, condomínios residenciais de alto luxo, favelas e áreas verdes onde o medo do narcotráfico mata qualquer esperança, nos hospitais, presídios, asilos etc. E se acharmos que a tarefa é muito grande para as nossas modestas possibilidades, então podemos começar pelas nossas famílias e ambiente de trabalho.
O verdadeiro missionário vai sempre além de suas expectativas, do seu conhecimento, da sua bagagem e experiência, ele sabe que sempre há o risco de um fracasso, mas arrisca-se de maneira corajosa porque é o Senhor quem determina. “...em atenção á sua palavra, vou lançar as redes”. Quando assim o fazemos, acabamos nos surpreendendo com o resultado e rapidamente, como Pedro, descobriremos que não foram nossas aptidões, mas sim a graça de Deus que realizou a missão, dando os frutos em quantidade muito maior do que esperávamos.
E ao tomarmos conhecimento de que a graça de Deus, derramada por Jesus Cristo, move-se e age mesmo em cima de nossas fraquezas e erros, somos tomados pelo medo de nos entregarmos totalmente a Deus.
Então aí só nos resta um caminho: confiar em Jesus e vivermos somente á luz da fé, na certeza de que doravante faremos não do nosso modo, mas do modo dele, mesmo que isso signifique ir contra a nossa lógica e razão. Essa atitude requer uma ruptura até mesmo com aquilo que nos pareça ser essencial, os primeiros discípulos abandonaram na praia as redes e o barco e seguiram a Jesus, pois é impossível edificarmos o reino de Deus do nosso modo.
Pensemos em nossa vocação e nos perguntemos em que águas andamos “pescando”. A resposta irá exigir de nós uma atitude, a partir do evangelho. (5º. Domingo do Tempo Comum)
José da Cruz é
diácono permanente da Paróquia Nossa S. Consolata-Votorantim -
e-mail:jotacruz3051@gmail.com
Homilia Pe. Antoine Coelho, LC
A leitura do profeta Isaías, que nos apresenta a liturgia deste domingo, é sob muitos aspectos consoladora. Trata-se da chamada deste mesmo profeta a anunciar a palavra de Deus.
No ano em que morreu Ozias, Rei de Judá, Isaías é favorecido com uma visão extraordinária de Deus. Vê o Senhor num trono alto e sublime, com a fímbria do manto a encher todo o templo. À sua volta incontáveis serafins cantam a triple santidade de Deus. Com tais orações, tremem as próprias portas do templo, onde se desenvolve a cena. O ar carrega-se de incenso. Nenhum detalhe desta aparição é deixada ao acaso. Tudo é altamente significativo.
Deus é o rei incontestável do universo, sentado num trono alto e sublime. Não existem outros deuses, nem outros tronos. Não existem tampouco outras autoridades que se possam comparar à d’Ele. Mas não é um ser solitário: vive rodeado de uma infinidade de seres, dos quais Ele é a suprema alegria, pois extasiados repetem “santo, santo, santo”. A tríplice repetição do “santo” significa na língua hebreia que Deus possui esta qualidade em grau máximo: n’Ele não há manchas, não se mistura o mal nas suas decisões, o seu ser é puro amor e é unicamente o amor a guiar o seu actuar. Mas é um amor ao mesmo tempo misterioso, precisamente porque é tão elevado. Por isso, não esperemos compreender exaustivamente este amor e os seus caminhos. Confiemos.
Ao mesmo tempo, a tríplice repetição do “santo” é indício de outra coisa. Sugere uma pluralidade em Deus, que não por isso deixa de ser um único Deus. Se Ele somente fosse rodeado de criaturas angélicas, continuaria, no fundo, a ser uma realidade solitária e incompreendida, pois só Deus pode compreender Deus. Só Deus pode ser realmente uma companhia para Deus. Um homem, por mais que estivesse rodeado de animais, continuaria a viver sozinho, a não ser que dispusesse da companhia de outros homens. Mas como sabemos o nosso único Deus é, ao mesmo tempo, a comunidade de amor das três Pessoas divinas, comunidade sem tristezas, nem solidão, o que explica porquê o amor é a realidade mais alta que possa existir.
Mas voltemos ao quadro que nos pinta Isaías. Outro elemento significativo é o facto de que o manto de Deus enche todo o espaço. Deus é o mais alto, sem dúvida, mas isso não implica que esteja fora do mundo. Cobre tudo com o manto, ou seja, com a sua presença protectora. Em cada uma das nossas pequenas casas, em meio das nossas ocupações mais banais, insinua-se o seu amor misericordioso. Mas não basta esse cobertor para que as coisas corram como devem. O que seria esta cena, se Isaías visse os anjos atarefados, com indiferença, em mil coisas e esquecendo o seu Rei a quem tudo devem? O centro da sua atenção não poderia ser outro que Deus a quem gritam sem cessar “santo, santo…”. Tão potentes são os seus brados que todo o templo vibra. Como é poderosa a oração! Ela é também simbolizada pelo incenso que enche o ar a encher-se de fumo, sinal da capacidade que as preces têm de transformar e purificar o ambiente no qual respiramos. Sim, Deus está em todo o lado, mas actua só aí onde é chamado, como o mais humilde dos criados…
A cena termina com o Isaías a angustiar-se: “Ai de mim que estou perdido, porque sou um homem de lábios impuros, moro no meio de um povo de lábios impuros e os meus olhos viram o Rei…” Certamente, não lhe faltam motivos para sentir a sua indignidade, mas eis que contra toda a expectativa aparece um serafim, que lhe põe sobre os lábios um carvão ardente e lhe diz: “isso tocou os teus lábios, desapareceu o teu pecado”. Como está bem representado o amor de Deus através de este carvão ardente! E como existe uma atracção irresistível entre esse carvão, o amor de Deus, e os lábios desse homem que não temeram proferir palavras de humildade! Adão escondeu-se depois do pecado original e esse pecado permaneceu. Isaías ficou e humilhou-se: isso significou um novo início para ele, novo início caracterizado por uma missão, pois a partir de este momento Isaías é enviado aos homens.
