GOTAS DE REFLEXÃO - EVANGELHO DOMINICAL
13.03.2016
5º Domingo da Quaresma
— ANO C
( ROXO, CREIO, PREFÁCIO PRÓPRIO – I SEMANA DO SALTÉRIO )
__ Igreja misericordiosa __
NOTA ESPECIAL: VEJA NO FINAL DA LITURGIA OS COMENTÁRIOS DO EVANGELHO COM SUGESTÕES PARA A HOMILIA DESTE DOMINGO. VEJA TAMBÉM NAS PÁGINAS "HOMILIAS E SERMÕES" E "ROTEIRO HOMILÉTICO" OUTRAS SUGESTÕES DE HOMILIAS E COMENTÁRIO EXEGÉTICO COM ESTUDOS COMPLETOS DA LITURGIA DESTE DOMINGO.
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs!
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL PULSANDINHO: Neste quinto e último domingo da quaresma, a liturgia da palavra insiste no perdão e na misericórdia, mostrando que devemos perdoar e dar nova chance, nova oportunidade àqueles que cometeram pecado e se arrependeram, porque Deus faz isso conosco todos os dias, e é somente pelo perdão que conseguiremos reverter situações de pecado e de erro. É hora, portanto, de esquecer o passado de pecado e começar vida nova, pois a Páscoa é exatamente isso, vida nova, vida de pessoas renascidas para Deus.
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL O POVO DE DEUS: Preparamo-nos para a Semana Santa, que se inicia com o Domingo de Ramos e da Paixão de Cristo. É a ocasião em que a Igreja no Brasil solicita o gesto concreto das coletas nas Missas para a Campanha da Fraternidade. Venhamos, portanto, preparados para essa colaboração no próximo domingo, fazendo um ato significativo de nossa conversão quaresmal.
INTRODUÇÃO DO WEBMASTER: A celebração deste quinto domingo da Quaresma favorece a compreensão da fé como confiança em novos caminhos propostos por Deus, como acolhimento total e irrestrito de Jesus Cristo e sua Ressurreição, e como abertura de um novo caminho, através do perdão e da solidariedade. O tempo para a conversão está terminando. A fé não se expressa apenas por teorias ou conceitos teológicos, mas também em fatos concretos realizados por Deus. A fé, portanto, faz crer que Deus abre caminhos novos lá onde sequer somos capazes de imaginar alguma saída. Muitas vezes, são caminhos dolorosos, que precisam do tempo da semeadura sem saber se os frutos virão; com o tempo, contudo, se tornam canções que colhem libertação e alegria. Aproximemo-nos com confiança e com fé de nosso Deus, intercedendo uma vez mais a graça da conversão e suplicando uma nova direção para nossas vidas. O quinto domingo da Quaresma nos prepara para a Semana Santa, pois o domingo próximo é o Domingo de Ramos e da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. O "farisaismo" é a doença de quem não se olha no espelho. Todo rosto tem rugas, e por detrás de uma fachada restaurada ocultam-se manchas escuras. Em todos nós existe um sentimento de culpa exacerbado, resultado de um formalismo legalista, de aspectos inconscientes e de educação ilusória. Mas há também um sentimento de culpa que põe o dedo na ferida. As chagas ardem e causam nojo; também aquelas que comprometem toda a sociedade: a prostituição, a delinquencia juvenil, a droga, as mães solteiras. Há as responsabilidades de quem se deixa explorar e há a responsabilidade de quem explora; é uma sociedade sem valores. Também a nós faltam os valores, mas é mais cômodo liberar-se dessa crise de valores procurando bodes expiatórios, e é fácil encontrá-los... A satisfação de lançar a pedra nos faz esquecer de quem somos, nos liberta da responsabilidade e do sentimento de culpa. Assim, fazem-se campanhas contra a prostituição para deixar as ruas limpas; marginalizam-se os drogados, para que não possam censurar a nossa inutilidade; fazem-se casa de correção, para dizermos a nós mesmos que fazemos o possível. Deixamos de ver ou fazer algo por essas pessoas achando que não é nossa responsabilidade e assim nos sentimos limpos, mas o desprezo que tributamos a esses irmãos e irmãs é, para Cristo, acusação contra nós, e o sofrimento deles se torna sofrimento de Cristo. Quaresma é tempo de conversão, que tal começar agora?
Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos alegres cânticos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Isaías 43,16-21): - "o povo, que formei para mim, contará meus feitos."
SALMO RESPONSORIAL 125/126: - "Maravilhas fez conosco o Senhor, exultemos de alegria!"
SEGUNDA LEITURA (Filipenses 3,8-14): - "Não pretendo dizer que já alcancei (esta meta) e que cheguei à perfeição. Não. Mas eu me empenho em conquistá-la, uma vez que também eu fui conquistado por Jesus Cristo."
EVANGELHO (João 8,1-11): - "Quem de vós estiver sem pecado, seja o primeiro a lhe atirar uma pedra."
Homilia do Diácono José da Cruz — 5º Domingo da Quaresma — ANO C
"Perdão... uma nova oportunidade"
A pior coisa para um torcedor durante um campeonato, é quando o time para o qual torcemos está precisando vencer, não para ser campeão, mas sim para fugir do rebaixamento. O torcedor em cada partida nem sonha mais com o título, mas só em não ser rebaixado.
Na nossa vida de Fé, muitas vezes, por causa do desânimo do pecado, nosso e dos outros, paramos de sonhar com o “Céu” e ficamos a vida inteira lutando para não sermos “rebaixados” para o inferno. Será que foi para isso que Deus nos fez? Claro que não! Pois, para quem tem Fé, o “melhor ainda está por vir” e podemos sonhar sim, porque Jesus Cristo, o Filho de Deus acredita em nós, e mais ainda, nos dá condições totais na sua Graça, de alcançarmos a plenitude do Ser, que o Pai criou, á sua imagem e semelhança.
Em nossa sociedade, sempre marcada por uma grande hipocrisia, há certas classes sociais que são condenadas previamente enquanto que outras “castas” podem cometer certos delitos, mesmo no campo moral ou ético, pois gozam de certa imunidade. Mas, os mais frágeis, ou os que com nada podem contar, como é o caso dessa “Mulher Adúltera”, ficam expostos ao ridículo e ao moralismo exacerbado de classes sociais elitizadas, e também, de maneira pecaminosa, por algumas categorias religiosas,que as rotulam de “irrecuperáveis”, por outro lado, o sistema parece investir muito mais na construção de novos presídios do que em um projeto sério de ressocialização da população carcerária, e quando se gasta na construção de presídios, é como se dissesse ao delinquente :: “Pode cometer crime a vontade, que vamos construir mais presídios”.
Os escribas e Fariseus, isso é, a classe dominante e pensante, já havia condenado a mulher pecadora, só queriam aproveitar a ocasião e colocar Jesus contra a parede, para também condená-lo, pois um Mestre verdadeiro, no campo da moral e dos bons costumes, concordaria com a Lei de Moisés, pecou, tinha que pagar, e pagar caro, no caso dos fragilizados, ignorados pela lei, e sem nenhum direito.
Eles não acreditavam que aquela mulher pudesse se regenerar, e nem queriam lhe dar uma nova chance, estavam desejosos de mandá-la para o “paredão” e expulsá-la do convívio dos “salvos” e moralmente perfeitos. Uma comunidade verdadeiramente cristã, nunca irá proceder desta forma. Contrariando esse modo preconceituoso de pensar, Jesus de Nazaré, que é o primogênito de toda a criatura, sendo o homem perfeito, e a perfeita imagem e semelhança de Deus, não condena, porque sabe que aquela mulher tem toda possibilidade de se regenerar.
Não condenar, não significa concordar com o pecado, fechar os olhos para a ação pecaminosa cometida pela pessoa, ao contrário, Jesus acredita e aposta todas as suas fichas no ser humano, que é capaz de sair da “armadilha” do pecado, e dar a volta por cima, resgatando a sua dignidade perdida, pois, a partir da Encarnação do Senhor, nenhum homem será mais condenado, a Salvação por ele oferecida dá essa possibilidade maravilhosa de recomeçar, de levantar-se da queda e seguir em frente, para alcançar o seu destino glorioso que é a Vida Plena na Casa do Pai.
Falta muito, em nossas relações com as pessoas, essa postura de Jesus, que não condena e que sabe perdoar, pois perdão significa uma nova oportunidade, uma nova chance, para a esposa infiel, para o marido que é um traste, para o Filho ou a Filha rebelde, perdido nas drogas, no mundo da marginalidade, para o empregado mau caráter, para o Patrão desonesto, para o corrupto, para a prostituta, há muitos que gritam e imploram por uma nova chance, entretanto, já estão marcados para ser “apedrejados” em praça pública, como aquela mulher. Em nossa sociedade só se investe e se acredita em quem produz em quem é economicamente ativo, em quem tem posses para adquirir bens de consumo, o resto é lixo, e para esse resto não há novas chances ou oportunidades de se reerguer.
Voltando a comparação com o time de Futebol, Jesus Cristo é como aquele técnico paciente, empenhado, e até ousado, que quando todos estão contra, e não acreditam em uma “virada” da equipe, ele trabalha nos treinamentos, procura conhecer as deficiências e o potencial de cada atleta e tem sempre palavras de incentivo “Olha, vamos recomeçar, vocês vão conseguir, eu acredito em vocês, estamos juntos nessa, vamos em frente, vocês tem condições de “virar esse jogo”.
“Mulher, onde estão os que te acusavam?” Ninguém te condenou, nem eu te condeno,. “Vai e não tornes a pecar”. Isso lembra o meu confessor, no retiro que fizemos recentemente, onde, antes da absolvição, disse-me sorrindo, Jesus está lhe dizendo neste momento “Coragem meu amigo, tente de novo, eu estarei contigo, você vai conseguir”. Esse é o nosso Deus, cheio de misericórdia, que ainda aposta todas as suas fichas no Ser humano, porque o ama apaixonadamente.
Não sei se o time de nossa cidade será campeão, certamente é esse o desejo da direção, do seu técnico e da sua torcida. De um modo muito mais intenso, no coração de Deus, manifestado em Jesus, há esse desejo, de que toda a humanidade se salve, para chegar à Vida Plena, Deus acredita em nosso potencial, foi ele que nos deu a sua Graça santificadora e restauradora, só depende de nós... pois diferente das “oportunidades humanas”, sempre tão “manipuladas” a favor de alguém, essa Graça Divina é para todos... Basta querer... ”Vá e não tornes a pecar, mostra a tua força, o teu valor, mostra a capacidade que tens, na minha graça, de virar o jogo da sua vida, e deixar que no seu coração, o Bem supremo triunfe!”
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Costa — 5º Domingo da Quaresma — ANO C
Acusados pela própria consciência
Esta expressão é do Evangelho desse domingo: às palavras de Jesus, os escribas e os fariseus “sentindo-se acusados pela própria consciência” (Jo 8,9) retiraram-se. Está claro que tanto a mulher quanto aqueles zelosos custódios da lei de Moisés sentiam-se acusados, quiçá também se viam acusados todos aqueles que vieram para escutar a Jesus e inclusive o homem que cometeu adultério com aquela mulher. A consciência da mulher adúltera a acusava; talvez, no começo, menos por ter pecado contra Deus que pelo fato de ter sido flagrada. Ao encontrar-se com Jesus, aquela mulher foi mudando de atitude: tendo Jesus diante de si, escrevendo no chão algo desconhecido, numa atitude paciente e acolhedora, a mulher adúltera foi percebendo que estava diante de alguém que a compreendia de verdade, mas não aprovava o seu pecado.
A consciência dos fariseus e escribas também não os deixava em paz, eles também tinham Jesus diante de si, também contavam com a compreensão do Senhor e, no entanto, não se arrependeram. Sentiram-se acusados sem arrependimento. De fato, existem momentos em que podemos sentir-nos acusados sem nenhuma referência a Deus, simplesmente por orgulho e amor próprio. Essa “acusação da consciência” não começa nem termina em Deus.