O Evangelho, relatando a pesca milagrosa, apresenta-nos uma situação similar e ao mesmo tempo profundamente diversa. Aqui também trata-se de um acontecimento assombroso, que faz pressentir um poder que só pode ser divino. Cristo pede que as redes sejam lançadas em pleno dia, numa altura péssima para a pesca. Mas assim como o manto de Deus cobre as regiões mais longínquas do universo, as “redes espirituais” de Cristo e, no futuro, da Igreja, estendem-se onde quer que seja, sem limites. O número de peixes recolhidos supera por muito o que um pescador poderia esperar.
Aqui também assistimos a um novo início, desta vez para Pedro. Também ele, depois da incrível manifestação de poder por parte de Jesus, não pode deixar de manifestar a sua indignidade da forma mais eloquente. Lançando-se aos pés do Senhor, suplica-lhe que se aparte dele, pois não é mais que um pobre pecador. E justamente, produz-se o contrário daquilo que pede, pois Deus ama estar entre os homens humildes. Assim, Cristo liga-se para sempre ao futuro chefe da Igreja: “Não temas. Daqui em diante serás pescador de homens”.
Uma diferença essencial entre as duas cenas salta, no entanto, à vista. No caso de Isaías, o homem de Deus é absorvido no mundo de Deus e assiste à liturgia celeste. No caso de Pedro, é Deus a entrar no seu universo de pescador. É Deus que entra na sua barca e mais ainda, na sua vida, porque Cristo o acompanha para a pesca. Aqui não encontramos serafins que transportam carvões ardentes. É Deus mesmo a tranquilizá-lo com palavras tão singelas quanto profundas. “Não temas!” Sim, esse Deus-homem, Cristo, não deve ser temido. Quem teme uma irrupção violenta do divino na sua vida, que o força uma conversão e o aparta das coisas que ama, precisa ler atentamente esta passagem. É verdade que Deus purifica o homem e é bom que assim seja, mas este processo é feito com tanta arte e suavidade, com tanta compreensão da situação e do drama humano na qual nos encontramos, que podemos sem qualquer receio começar um caminho espiritual, por onde Ele saberá guiar-nos com impar pedagogia.
Realmente, Pedro não podia imaginar o que significaria para ele ser “pescador de homens”. Mas vejam como até na formulação da missão, Deus usa os términos mais familiares possíveis a Pedro. Pescador é o que ele tem sido toda a vida! Sim, o que temos sido toda a vida com tudo o que ela tem de bom, de válido e de reconfortante, Deus não o destruirá nunca, mas o elevará até uma altura inimaginável. Um sinal de isso é precisamente a pesca milagrosa: todas as potencialidades de Pedro serão agora multiplicadas infinitamente, porque não será ele simplesmente a actuar, mas Deus com ele. E, se algo do que tínhamos ficou no caminho, é porque não possuía grande importância para nós ou porque, inclusive, era nocivo.
Ajudemos, pois, esse Deus a entrar nas nossas vidas e nos nossos lares. Eis que Ele bate suavemente à porta, como ensina o livro do Apocalipse, não a romperá: “Olha que estou à porta e chamo; se alguém ouvir minha voz e me abrir a porta, entrarei em sua casa e jantarei com ele e ele comigo” (Ap 3, 20-21).
Comentário Exegético – V Domingo do Tempo Comum - Ano C
feito por Pe Ignácio, dos padres escolápios (extraído do site http://www.presbíteros.com.br)
EPÍSTOLA (1Cor 15, 1-11)
INTRODUÇÃO: Parece que os de Corinto aceitavam uma ressurreição parcial, ou seja, uma sobrevivência da alma, sem o corpo. Esta perícope é, por isso mesmo, tanto mais essencial e importante, porque define a ressurreição como sendo uma ressurreição corporal, e portanto, rejeita, desde o início, as teorias modernas dos que falam de aparições subjetivas ou internas sem que a visão seja tal que até poderia ser captada por uma máquina fotográfica ou uma câmara de filmar. Dentre os testemunhos, o do próprio Paulo é importante, não só porque temos o escrito de uma testemunha viva, mas porque este escrito é anterior aos evangelhos [23 anos após a morte de Cristo] e até mais completo em certos detalhes, indicando que o número dos que viram o Cristo ressuscitado é tal que não existe depoimento semelhante em toda a história de um fato extraordinário tão unânime e numeroso como este. Paulo viu o Senhor no caminho de Damasco [cerca de 8 anos após a morte de Cristo] e ninguém poderia tirar de sua cabeça a idéia, ou melhor, a fé de que ele viu o Cristo vivo em corpo e alma. Um corpo espiritual, mas corporal e físico. A este corpo apontam os dois relatos de João quando afirma que, estando tudo fechado, Jesus entrou (Jo 20, 19 e 26). Para que o detalhe das portas, se era uma simples visão mais ou menos imaginária? Porém se era um corpo real então o detalhe aumenta o prodígio da aparição, que é, sem dúvida, o que o evangelista deseja realçar. Vejamos os versículos em separado.
A TRANSMISSÃO: Portanto, vos transmito, irmãos, o evangelho que vos anunciei, esse que também recebestes e no qual tendes permanecido (1). Notum autem vobis facio fratres evangelium quod praedicavi vobis quod et accepistis in quo et statis. TRANSMITO: O verbo gnörizö [<1107 =notum facere] é traduzido fielmente pela Vulgata. Lembrar, trazer à memória, recordar, parece um tanto livre e sem de vigor. A tradução inglesa literal fala de reveal [revelar] que se fosse pela primeira vez estaria muito bem escolhido, pois é o sentido que lhe dão os clássicos. Preferimos o transmitir no sentido de comunicar ou propagar uma notícia. EVANGELHO: Em grego euaggelion <2098> palavra que sai 57 vezes nas cartas paulinas, com diferentes adjetivos que a determinam como anúncio: 1) simplesmente evangelho (27), ou anúncio de uma Boa Nova como é a vinda do Reino de Deus, que para Paulo tem conotações de perdão e salvação gratuitos por parte de Deus em seu Filho.- 2) de Cristo , Jesus Cristo, ou Filho de Deus (10 vezes).- 3) de Deus (8 vezes).- 4) próprio de Paulo no sentido de ser dirigido aos gentios com especial cuidado para anular a Torah antiga, evangelho dos incircuncisos (11).- 5) Uma vez evangelho da paz (Ef 6, 15). Qual é a essência deste evangelho? Veremos a solução de imediato nos próximos versículos desta carta. Antes de mais nada, teremos que afirmar que a base desse evangelho é a Ressurreição de Cristo, testemunhada pelos que foram seus apóstolos, como anunciantes desse fato extraordinário, do qual foram testemunhas. (1Cor 15, 14).