Aproximemo-nos cada vez mais do “do trono da graça, a fim de alcançar misericórdia e achar graça de um auxílio oportuno” (Hb 4,16), pois faltam poucos dias para que celebremos a Páscoa do Senhor, o acontecimento central da história da humanidade. Nesses dias, estamos procurando receber a graça e a misericórdia no sacramento da confissão. Daí a importância de que nos sintamos acusados no mais íntimo do nosso ser; que a nossa consciência, esse sacrário de Deus donde ele nos fala, se sinta sacudida nesses dias.
Não tenho dúvida que o irmão que tem esse texto diante dos olhos nesse exato momento sabe o que é o exame de consciência. Caso me permita, vamos falar um pouco mais dessa prática cristã tão antiga e tão atual. Ao examinarmo-nos todos os dias, deveríamos pedir ao Senhor que nos ajude a ver as nossas atitudes como ele as vê: os nossos pensamentos, as nossas palavras, os movimentos mais íntimos do nosso coração e todas as nossas ações. Desta maneira, a acusação que a consciência provoca em nós diante duma ação má, começará e terminará em Deus provocando uma espécie de tristeza salutar: “a tristeza segundo Deus produz um arrependimento salutar de que ninguém se arrepende, enquanto a tristeza do mundo produz a morte” (2 Cor 7,10).
O exame de consciência, especialmente para os que começam a fazer essa prática piedosa, poderia reduzir-se a três perguntas. A primeira: o que eu fiz de bom no dia de hoje? Essa pergunta ajuda não só a dar glória a Deus por todo o bem que ele nos fez, mas também a ser otimistas e não ficar pensando que tudo vai mal. Não é falta de humildade reconhecer os nossos talentos e dons se esse reconhecimento vai acompanhado de ação de graças: obrigado, Senhor! Segunda pergunta: o que eu fiz de mal? Neste momento veremos, com calma e dor de amor, que ofendemos o nosso Deus que é amor, que somos ingratos, que pecamos: perdão, Senhor! A terceira pergunta inclui o desejo de alcançar algumas metas na vida espiritual: o que eu posso fazer melhor? Muitas coisas, mas é preciso especificar: amanhã não xingarei, terei mais paciência com o meu patrão, não ficarei olhando as mulheres que passam pela rua, não darei “patadas” nos outros etc. Peça: ajuda-me, Senhor! Termine com um ato de contrição: “Senhor Jesus, Filho de Deus, tende piedade de mim, que sou um pecador.” Amanhã, será um dia melhor. Ah, se você percebeu que precisa se confessar, não perca tempo: peça o Sacramento da Confissão, ainda hoje se possível.
“Acaba sempre o teu exame com um ato de Amor – dor de Amor –: por ti, por todos os pecados dos homens… – e considera o cuidado paternal de Deus, que afastou de ti os obstáculos para que não tropeçasses” (S. Josemaría Escrivá, Caminho, 246). Para aqueles que já são acostumados a fazer o exame de consciência, eu diria que é importante formular algumas perguntas que tenham a ver com o estado atual da própria alma e aprofundar mais na contrição, no arrependimento.
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Comentário Exegético — 5º Domingo da Quaresma — ANO C
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
EPÍSTOLA AOS FILIPENSES 3, 8-14
INTRODUÇÃO: Paulo descreve a nova vida do cristão em dois aspectos fundamentais: 1) Um conhecimento novo de Cristo, que é pessoal e íntimo, de modo a ver todo o resto como lixo, especialmente sua vida anterior, determinada pela Lei Mosaica. 2) A cooperação que deve existir entre o cristão e a vida de Cristo, como paradigma esta última, do caminho que nos toca viver e andar na terra até o prêmio final: Cristo é padecer antes de triunfar.
VERDADEIRAS PERDAS: Porém, certamente, também, estimo tudo ser perda por causa da superioridade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; por quem todas as coisas são perda e estimo serem imundícies a fim de ganhar Cristo (8). Verumtamen existimo omnia detrimentum esse propter eminentem scientiam Iesu Christi Domini mei propter quem omnia detrimentum feci et arbitror ut stercora ut Christum lucri faciam. Paulo está falando de que a Lei, a circuncisão, a tribo, a justiça e o cumprimento das tradições de tudo isso derivadas, nada valem para ele desde que encontrou Cristo e o conheceu como seu Senhor e Salvador. No lugar de considerar isso como valor, considera-o como PERDA [Zëmia<2209>=detrimentum], um trabalho não só inútil, mas de lucro negativo: o oposto a ganho. E a causa dessa nova estima é a SUPERIORIDADE [uperechon<5242>=eminens]; na realidade é o verbo Uperechö em forma de particípio do presente, que o latim traduz com propriedade como eminente. CONHECIMENTO: [Gnösis <1108>=scientia] é um profundo saber da pessoa e da vida de Cristo, o Ungido [Messias] que para Paulo era seu Senhor, seu Kyrios, substituindo o Deus Jahveh do AT. Conhecimento que é muito mais do que simples saber intelectual, e se transforma na íntima amizade e vida em e por Cristo. Paulo explica sua consideração de perda, como sendo o mais desprezível para um homem e especialmente para um judeu, tão estritamente observante da pureza legal. Tudo o que era seu orgulho anterior, agora é como IMUNDÍCIES [skybala<4657>=stercora] os dejetos ou excrementos, estrume como diz a Vulgata, ou seja, o mais desprezível que um ser humano possa desejar. Tudo o que Paulo desejava e do qual ele se ensoberbecia agora deve desprezá-lo a fim de GANHAR [kerdainö <2770>=lucri facere] CRISTO. Éganhar sua amizade, é ser seu discípulo tendo a vida pautada por seus ensinamentos e dirigida por seu espírito, de modo que para ele viver é Cristo (Gl 2, 20).