ANUNCIEI: São Três os estágios que levaram à fé aos de Corinto: anúncio por parte de Paulo; recepção submissa por parte dos fieis convertidos, e finalmente perseverança na fé recebida. Nisso podemos ver as características da fé de cada cristão autêntico.
A DOUTRINA: Pelo qual também estais salvos com uma [certa] palavra, com a qual vos evangelizei, se a retendes, a não ser que acreditastes em vão (2). per quod et salvamini qua ratione praedicaverim vobis si tenetis nisi si frustra credidistis CERTA PALAVRA: Tini logö; a tradução literal seriacerta palavramas o tis acompanha um nome para indicar o artigo mais ou menos indeterminado como Samareites tis, certo samaritano [=um samaritano sem nome, comum], que indica uma indeterminação, como sendo um uso geral ou comum do nome. No caso, esse evangelho foi anunciado de palavra e poderíamos traduzir salvos pela palavra que vos anunciei. PALAVRA: logos [<3056>= ratio] pode ser traduzido por palavra, discurso, doutrina, razão. A Vulgata usa ratio. Poderíamos traduzir pela doutrina que vos anunciei. Essa salvação depende de manter firme essa doutrina na qual acreditaram os evangelizados, exceto o caso de ser inútil a fé por não acreditar na ressurreição fica fora de nossa fé, como era o caso do romance S. Manuel Bueno, Mártir de Unamuno. Tendo o conjunto da perícope atual, a tradução por ele também sois salvos, se retiverdes a palavra tal como vo-la preguei, a menos que tenhais crido em vão é uma tradução interpretativa legítima, que, embora não seja literal, reflete perfeitamente o pensamento do apóstolo, por vezes algo confuso em sua redação.
A BASE DA FÉ: Principalmente vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras (3). tradidi enim vobis in primis quod et accepi quoniam Christus mortuus est pro peccatis nostris secundum scripturas. PRINCIPALMENTE: é a tradução de en prötois, uma frase adverbial que é traduzida como first of all [=antes de mais nada], que indica prioridade em ordem mais do que em tempo e lugar. ENTREGUEI/RECEBI: Estafrase de Paulo é uma confirmação de que não só as Escrituras, mas a tradição é a base da fé que Paulo entrega como a recebeu. Em ordem lógica e cronológica deveríamos falar de receber para transmitir ou entregar. Claro que a última razão que dá valor à tradição é sua conformidade com as Escrituras. Sendo estas um documento escrito, sua interpretação ou manipulação é mais difícil e, portanto tem um valor documental probatório maior que a palavra das testemunhas. Tudo isto Paulo sabe perfeitamente e daí seu empenho em apresentar as testemunhas, variadas e múltiplas em conformidade com as Escrituras. Porém se no campo judicial a palavra das testemunhas [a tradição] é válida, por que no campo religioso não é e se rejeita como palavra de homem e não como testemunha viva de fatos e ditos como é a palavra de Deus? Para que os profetas se os evangelistas e apóstolos dizem tudo? Como interpretá-los caso aconteça dúvida ou incerteza? É uma norma e senso comum que existem várias interpretações e nenhuma delas pode ser verdadeira. É o que acontece com a livre interpretação das escrituras, que, aliás, receberam sua autenticidade não por livre escolha, mas pela aceitação de sua doutrina com a tradicional anunciada pelos apóstolos. Mas vejamos o primeiro artigo de fé desse pequeno credo apostólico, anterior ao credo dos apóstolos, este tardio, anterior ao de Niceia (325), pois aparece em Hipólito em 215 e, em formas similares, em Irineu e Tertuliano; porém, não aparece na Igreja oriental e só com Pirminio (+753) encontramos uma forma idêntica à atual que chamamos de Credo breve. O evangelho que Paulo resume neste pequeno credo tem só 3 artigos: morte, sepulcro, ressurreição. Todos eles dizem respeito ao Cristo. O primeiro é a morte. Se Cristo não morreu é inútil pregar a ressurreição. MORREU: Apethanen [<599>= mortuus est] A morte de Jesus é indiretamente assumida como certa, porque foi feita para remissão dos pecados como pagamento/resgate da dívida, e isso recebe o nome de redenção [lutron <3083>e apolutrosis <629>=redentio] (Mt 20, 28 e Rm 3, 24). Comenta Davic Guzik: Num determinado momento, antes do grito Tudo está consumado, uma terrível mudança espiritual realizou-se: O Pai depôs em seu Filho Jesus toda a culpa e o castigo que nossos pecados mereciam. Ele recebeu toda a ira divina que devia ser arremessada contra nós, daí que Jesus se sentisse pecado e abandonado por Deus (Mt 27, 46). Este era o cálice que tinha de beber, como se fosse um inimigo de Deus, o cálice da ira de seu Pai ( Is 51, 17) para que nós não tivéssemos que bebê-lo, como está escrito em Jr 25, 15 e Sl 75, 8. assim, lemos em Is 53-3-5: (o meu servo) era desprezado e o mais rejeitado entre os homens; homem de dores e que sabe o que é padecer; e, como um de quem os homens escondem o rosto, era desprezado e dEle não fizemos caso. Certamente Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si; e nós O considerávamos por aflito, ferido de Deus e oprimido. Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre Ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. ESCRITURAS: Da morte de Jesus está escrito no Salmo 22, 15: a língua se me apega ao céu da boca. Assim me deitas no pó da morte. E em Dn 9, 26: Depois das sessenta e duas semanas será morto o Ungido [Cristo] do Senhor e já não estará; e o povo de um príncipe que há de vir destruirá a cidade e o santuário. Finalmente em Is 53, 8: por juízo opressor foi arrebatado e de sua linhagem quem dela cogitou? Porquanto foi cortado da terra dos viventes; por causa da transgressão do meu povo, foi Ele ferido.