VERDADEIRA JUSTIÇA: E ser achado nEle, não tendo minha justiça, a da parte da Lei; mas a mediante a fé em Cristo, a da parte de Deus, justiça (fundada) sobre a fé (9). Et inveniar in illo non habens meam iustitiam quae ex lege est sed illam quae ex fide est Christi quae ex Deo est iustitia in fide. Paulo explica agora a diferença que existe entre a JUSTIÇA [dikaiosynë<1343>=iustitia] que provém da Torah ou Lei [Nomos <3551>=lex]. Justiça, no sentido bíblico, é o estado de inocência ou falta de pecado, diante de Deus. Paulo afirma que se a Torah é cumprida estritamente, de modo a não haver transgressões, essa justiça pode ser adquirida teoricamente; mas, na realidade, como essas transgressões existem, todos pecam (Rm 3, 9) é impossível agradar a Deus, seguindo a antiga Lei. Pois todo homem julgado por esta, sempre encontrará o pecado em si e não a justiça. A Lei se transformou num guia para descobrir o pecado (Rm 7, 7) ou um aio [pedagogo] para nos conduzir a Cristo (Gl 2, 24). Paulo encontrou em si mesmo essa lei do pecado que o transformou em injusto diante de Deus (Rm 7, 21 e 8, 2). E encontrou na FÉ [Pistis <4102>=fides] em Cristo, que ele diz é um presente ou dádiva de Deus, a nova justiça que não depende das obras humanas ou da prática da Lei [especialmente da circuncisão], mas da fé. Não entramos a definir essa fé que tem como base a ressurreição de Cristo que o transforma em Senhor de nossas vidas e que se expressa inicialmente no batismo, que nos submerge no espírito de Deus, para nascer uma vida nova, conforme com a vontade do Pai.
A FÉ: Para conhecê-lo e a força de sua ressurreição e a participação dos seus padecimentos sendo conforme com sua morte (10). Ad agnoscendum illum et virtutem resurrectionis eius et societatem passionum illius configuratus morti eius. Paulo dá aqui uma definição da fé cristã, a começar pelo CONHECIMENTO [Gnönai<1097>=agnoscendum] dEle. Impossível atuar às cegas. Devemos antes conhecer o fim e os meios; e o fim é Cristo Ressuscitado. Essa fé tem sua base na FORÇA [Dynamis<1411>=virtus] de sua ressurreição. Sobre esta matéria, Paulo admite a divindade de Jesus (1 Cor 15, 4) assim como a verdade da mesma em todos os crentes (1 Cor 15, 12) e de modo especial proclama a ressurreição corporal de todos os que em Cristo morrem (1Cor 15, 21) e nisso consiste a força de sua ressurreição (Ef 2, 6). Porém a fé não é só dádiva e mercê de Deus; é sinergia e PARTICIPAÇÃO [koinönia<2842>=societas] do homem nessa vida exemplar de Cristo: Quem quiser ser meu discípulo tome sua cruz e me siga (Mt 10, 38) -dirá o Mestre. E Paulo ainda acrescenta mais uma razão: preencher o que resta dos sofrimentos de Cristo na sua carne (Gl 1,24). Mais ainda: devemos ser CONFORMES [symmorfoumenos<4843>= configuratus] com a morte de Jesus, como ele diz que foi crucificado com Ele o nosso velho homem, para que o corpo do pecado seja destruído e não sirvamos ao pecado como escravos (Rm 6, 6).
Se, pois, o alcançar, (será) para ressurreição dentre os mortos (11). Si quo modo occurram ad resurrectionem quae est ex mortuis. Como diz em outra ocasião, quem está firme veja que não caia (1Cor 10,12). Paulo sabe de sua debilidade e por isso declara SE o ALCANÇAR [katantëö <2658>= occurram]. A ressurreição, dirá na continuação, é um prêmio que, na diferença dos que correm no estádio, não é para um só mas para todos os que correm (1 Cor 9, 24). É lógico que essa ressurreição é também corporal e para o bem da pessoa como foi em Cristo.
AINDA NÃO: Não que já alcancei ou já está terminado; mas persigo, se o alcanço naquele que sou alcançado por Cristo Jesus (12). Non quod iam acceperim aut iam perfectus sim sequor autem si conprehendam in quo et conprehensus sum a Christo Iesu. Paulo fala da ressurreição como de um prêmio que está por terminar, mas para o qual é necessária a intervenção de Cristo. Paulo nunca olvida que ele foi alcançado ou conquistado diríamos hoje por Cristo no caminho de Damasco. E nesse Cristo que o amou primeiro e por ele se entregou (Gl 2, 20), encontrou a razão de sua vida e o motivo de seu trabalho evangelizador; entrega que ele imitou em sua vida e da qual este versículo é testemunha. Realmente, o Senhor o alcançou como se prende um pássaro no alçapão. Prisioneiro de Cristo ele se declara e imitador de seu Senhor em padecimentos e morte.
FINAL: Eu corro para o alvo, prossigo para o prêmio da vocação do alto da parte de Deus em Cristo Jesus (14). Paulo abandonou tudo por Cristo e nele é que espera do alto o prêmio definitivo, dado aos que correm, chamados por Deus como ministros do evangelho.
Evangelho (Jo 8, 1-11)
A ADÚLTERA
O ADULTÉRIO NO AT: A mulher era considerada uma propriedade do marido, a mais íntima e peculiar. Por isso o adultério (Naapup em hebraico e Moicheia em grego) mais do que um pecado de luxúria era um pecado contra a propriedade. Considerava-se adultério a comunicação sexual com a esposa ou prometida de outro homem. Não é o mesmo que Zaná referida a relações heterossexuais ilícitas, também como o substantivo Nakriyá que em Provérbios 5, 20 significa a relação com uma prostituta. O sétimo Mandamento: Não adulterarás; exige pureza sexual (Êx 20, 14) e apresenta o adultério como um crime repugnante contra Deus em Jó 31, 11: ¨Que minha mulher moa a farinha para outros e que se encurvem outros sobre ela é um crime hediondo, delito submetido à punição dos juízes¨.É a ruptura de um contrato feito diante de Deus que constitui uma desonra a Deus, pois coloca a vontade do homem acima da de Deus pois os dois se tornam uma só carne (Gn 2, 24). Em Pr 2, 17 o casamento é uma aliança perante Deus e o adultério é o pior tipo de roubo, pois é o roubo da própria carne, semelhante ao homem que se levanta contra o seu próximo e lhe tira a vida (Dt 22, 26) O adultério torna o adúltero um jumento selvagem (Jr 5, 8). Por isso era passível de morte: Se um homem adulterar com a mulher do seu próximo, serão mortos o adúltero e a adúltera (Lv 20, 10). O método de aplicar a pena capital era queimar a pessoa (Gn 38, 24) como Judá queria fazer com sua nora Tamar. Mas depois, a exemplo de Lv 19, 20, o apedrejamento foi o método escolhido, imitando Dt 22, 23 em que no caso de uma virgem desposada e dentro da cidade, o adultério seria punido com o apedrejamento às portas da mesma cidade, eliminando assim o mal de Israel. O adultério é simbolicamente figura da idolatria (Ez 16, 32).
APEDREJAMENTO: 1o Na TORÁ: O apedrejamento era sinal de desprezo e gesto de hostilidade, como 2 Sm 16, 6 em que Semei fica atirando pedras em Davi. Apedrejamento em hebraico é Sakal ou Ragam. Em grego Lithoboleo (= jogar pedras).O rei Acab fez com que Nabot fosse apedrejado até a morte para ficar com sua vinha, dando como motivo a blasfêmia conta Deus e o rei (1 Rs 21, 10). Segundo a Lei, o boi que matasse alguém devia ser apedrejado até a morte (Êx 21, 28). Moisés determina o apedrejamento de quem adorasse outros deuses (Dt 13, 10). O sacrifício dos filhos a Molok era também penado com o apedrejamento (Lv 20,2). A imoralidade física de uma jovem, tendo relações na casa do pai antes do matrimônio, também era condenada da mesma maneira à morte (Dt 22, 21). Em Josué 7, 25 Acã e sua família foram apedrejados por se apropriarem daquilo que estava sob o interdito divino. O apedrejamento era responsabilidade da comunidade no seu todo e se dava sempre fora da cidade, como no caso do blasfemo (1 Rs 21, 10). Um filho desobediente e incorrigível devia ser castigado da mesma forma pela comunidade (Dt 21, 18-21). Era para evitar o mal dentro da comunidade e impedir que a mesma fosse castigada por um mal que se considerava gravíssimo por causa da contaminação possível a todo o povo. Era como uma peste que nos tempos modernos se evita com a morte dos afetados. As testemunhas deviam impor as mãos sobre a vítima (Lv 24, 14) e atirar a primeira pedra (Dt 17, 5-7). No código de Hamurabi temos também os mesmos tipos de delitos condenados com a pena máxima. Só que na Mesopotâmia, como no Egito, a falta de pedras, abundante na Palestina, obrigava a outras maneiras de morte, como a fogueira em que o povo podia participar. Parece que nos tempos de Jesus a lapidação era o castigo imposto segundo Ez 16, 37-40. 2o A MISHNÁ: Admitida a pena de morte pelo adultério, e o homossexualismo (yebamot 8,6), a tradição distingue 4 diferentes penas de morte, apedrejamento, fogueira, estrangulamento e decapitação, e escolhe o apedrejamento para os adúlteros; pena que, segundo alguns doutores, era pior que a morte por fogo. A tradição afirmará que após o apedrejamento, o réu será pendurado; porém o cadáver não poderá ficar no madeiro durante a noite.
JESUS MESTRE: O título era o de Rabi (mestre meu) ou em aramaico Rabôni, tal e como Maria de Magdala o chamou (Jo 20, 16). Será o Didáskalos grego ou Epistates segundo Lucas, tendo nesta última acepção o significado de Máster inglês. Ou seja, homem com autoridade intelectual e ao mesmo tempo moral de direção. Nós o vemos no evangelho de hoje como um verdadeiro mestre, sentado entre as colunas do pórtico de Salomão no lado oriental do templo. Na última semana de sua vida, já desde o início do dia, Jesus ensinava no templo (Lc 21, 37), tendo como ouvintes principais seus discípulos. E nessas circunstâncias, foi abordado pelos escribas e fariseus que lhe apresentaram uma mulher apanhada no ato do adultério.
A ARMADILHA: A pergunta tinha uma resposta clara segundo a Torá e a tradição ou Mishná. Porém existiam umas conclusões que podiam colocar em situação crítica aquele que respondesse legalmente à pergunta solicitada. Caso Jesus desse uma resposta afirmativa, ele seria condenado pela autoridade romana como executor de uma sentença de morte, à qual não tinha direito; e, portanto seria punido como um assassino. Caso sua resposta fosse negativa, Jesus seria condenado como quem despreza a lei pátria e seu desprestígio seria máximo entre os judeus ortodoxos, com uma reputação totalmente negativa que o aniquilava como mestre em Israel.
1ª RESPOSTA: Jesus nada responde e se inclina para escrever no chão como quem desenha letras sem sentido, na terra. Ele se desentende de um problema que não é seu e que não tem por que responder, pois ele não tinha testemunhado o adultério e não era juiz no caso, que, como caso de morte, seria o sinédrio quem o julgaria. Eram as testemunhas que deveriam atuar através da denúncia ao juiz e atirando as primeiras pedras, para que o povo respondesse e assim evitar o mal que do contrário, contaminaria todo o povo (Dt 22, 22). É costume entre os árabes fazer traços com o dedo quando o que estão escutando não é de seu interesse. É possível que Jesus atuasse em consonância com esta última suposição. Por isso os acusadores insistem. Uma outra suposição é que ele escreveu os pecados dos acusadores, ou a maldição de Nm 5, 21 correspondente às águas amargas do juízo de ordálio da mulher suspeita; mas parece improvável porque o resultado do caso é a absolvição por ausência de testemunhas.