SEPULTADO E RESSUSCITADO: E que foi sepultado e que ressuscitou no terceiro dia segundo as Escrituras (4). et quia sepultus est et quia resurrexit tertia die secundum scripturas. SEPULTURA: Lemos em Isaías 53, 9: Designaram-lhe a sepultura com os perversos; mas com o rico esteve na sua morte porque nunca fez injustiça nem dolo algum se achou em sua boca. O dito do profeta concorda com os fatos que lemos nos evangelistas. RESSURREIÇÃO: Nas Escrituras temos este versículo que foi citado por Pedro no seu discurso do dia de Pentecostes: Não deixarás a minha alma na morte , nem permitirás que o teu Santo veja a corrupção (Sl 10, 16). TERCEIRO DIA: Está implícito em não ver a corrupção. Os judeus acreditavam que a alma estava unida ao corpo depois da morte e que no quarto dia quando começava a corrupção se afastava do seu corpo porque para ela era então irreconhecível. A ressurreição não é um adendo, como um postulado ou corolário, mas é a maior prova de Jesus como enviado do Pai e constitui o fundamento da fé. Os atenienses riram de Paulo quando este, deixando a sabedoria humana apela para a ressurreição de Cristo ( At 17, 32). Tanto em Pedro como em Paulo, o tema da ressurreição foi a base dos discursos mais importantes de ambos os apóstolos. A supervivência da alma era crença bastante comum entre os gregos, mas a ressurreição do corpo era um absurdo para os mesmos ambientes culturais.
INÍCIO DAS APARIÇÕES: E que foi visto por Kefas; depois pelos doze (5). et quia visus est Cephae et post haec undecim.Esta é a terceira afirmação dogmática deste credo primitivo que provavelmente era pedido antes do batismo. FOI VISTO: em grego öfthë [<3700>=visus est] indica uma visão real e não uma aparição como um fantasma ou um espírito ( ver Mt 14, 26 e Lc 24, 37). Mas como disse Jesus aos doze, na primeira aparição, um espírito não tem carne nem ossos como vedes que eu tenho (Lc 23, 39). De fato, vejamos os relatos das aparições de Jesus. Mt 28, 9: As mulheres aproximando-se abraçaram-lhe os pés e O adoraram. Marcos usa o verbo fainö [<5316>=apparere] vir à luz, aparecer (Mc 16, 9). Em Lucas 24, 4 o efistëmi[<2186> =stare] dos anjos e o optanomai<3700> =apparuit de Pedro (Lc 24, 34) ou istëmi [<2476>=stare] de 24,37 . Opthomai é ver em todos os sentidos possíveis como em Mateus 5, 8 os limpos de coração verão a Deus ou metaforicamente tu verás como foi a resposta a Judas, após este ter-se arrependido (Mt 27, 4) ou Lc 3, 6 em que toda carne verá a salvação de Deus. Em aoristo e passiva é visto ou apareceu (Lc 22, 43). Os relatos da ressurreição são breves resumos em que à exceção de João é mais importante a catequese ou teologia do que a história propriamente dita. Porém, em Paulo, todos coincidem na veracidade de que o Cristo visto é o Cristo morto cujo corpo está vivo agora de modo que a ressurreição é o triunfo sobre a morte. Antes de fazer uma incursão textual em João temos que certificar que a aparição particular a Pedro forma também parte da chamada tradição de Lucas, pois os doze afirmaram aos de Emaús: o Senhor ressuscitou e já apareceu [öpthë de öptomai<3700>] a Simão (Lc. 24, 34). João, fiel à sua promessa de unicamente narrar o que tinha visto como testemunha ocular ou diretamente ouvido de quem era testemunha usa os seguintes verbos gregos que comparamos com as traduções latinas: Theöreö <2334>=videre em 20, 12; oraö <3708>=videre em 20, 18 e 20, 29; istemi<2476>stetit estar de pé em 20, 19; eidö<1492>=videre (20,25; 29 e 21,4) e finalmente faneroö<5319>=manifestare em 21, 1 e 21, 14). Theoreö é ver detalhadamente, ou seja, observar como é o empregado quando as mulheres observaram o sepultamento de Jesus (Mt 27, 55). Oraö é olhar com os olhos ou com o entendimento como em Marcos 8, 24 vejo os homens como árvores e Olha, que a ninguém digas nada (Mc 1, 41). Realmente o verbo Blepö <991> é olhar com a vista como dirá Jesus porque vendo não veem e ouvindo não ouvem (Mt 13, 13), mas também metaforicamente tem o mesmo sentido que oração: Vede que ninguém vos engane (Mt 24, 4). Mas este verbo não sai nas visões da ressurreição. Eidö que além de ver tem o sentido desconhecer. Como ver é vimos o seu astro ao nascer e viemos para adorá-lo (Mt 2, 2) como conhecer, pois vosso Pai celeste sabe que necessitais (Mt 6, 32). Faneroö é manifestar, ou uma verdade como em Mc 4,, 22:nada está oculto senão para ser manifesto, ou a aparição de uma pessoa que se torna visível como em Mc 16, 14: apareceu Jesus aos onze quando estavam na mesa. Como vemos, todos os vocábulos empregados têm uma base comum: a visão como manifestação de uma pessoa viva que está presente e com a qual podemos falar e conversar. Nada de visões interiores ou sonhos em vigília. São muitos os que veem e ouvem como para afirmar que existe uma auto-sugestão ou que é uma visão interior. Evidentemente ninguém viu a ressurreição, mas muitos viram o ressuscitado. Entre eles, primeiro e principalmente Simão Pedro, a quem Lucas chama Simão (Luke 24:34) e Paulo Kefas. É o cumprimento da promessa de Jesus na última ceia (Lc 22, 32). PELOS DOZE: Este encontro com Jesus ressuscitado foi feito em duas etapas, segundo João (20, 19-23 e 26-29), das quais a primeira foi também narrada por Lucas (24, 36-40) e Marcos (16, 14-20) e Mateus (28, 16-20). Como nota curiosa Marcos e Mateus falam dos onze com mais propriedade e a aparição aos onze de Mateus foi feita num monte da Galileia. Estes detalhes servem para esclarecer sobre toda a veracidade dos evangelistas, como se houvesse contradição entre as testemunhas. A história dos tempos de Jesus não era crítica e os evangelistas não pretendiam relatos exatos, mas narrações catequéticas em que podemos ver uma história estereotipada. Uma prova são os dois relatos de Lucas: o final do evangelho e o início dos Atos que parece não terem nada em comum. Paulo, por sua parte, usa o nome comum com que era conhecido o grupo apostólico: os doze, título evidentemente figurativo.
OUTRAS APARIÇÕES: Posteriormente, foi visto por mais de quinhentos irmãos juntos, dos quais a maioria permanece até agora, mas alguns dormiram (6). deinde visus est plus quam quingentis fratribus simul ex quibus multi manent usque adhuc quidam autem dormierunt. Esta é uma afirmação paulina da qual não encontramos correspondência nos evangelhos a não ser nos relatos finais de Marcos e Lucas em Atos 1. 3 sobre as aparições dos 40 dias. A razão de ter trazido este testemunho é que ainda na data da epístola a maioria estava viva para testemunhar. Provavelmente era o ano 57, ou seja 23 anos após a morte de Jesus. DORMIRAM: É uma expressão que oscristãos usavam para a morte.
TIAGO E OS DOZE: Posteriormete foi visto por Tiago depois por todos os apóstolos (7). deinde visus est Iacobo deinde apostolis omnibus. Não sabemos se esse Tiago é o irmão do Senhor, que é diferente do grupo dos apóstolos, caso seja o de Alfeu(Lc 6, 15) teríamos que um dos dois discípulos de Emaús seria este Tiago ou Cleopás (Lc 24, 18). Logo, de novo, por todos os apóstolos, com o quais Paulo confirma as duas vezes em que apareceu o Senhor aos mesmos, segundo João (20, 19-23 e 20, 26-30).
VISÃO DE PAULO: Finalmente, porém, de todos como de um último nascido, foi visto também por mim. (8). novissime autem omnium tamquam abortivo visus est et mihi, ÚLTIMO NASCIDO: Ogrego Ektröma [<1626>=abortivus] é um composto de ek [fora] e tritösko [causar ferida] que pode ser traduzido como nascido fora de tempo, muito mais do que aborto, cuja palavra em grego é melhor traduzida por examblöma. Assim como nascido ultimamente, é traduzido no NASB, e Paulo explicará esse seu nascimento como coisa especial no versículo 9. Já sabemos como Paulo viu o Senhor no caminho de Damasco, através de uma luz que o cegou e que foi narrada três vezes, com alguma diferença de detalhes, no livro dos Atos, capítulos 9, 22 e 26.
CONFISSÃO DE PAULO: Pois eu sou o último dos apóstolos que não sou digno de ser chamado apóstolo, porque persegui a Igreja de (o) Deus (9). ego enim sum minimus apostolorum qui non sum dignus vocari apostolus quoniam persecutus sum ecclesiam Dei. Parece que Paulo usa o significado do seu nome, Paulos [pequeno de estatura] para se nomear como o últimoentre os apóstolos e, além disso, pela razão de ser um perseguidor. Precisamente esta última razão é suficiente para afastar toda sugestão nessa revelação e manifestação divinas.
A GRAÇA QUE FRUTIFICOU: Pois por mercê de Deus sou o que sou; e a mercê dEle, a sobre mim, não foi vazia, mas trabalhei melhor que todos eles, não eu porém, mas a graça de (o) Deus, a comigo (10). gratia autem Dei sum id quod sum et gratia eius in me vacua non fuit sed abundantius illis omnibus laboravi non ego autem sed gratia Dei mecum.A tradução é um tanto esquisita, mas quis que fosse a mais literal possível. Diante desse título de paulos [pequeno] o apóstolo Paulo, que a si mesmo se intitula o mínimo e indigno entre todos os apóstolos, agora eleva um hino à bondade de Deus que se dignou escolhê-lo por pura graça no sentido de um favor imerecido que traduzimos por mercê. Mas também tem Paulo um pouco de vanglória ao afirmar que ele não foi indigno dessa graça, mas cooperou até mais do que os outros, não por ser ele melhor, mas porque a graça de Deus assim o quis. De fato ele adquiriu o Status de Pedro, como apóstolo da Igreja dos gentios, comparado com Pedro como apóstolo da igreja dos judeus (Gl 2, 8).
A FÉ COMUM: Pois, já eu, já eles, assim anunciamos e assim acreditastes (11). sive enim ego sive illi sic praedicamus et sic credidistis. E termina Paulo com uma norma que deveria ser o fundamento de toda crença na Igreja: a fé comum anunciada e, portanto, acreditada pelos anunciantes, que constituem o sensus fidelium, o dom profético de Cristo participado e testemunhado pela massa dos fieis, que não pode falhar na crença e que a aplica integralmente na vida (Lumen Gentium 12).