2ª RESPOSTA: Para entendê-la, devemos buscar precedentes na tradição e na Lei. Segundo o que temos visto em parágrafos anteriores, as testemunhas eram as primeiras pessoas a atirar as pedras que deviam ser dirigidas ao coração da vítima para acabar de imediato com sua vida. Quem estiver sem pecado entre vós atire a primeira pedra. Segundo a Mishná os homens adúlteros eram na época tantos que se deixou de aplicar a lei das águas amargas. Esta prescrição consistia em misturar cinza com água e dar de beber a mistura à mulher que o marido considerava ciumentamente adúltera, mas que não tinha testemunhas apropriadas, ou uma só testemunha, ou sua palavra única. Antes de dar a bebida o sacerdote escrevia uma maldição que devia ser apagada na água amarga, segundo lemos em Nm 5, 20ss. Caso a mulher fosse culpada a mistura devia produzir inchaço do ventre e esterilidade, definhando seu peito. A resposta de Jesus deixa em primeiro lugar como responsáveis as testemunhas. Ele se ausenta do julgamento e o deixa nas mãos dos acusadores que agora se tornam acusados. Por isso continua escrevendo e desentendendo-se do caso.
A RETIRADA: Tinham toda a conformidade do Mestre, mas existia uma condição que aparentemente não se cumpriu: O sem pecado entre vós, seja o primeiro a lhe atirar a pedra. Ninguém esperava esta resposta que respeita a lei e não é um mandato, mas um aviso e uma lição. De fato não podemos condenar se somos culpados do mesmo delito. A Jesus lhe atacam com a lei e ele contra-ataca com a consciência, que é a lei suprema para todo homem em particular. Que aconteceu dentro da consciência dos acusadores? Por que começaram a desfilar, a começar pelos mais velhos? Alguns manuscritos, querendo explicar a fuga acrescentam ¨convictos por sua consciência¨. Sêneca dizia da mesma que é o juiz mais rigoroso que podemos encontrar. Os mais velhos foram os primeiros. Efetivamente os jovens são como discos novos em que o pecado inicia seu caminho de vício e rasura com a ação repetitiva a consciência do indivíduo. Os mais velhos não são mais pecadores, mas os que acumulam maior número de pecados. Por outra parte, uma testemunha, para ser verdadeira, devia (segundo a lei) ter uma conduta ilibada, uma palavra acreditada, fora de toda falácia. Não eram as razões e as palavras, mas o peso da pessoa o que dava à testemunha valor e crédito. E uma vez retirados os mais velhos, os jovens nada tinham que fazer. Os mais velhos entenderam por experiência que agora eram eles, as testemunhas, as que passavam de declarantes a juízes e o processo e a condenação estava transferido de Jesus a eles mesmos. Jesus não poderia ser incriminado nem pela relaxação da lei de Moisés, nem pela execução de uma pessoa que a lei romana não permitia na época. Toda a montagem urdida contra Jesus acabava de ruir com a mudança de responsabilidade que de Jesus passará agora às testemunhas acusadoras. Nada havia, pois, a fazer. E numa sociedade em que os presbíteros tinham a voz cantante, os mais novos se encontram sem suporte suficiente para atuar. A morte da adúltera não era o motivo principal da denúncia, pois o que pretendiam era a implicação de Jesus na morte da mesma. Faltando este último, o teatro urdido desmoronava como um castelo de cartas.
O PERDÃO: Como diz S Agostinho, ficaram a sós a miséria e a misericórdia. Se ninguém a condenava Jesus tampouco a condena. A lei divina foi transformada por esta sentença, sempre que o arrependimento seja sincero e o acompanhe o propósito de não pecar mais, o perdão será absoluto. O passado é apagado e o futuro só depende do presente e das disposições do momento. A memória servirá para enaltecer a bondade de Deus que perdoa, sem exigir compensações e reditos pelo passado.
PISTAS:
1) A sabedoria de Jesus dá um xeque-mate a quem pensava tê-lo enredado em suas redes mortais. E é precisamente por meio de uma consciência, que aparentemente estava inoperante, que os mais velhos reconhecem seu erro e retiram sua denúncia. Como está nossa consciência quando censuramos o próximo pelos mesmos delitos que nós usualmente cometemos?
2) Muitos problemas teriam solução, caso fossem nossos e não pretendêssemos resolver os do próximo. Porque neste os contemplamos para criticá-los e não para ajudá-los.
3) O perdão divino é mais amplo do que nós geralmente acreditamos. Só exige que tenhamos a vontade de não optar mais pelo mal.
4) O pecado dos outros é sempre patente aos nossos olhos e rapidamente formamos um juízo de condenação. O nosso é invisível e dificilmente vemos o mal que causamos.
5)Nem sempre a idade é critério de bondade. Geralmente o bem é uma conquista de uma luta diária e constante. Quando um homem honrado envelhece, ele se torna um ancião; quando um canalha envelhece, ele é apenas um velhaco que já viveu muito (Walther Waeny).
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
06.03.2016
4º Domingo da Quaresma
— ANO C
( ROXO OU RÓSEO, CREIO – IV SEMANA DO SALTÉRIO )
__ Um abraço de misericórdia __
NOTA ESPECIAL: VEJA NO FINAL DA LITURGIA OS COMENTÁRIOS DO EVANGELHO COM SUGESTÕES PARA A HOMILIA DESTE DOMINGO. VEJA TAMBÉM NAS PÁGINAS "HOMILIAS E SERMÕES" E "ROTEIRO HOMILÉTICO" OUTRAS SUGESTÕES DE HOMILIAS E COMENTÁRIO EXEGÉTICO COM ESTUDOS COMPLETOS DA LITURGIA DESTE DOMINGO.
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs!
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL PULSANDINHO: O quarto domingo da Quaresma é conhecido também como domingo da alegria porque nesse domingo vislumbramos a Páscoa do Senhor na liturgia da palavra, através do tema da reconciliação. Comparamos a Quaresma, à travessia de um deserto, que lembra os quarenta anos que o povo hebreu levou para atravessar o deserto e chegar à terra prometida. Nesse sentido simbólico, esse domingo é como se nós chegássemos a um oásis, pois a liturgia trata de temas pascais. Por essa razão, hoje a liturgia sugere uma cor rosada em substituição ao roxo, lembrando essa alegria da Páscoa do Senhor, que se aproxima, cujos sinais estão muito presentes nas leituras de hoje.
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL O POVO DE DEUS: Neste “Domingo da alegria”, somos convidados a acolher a misericórdia divina e a desenvolver a capacidade de perdoar. Deus é o Pai que acolhe com festa o filho ingrato que esbanjou os bens irresponsavelmente, mas voltou arrependido. Iluminados por esta lição, devemos construir a cultura do perdão, que põe em relevo o arrependimento e cura do ressentimento.