Evangelho
A PESCA MILAGROSA ( Lc 5, 1-11)
(LUGARES PARALELOS: Mt 2, 5-22 E Mc 1, 16-20)
INTRODUÇÃO: Este domingo pode ser chamado de domingo da vocação, que brota da palavra de Deus, patente na vocação de Isaías (1ª leitura), de S. Paulo (2ª Leitura) e dos quatros discípulos de Jesus (evangelho). O evangelho de hoje contem três seções em conexão progressiva: Pregação de Jesus. Pesca milagrosa. Vocação dos quatro primeiros discípulos. Em todos os casos de vocação, vemos que terminam com uma resposta incondicional por parte do vocacionado. O abandono de toda outra ocupação, optando pela missão divina até deixar familiares, como Jesus pretende e fez na sua vida pública, é a resposta humana ao chamado divino. Jesus fundamenta seu convite, de modo especial a Pedro, na captura excepcional de peixes que indica o número de seguidores que eles logo iriam conquistar.
LUGARES PARALELOS: Mateus e Marcos oferecem relatos paralelos a este de Lucas. Porém faltam neles alguns detalhes importantes, sem os quais o chamado dos primeiros discípulos tem um ar de efeito sobrenatural. Lucas, após Jesus se auto-proclamar enviado divino em Nazaré, inicia a vida pública de Jesus, pregando às margens do lago de Genesaré. Lucas, ante o caso singular de serem pescadores, mal vistos como classe no mundo da oikumene (sob o domínio romano), explica sua eleição com detalhes que a justificam. O ensinamento de Jesus, proferido do barco como nova cátedra da qual ensina seu evangelho para não ser esmagado pela multidão, deu lugar a que: sendo o barco de Simão Pedro, será este quem usará a cátedra da qual o Espírito fala à Igreja. A pesca milagrosa identifica simbolicamente pescadores de peixes com seguidores que procuram discípulos e ampliam sua obra em todos os lugares e tempos. Os primeiros cristãos verão no peixe o símbolo mais exato daqueles que desenhavam como peixe e chamavam Iesus Xristós Theou Uiós Soter, com as letras em negrito formando o nome do peixe [IXTHUS]] em grego, que, extensivamente, é lido Jesus Cristo, de Deus Filho, Salvador. Todo Cristão, pelo batismo, está imerso no Espírito como um peixe está na água e pode ser chamado de peixe de Deus. Assim pescadores e peixes, discípulos e conversos, estão intimamente unidos na barca de Pedro e em Jesus que é representado pela figura simbólica do peixe. Existe também um paralelo com Jo 21, 4-11 relato de especial importância para a vocação de Pedro em que anuncia a grande quantidade de gentios que formariam parte do reino com a captura de grande número de peixes.
À BEIRA MAR: Sucedeu, pois, que ao comprimi-lo a multidão para ouvir a palavra do (sic) Deus, porque Ele estava de pé junto ao lago de Genesaret (1), então viu dois barcos que estavam junto do lago já que os pescadores, tendo descido deles, lavavam as redes (2).Factum este autem cum turbae inruerent in eum ut audirent verbum ut audirent verbim Dei et ipse stabat secus stagnum Gennesareth. Et vidit duas naves stantes secus stagnum piscatores autme decenderant et lavabant retia. Lucas emprega o egeneto de [factum est latino] como carimbo da casa. É a frase típica para começar um novo capítulo ou episódio, sem ligar temporariamente as duas narrações, a anterior e a posterior ao enlace. Ao afirmar que estava comprimido pela multidão diz o mesmo que Marcos em 3, 9, pelo qual teve que pedir um pequeno barco [ploiarion, navícula] para se separar do povo que o apertava. Se em Marcos, Jesus pede aos discípulos para que lhe proporcionassem o barco, em Lucas, foi Ele quem viu dois barcos varados na praia, junto ao mar, já que os donos tinham descido deles e estavam limpando as redes.
A CÁTEDRA: Tendo embarcado, pois, num dos barcos, que pertencia a Simão, pediu a ele afastá-lo um pouco da terra e, tendo se assentado, ensinava desde o barco às multidões(3). Ascendens autem in unam navem quae erat Simonis rogavit eum a terra reducere pusillum et sedens docebat de navicula turbas. O fato de ser o barco de Simão indica um detalhe, que dá um sentido verídico aos fatos narrados e um pormenor essencial para a Igreja primitiva. O barco em questão indicava a cátedra, lugar oficioso ou oficial do qual os mestres lecionavam assim como a curul era a cadeira oficial do magistrado da justiça. O afastamento era o suficiente para que as multidões não o comprimissem porque todos desejavam tocá-lo por causa da dynamis [poder] que dEle saia para curar as doenças (Mt 14, 36). Jesus estava de pé junto à margem e era praticamente impossível não ser oprimido ou apertado pela multidão, impedindo que sua voz chegasse a todos os ouvintes. Por isso escolhe geralmente o cimo de um monte (Mt 5, 1) ou o portal de uma casa (Mc 2, 2). Aqui, ele escolhe um barco de pesca, que Marcos chama com propriedade ploiarion (barquinho), diminutivo de ploion, barco em geral, ou nave. Alguns manuscritos gregos importantes também usam ploiarion neste relato, com mais propriedade do que ploion. No inglês distinguem entre small ship e ship em geral. Somente Marcos e João fazem distinção entre barquinho e barco. A primeira palavra sai duas vezes em Marcos (3,9 e 4, 36) e 4 vezes em João. O ploion [barco], é usado em todas as ocasiões por Mateus, 12 vezes, e 8 vezes em Lucas. Sem dúvida que estes fatos confirmam que Marcos, discípulo de Pedro, e João, o pescador de Betsaida, são as fontes e até autores dos dois evangelhos a eles atribuídos. Lucas não conhecia a geografia do norte da Palestina e fala de barcos em geral, sem saber que os pequenos botes dos pescadores deveriam ter uma palavra mais apropriada. Talvez por isso haja uma tradução, não muito conforme com o original grego, na segunda parte da vulgata: ploion é barco e ploiarion é barquinho ou bote. A segunda vez a vulgata traduz navícula que não corresponde ao ploion grego, mas ao ploiarion.
O MANDATO: Porém, como cessasse de falar, disse a Simão: conduzi ao profundo e lançai vossas redes para a captura (4). Ut cessavit autem loqui dixit ad Simonem duc in altum et laxate retia vestra in capturam. Não sabemos a hora do dia. Talvez fosse ao entardecer, quando Jesus acabou seu sermão, livre de travas legais ou escriturísticas, usando linguagem popular e exemplos para gravar seu ensinamento que geralmente chamamos de parábolas. Jesus teve dois motivos para a pesca que seria espetacular, senão milagrosa. O primeiro era pagar a contribuição de Pedro. O segundo era prepará-lo para obedecer o chamado como pescador de homens. O grego abaixar é traduzido ao latim por estender as redes. Tratava-se de uma rede de arraste.
PEDRO: Então, tendo respondido, Simão disse-lhe: Mestre, durante toda a noite temos nos esforçado; nada apanhamos. Mas sobre tua palavra, abaixarei a rede(5). Et respondens Simon dixit illi praeceptor per totam noctem laborantes nihil cepimus in verbo autem tuo laxabo rete. PEDRO: Simeão, ou Simão como abreviatura, recebe uma preeminência notável por parte do terceiro evangelista. Na eleição dos apóstolos ele figura em todas as listas em primeiro lugar e Lucas diz que era Simão ao qual deu o nome de Pedro, no qual coincide com Marcos. Mateus dirá Simão a quem chamam Pedro. Simeão significa famoso e Pedro é a tradução latina de petra (rocha em grego) que por sua vez traduz o Kefas aramaico. A barca de Pedro deu lugar a diversos simbolismos: Nave, que como a antiga arca de Noé salva do naufrágio universal. Nave, dirigida com certeza ao porto de salvação. Nave, de onde podemos melhor ouvir a voz do Senhor Jesus, como aconteceu no lago. Nave, transformada em cátedra de verdade pela escolha divina. Simão Pedro sabia perfeitamente que a hora e as circunstâncias não eram propícias. Por isso ele inicia sua resposta com um é inútil, Senhor. MESTRE: A palavra mestre, tem em grego duas palavras: epistates, que poderíamos traduzir por patrão e didaskalos, cuja tradução é mestre]. Somente em Lucas encontramos o epistates, nesta ocasião muito mais apropriado do que didaskalos. Um outro apelativo com o qual se dirigem a Jesus, especialmente os inimigos, é o de Rabbi. Aqui Pedro trata a Jesus como um superior, um chefe que deve ser obedecido. Epistátes, originalmente com o significado de chefe, patrão (o que é superior ou está por cima) tem também o significado de mestre com poder de mando, com o poder que dá a sabedoria, assim como didáskalos tem o significado de mestre que ensina. Em Lucas, somente os discípulos chamam Jesus de epistátes, porque submetidos ao seu domínio e direção enquanto os outros o chamam de didáskalos. AS REDES: Já temos falado sobre o verbo chalao, laxare, afrouxar ou abaixar, que, tratando-se de redes, implicava numa rede de arrastão.
A PESCA: E tendo feito isto apanharam uma grande quantidade de peixes, pois rompia-se a sua rede (6). Et cum hoc fecissent concluserunt piscium multitudinem copiosam rumpebatur autem rete eorum. O milagre, como provindo de parte de Deus, é de uma abundância assombrosa. Sobraram 12 cestos após todos comerem de forma satisfatória (Mt 14, 222). Também aqui a abundância é notória, de modo que a rede estava a ponto de se romper pela massa enorme da captura.
A AJUDA: Então sinalizaram aos sócios os no outro barco para que chegando, os ajudassem, e vieram e encheram ambos os barcos de modo que se afundavam (7). Et annuerunt sociis qui erant in alia navi ut venirent et adiuvarent eos et venerunt et impleverunt ambas naviculas ita ut mergerentur. Segundo alguns comentaristas a narração é um duplicado de João 21,6, a pesca frutífera dirigida por Jesus após a sua ressurreição. O motivo é a tendência a não admitir o milagre ou o sobrenatural nos relatos evangélicos. Porém os detalhes em ambos os relatos são completamente diferentes, embora algumas pessoas e a geografia sejam comuns. Por isso devemos admitir uma cena própria, independente, para o relato de hoje. Esta é a única interpretação verdadeiramente lógica: Jesus quis indicar como sinal, o que devia acontecer com os pescadores de peixes que logo, logo, transformar-se-iam em “captadores de homens vivos”. Essa é a tradução de Zogron grego, capiens latino. A pesca milagrosa de João tem como figura central unicamente um barco. Como protagonistas, pessoas diferentes dos dois irmãos filhos de Jonas. Era o amanhecer, que não condiz com a hora em que Lucas propõe o mandato de Jesus, que seria uma hora próxima ao meio dia ou ao entardecer.
A CONFISSÃO: Tendo, pois, visto, Simão Pedro se prostrou aos joelhos de Jesus, dizendo: Afasta-te de mim porque sou homem pecador, Senhor (8). Porque o pasmo o dominava e a todos os que com ele (estavam) sobre a captura dos peixes que recolheram (9). Quod cum videret Simon Petrus procidit ad genua Iesu dicens exi a me quia homo peccator sum Domine. Stupor enim circumdederat eum et omnes qui cum illo erant in captura piscium quam ceperant. A primeira coisa que encontramos neste versículo é a fé de Pedro. Bastava contemplar a pesca com o espírito religioso como os pescadores do rio Paraíba no porto de Iguaçu encontraram a imagem da santa que hoje conhecemos como Aparecida. Precisamente, Pedro contempla o fato como uma Epifania, uma demonstração de alguém que é superior, (o epistátes já o indicava) com poderes extraordinários, próprios de uma manifestação divina. Ele vê o fato como testemunha direta; e imediatamente se enche de estupor e sabe que está diante de um milagre, um dynamis [poder] sobrenatural. E deduz que o milagre é produto do poder e mandato de Jesus, a quem tinha chamado de patrão e que agora chama de Senhor, no sentido transcendental da palavra. É por isso que em espontânea adoração, se prostra para beijar os pés de Jesus, como um escravo fazia com seu amo: é a proskinesis, em que os pés neste caso são substituídos por joelhos, embora alguns manuscritos falem de pés. O importante é que Pedro acompanha sua ação com umas palavras nas quais, não unicamente expressa sua admiração, mas também sua profunda humildade: Sou homem pecador. É o não sou digno, dito com expressão de reconhecimento de sua indignidade. Pecador aqui é um adjetivo, diferente de quando é usado como nome, com o significado de gentio, como na frase de publicanos e pecadores (ver Lc 7, 34). Por isso dirá Paulo: Nós somos judeus de nascimento, não pecadores (descendentes) dos gentios (Gl 2, 15). Sem dúvida que esta disposição de aceitar o mal e o erro dentro da vida como própria responsabilidade, é a melhor disposição para se tornar instrumento da intervenção divina. É o caso de Isaías em 6, 5. O testemunho de Pedro não é único. Os colegas e sócios também o confirmam cheios do mesmo estupor que dominava os sentimentos de Simão.