INTRODUÇÃO DO WEBMASTER: O 4º Domingo da Quaresma é chamado domingo da alegria, em vista da proximidade da Páscoa. Nesse sentido, a liturgia de hoje convida-nos à alegria e a nos saciar com a bondade com que Deus nos acolhe em sua mesa. O convite do Pai é um elemento iluminador no Evangelho do Filho Pródigo, que ouviremos hoje. Temos um Deus que é Pai bondoso e, em sua bondade, vive nos convidando para participar de sua mesa. Não façamos como o filho mais velho da parábola, mas nos aproximemos da mesa, aceitando com alegria o convite do Pai. Somos convidados por Jesus a acolher a misericórdia divina como um caminho profundamente marcado pela desafio do perdão. Deus é como o pai que acolhe com festa o filho ingrato que esbanjou os bens irresponsavelmente, mas voltou arrependido. Iluminados por esta lição, devemos construir a cultura do perdão, que põe em relevo o arrependimento e minimiza o ressentimento. Isso criará um clima propício ao rejuvenescimento da comunidade de fé, que busca junto com os jovens um caminho mais fraterno e solidário no mundo. À luz da fé, o pecado do homem surge sobretudo como uma recusa de amor, um afastamento da corrente do amor que Deus é a fonte. Mas Deus se manifesta infinitamente maior do que a recusa que lhe opomos; vai ao encontro do homem mesmo em seu pecado; perdoando, vence o ódio e dá início à história da misericórdia.
Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos alegres cânticos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Josué 5,9-12): - "Hoje tirei de cima de vós o opróbrio do Egito. E deu-se àquele lugar o nome de Gálgala, nome que subsiste ainda."
SALMO RESPONSORIAL 33/34: - "Provai e vede quão suave é o Senhor!"
SEGUNDA LEITURA (2 Coríntios 5,17-21): - "Todo aquele que está em Cristo é uma nova criatura. Passou o que era velho; eis que tudo se fez novo!"
EVANGELHO (Lucas 15,1-3.11-32): - "Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. 32 Convinha, porém, fazermos festa, pois este teu irmão estava morto, e reviveu; tinha se perdido, e foi achado." ATENÇÃO: Esta leitura é muito extensa e caso não consiga ler na tela, por favor, pegue a Bíblia para a leitura, ou então acesse a Bíblia online pelo link abaixo.
Homilia do Diácono José da Cruz — 4º Domingo da Quaresma — ANO C
"Bate-Papo Interessante..."
Esta parábola traz a reflexão praticamente pronta: O Filho mais novo se arrependeu e voltou a casa do Pai que o perdoou. Será? Deixemos que o Filho sem juízo nos conte nesta breve entrevista.
____Por que você voltou para a casa do Pai?
Filho Pródigo ___ Vou ser sincero, a fome apertou meu amigo, quando eu pensei que escravos e empregados na casa do meu pai, tinham pão a vontade, decidi voltar.
___Opa ! Espere um pouco, e aquele arrependimento todo que você manifestou nesse evangelho?
Filho Pródigo___Apenas um discurso para convencer o Pai de que eu estava arrependido, palavras bonitas e bem colocadas que iriam tocar no coração do meu “Velho”
___Mais uma coisinha Filho Pródigo, o que te levou a sair de casa, se lá você tinha tudo que precisava?
Filho Pródigo___Na Casa do Pai tinha a impressão de que não era livre, eu queria aproveitar a vida, fazer tudo o que meu coração desejava gozar e desfrutar de todos os prazeres e alegrias que o mundão nos oferece. Enfim, como vocês dizem por aí “Cair na gandaia” de cabeça e ser livre...
___Deixa ver se eu entendi, as vezes nós cristãos achamos que os maus, os que não conhecem a Deus e a sua verdade, são mais felizes porque fazem muitas coisas, sem se importar com a ética, moral, doutrina da Fé e tudo mais. É a liberdade que o adolescente quer, sem a ingerência dos pais em sua vida....
Filho Pródigo ____Isso mesmo, eles tem com os pais não uma relação de amor, mas de compromisso e obrigatoriedade em fazer o que eles mandam, parecem mais empregados do que Filhos.
____E o que mudou na sua vida após a volta a casa paterna?
Filho Pródigo____Bom, confesso que não fazia ideia de quanto meu Pai me amava, imagine você que todos os dias ele ficava á minha espera. O jeito que ele me abraçou, me pos aquele manto, me deu a sandália e o cajado, tudo isso sem exigir que eu tomasse um banho, ele cobriu a minha sujeira e imundície com aquela veste. E fez uma festa inesquecível. Nesse retorno descobri algo inédito, o amor do Pai, imenso, grandioso, gratuito e incondicional. Juro que eu não sabia....
___Então nessa parábola, o foco é o Pai Infinitamente Bom e Misericordioso?
Filho Pródigo ___Pois é, Se o Pai não me desse a liberdade de pecar, indo embora da sua casa, jamais eu saberia o quanto ele me ama. Eu sou cada um de vocês aí na Igreja de 2013, a gente vai e vem, e o Pai ali, de braços sempre abertos, nos acolhendo com imensa alegria, porque nos ama de maneira apaixonada...
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Costa — 4º Domingo da Quaresma — ANO C
Alegria da misericórdia
Ao ler mais uma vez a parábola do filho pródigo, eu pensava que é verdadeiramente justa a ira de Deus para com os pecadores e que é mais fácil entender a justiça que a misericórdia. Que o leitor não se escandalize com este padre! Vou tentar me explicar. Você assistiu ao filme “Sequestro do metrô 123”? É um filme de ação dirigido por Tony Scott: quatro homens sequestram um metrô e um deles à cabeça vai negociando com as autoridades uma quantidade de dinheiro bastante considerável para não continuar matando os reféns. O sequestrador principal, que parece um autêntico psicopata e sem dúvida um desequilibrado mental, ao negociar por telefone encontra num dos controladores do metrô uma pessoa simpática com quem conversar. Neste diálogo há um momento em que o sequestrador de alguma maneira acaba professando-se católico. Nesse interessante diálogo, o controlador, do outro lado da linha, lhe diz que um católico não pode matar, muito menos a pessoas inocentes como aquelas que estavam no metrô, seus reféns. O sequestrador lhe diz uma frase rotunda, mas verdadeira: “o que o católico sabe é que ninguém é inocente”.