O CHAMADO: Também e de modo semelhante Jacob e João, filhos de Zebedeu, os que eram sócios de Simão. Então Jesus disse a Simão: Não temas desde agora serás captador de homens(10). Similiter autem Iacobum et Iohannem filios Zebedaei qui erant socii Simonis et ait ad Simonem Iesus noli timere ex hoc iam homines eris capiens. Com esta introdução o evangelista indica que também os outros discípulos se prostraram diante de Jesus como sendo alguém superior, em contato com a divindade. A proskinese, como o ato de submissão de um súdito a seu rei, ou de um vencido ao vencedor, reconhecendo sua superioridade, não tinha por que ser uma adoração; mas estava unida a uma relação do grande rei com a divindade cujo principal ofício era ser seu representante na terra. Hoje diríamos beijar a mão, como vemos nos atos oficiais ao saudar os monarcas ou com sacerdotes e representantes da autoridade religiosa (ver comentário deste mês, em Epifania). SIMÃO: A sua nova missão será também uma captura: mas não de peixes numa rede mas de homens vivos na rede mística do evangelho por ele anunciado (Mt 13, 47). A NOVA PESCA: De agora em diante o pescador terá um novo ofício: apanhará vivos os homens. Essa a tradução literal do texto. Que significa esta metáfora que muda a vida de Pedro e a vida de muitos homens enredados na sua nova rede? É a metáfora que recolhe seres humanos para aumentar o Reino. Jeremias, no capítulos 16, diz como o Senhor recolherá para a volta do exílio através de pescadores e caçadores, os homens. Era um momento de esperança e de atuação direta de Jahweh para bem de seu povo. Também Amós 4,2 usa o simbolismo do peixe fisgado pelos anzóis dos pescadores, neste caso para julgar os malvados. Porém, no nosso caso, Pedro é escolhido para bem dos homens, para congregá-los, salvos da morte (por isso vivos) e preservados para a vida, ao formar parte do Reino como seguidores de Jesus. Evidentemente que os outros discípulos que aqui deixam tudo e se reúnem com Jesus tem o mesmo ofício. Mas é Pedro, sempre singularmente, quem recebe diretamente essa incumbência de modo especial. Um emprego material é substituído por uma missão totalmente espiritual e atemporal.
O SEGUIMENTO: E tendo puxado os barcos sobre a terra, tendo abandonado todas as coisas, o seguiram (11). Et subductis ad terram navibus relictis omnibus secuti sunt illum. Assim, tão simplesmente, descreve Lucas a resposta dos primeiros discípulos após esta pesca milagrosa. Sem se despedir dos familiares. Marcos dirá que os filhos de Zebedeu abandonaram o pai com os assalariados (Mc 1, 20). De Pedro nada se diz. Parece que ele era o único dono do barco já que o seu nome está unido como proprietário ao barco. Será o próprio Pedro quem mais tarde argumentará: e nós que temos abandonado tudo e te seguimos, que vamos receber? (Mt 19, 27).
PISTAS: 1º) A pesca dos homens para a entrada no Reino segue os grandes traços da pesca milagrosa de hoje. Podemos comparar como trabalhamos inutilmente, confiando em nossos esforços. Mas se confiamos na palavra do Senhor, este será quem definitivamente suscita as pessoas para que elas aceitem a doutrina do evangelho.
2º) Depois de uma pesca milagrosa, Jesus atua favorecendo a ação dos discípulos, aqueles que abandonaram tudo (e aí está a força do êxito). Ao que parece o lago atual (o mundo) não tem peixes, os tempos são os piores, ou as circunstâncias o desaconselham, mas o verdadeiro discípulo só espera a voz do Mestre para começar a trabalhar.
3º) É necessário que toda a Igreja ative sua consciência de missão. Junto com Pedro, também foram chamados outros discípulos. Assistimos a uma venda de igrejas protestantes. A Igreja da Inglaterra, como exemplo, vendeu 1600 templos em menos de quatro décadas. Assistimos a um vazio de jovens nas igrejas católicas da Europa. Mas como afirmava um líder eclesiástico, os resultados não se medem pelos números, mas pela qualidade dos discípulos. O homem põe seu esforço, mas a rede necessária é a palavra, e ela trabalha em silêncio quando os operários dormem.(Mc 4, 26-27).
4º) O anúncio sempre deve ser a vitória de Cristo crucificado e ressuscitado: seu triunfo sobre a morte, sobre o mal (Lc 4, 21), sua escolha pelos irremediavelmente perdidos, sua mensagem de salvação aos pecadores que nele encontram a mais ardorosa das acolhidas. Os resultados nem sempre serão visíveis; mas terão um fim escatológico definitivo de salvação, porque o Pai sempre está à espera do filho pródigo.
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as que mais precisarem!
Graças e louvores
se dê a todo momento:
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"O Senhor é meu pastor, nada me faltará!"
"O bem mais precioso que temos é o dia de hoje! Este é o dia que nos fez o Senhor Deus!
Regozijemo-nos e alegremo-nos nele!".
( Salmos )
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