Excetuando Jesus e Nossa Senhora, ninguém é inocente! Por outro lado, é lógico: ao culpado se aplica uma pena! Isso não é muito difícil de entender. Outro exemplo: já pensou se um dia, num determinado momento, os órgãos da justiça e os policiais, num arrebato de misericórdia, resolvessem soltar todos os presos, muito deles ladrões e assassinos? Tenho certeza que a outra parte da sociedade se levantaria indignada entre protestos e diria que a justiça ficou louca. Produzir-se-ia um medo geral e nem quereríamos sair às ruas. Ficaríamos com a sensação de que a qualquer momento alguém poderia roubar-nos ou matar-nos. Não é muito mais fácil compreender que os presos fiquem na cadeia pagando o que devem? Efetivamente, a justiça é mais compreensível que a misericórdia!
O capítulo quinze do Evangelho segundo São Lucas contêm três parábolas chamadas “da misericórdia”: a ovelha perdida, a moeda perdida e o filho perdido. Tudo perdido! Mas, se invertemos o quadro temos o bom pastor que busca a ovelha, a boa mulher que busca a sua moeda e o bom pai que espera e ama o seu filho pródigo. Tanto o pastor quanto a mulher têm umas atitudes que não são nada comuns, o mesmo diga-se do pai do filho pródigo. Nem naqueles tempos nem hoje em dia se atuaria dessa maneira! Pense comigo: se você fosse um pastor e tivesse cem ovelhas, delas perdesse somente uma, será que deixaria as noventa nove sozinhas, com perigo de perderem-se, para procurar somente aquela desgarrada? Será que é lógico deixar noventa e nove ovelhas sozinhas e procurar somente uma? Eu pelo menos deixaria a pobre ovelha pra lá, não correria o risco de perder noventa e nove ovelhinhas por causa de uma ovelha boba. E se você tivesse dez moedas e perdesse uma, faria como aquela mulher da parábola: acenderia a luz, varreria a casa colocando-a quase de cabeça para baixo para encontrar a única moedinha perdida? Como se não bastasse: convidaria os amigos para dar uma notícia tão efêmera como essa do encontro de uma mísera moeda? Eu pelo menos não atuaria assim!
Por último, no texto do Evangelho de hoje aparece um filho que pede a parte da herança, gasta com prostitutas e depois se apresenta ao seu pai como culpado. O pai, ao encontrá-lo, o festeja, o presenteia e faz uma festa para ele… Esse pai está louco! No fundo, dá vontade de ver esse filho malandro levar uma boa surra do pai. Não sei se você estará de acordo comigo, querido leitor, mas não é difícil entender que um bom pai corrija com fortaleza um erro cometido por um filho seu. Realmente, é mais compreensível que uma só ovelha se perca que correr o risco de perder as noventa e nove; é mais lógico deixar uma moeda pra lá que revirar a casa por uma só moedinha e depois – e isso é o cúmulo – convidar os amigos, fazer uma festa e gastar mais do que vale a moeda encontrada; é mais fácil entender que o pai desse uma bronca naquele filho sem-vergonha. Enfim, é mais fácil compreender a justiça que a misericórdia!
No entanto, a lógica do Evangelho é outra! Sem contrapor a justiça à misericórdia, a parábola nos apresenta um pai que não é o comum dos pais desta terra, mas o pai só pode ser Deus. Alguma vez escutei e disse aquela frase de que “Deus perdoa tudo, o homem perdoa muitas vezes e a natureza não perdoa nunca”. Hoje eu gostaria de defender a primeira parte: Deus perdoa tudo! Isso sim é motivo de grande alegria! Ele é o nosso Pai, cheio de amor para conosco. Nós, culpados e pecadores, cheios de boas intenções e, também, cheios de intenções torcidas e más ações, somos os queridos de Deus. Já está justificada a nossa alegria para todo o dia de hoje: Deus é Pai! Eu sou seu filho! Deus é muito bom e os sacerdotes no Sacramento da Penitência têm o Coração de Deus e, por isso, compreendem sempre. Não tenha medo e vá se confessar!
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Comentário Exegético — 4º Domingo da Quaresma — ANO C
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
EPÍSTOLA
(2 Cor 5, 17-21)
NOVA CRIATURA: Demodo que se alguém em Cristo (é) nova criatura, as antigas coisas passaram: eis que nasceram todas novas (17). Si qua ergo in Christo nova creatura vetera transierunt ecce facta sunt nova.É um texto que deve ser lido após os versículos anteriores: Cristo morreu por todos a fim de que os vivos não vivam para si mesmos, mas para aquele que morreu e ressuscitou por eles (15). Como lógica consequência, somos uma nova criatura. E conhecemos Cristo, não de modo humano, mas através do Espírito que temos recebido do Senhor, como penhor (5). Paulo fala, pois de uma nova ordem de criação em que Cristo é tudo em todos (Cl 3, 11), já que todo cristão é em Cristo nova criatura (17). CRIATURA: Apalavra grega KTISIS [2937>=creatura] significa primeiramente o ato de fundar ou edificar; no caso, criação (Mc 10, 6). Daí o ato de criar. Substitui Ktismas<2938> que é o produto desse ato de fundar ou iniciar, ou seja, criatura (Mc 19,15). A mesma coisa acontece nas epístolas paulinas: Como criação, temos Rm 1, 20: desde a criação do mundo. Como criatura, Rm 1, 25: adoraram e serviram à criatura em lugar do Criador. No versículo atual, falta o verbo ser, próprio de um semitismo, e como o sujeito é tis [<5100>=qua] ou alguém, um indivíduo, teremos que o significado de Ktisis deve ser criatura, como, vemos em Rm 8, 39: nem a altura nem a profundidade nem outra criatura[=tis ktisis etera]. É o homem novo criado segundo Deus, na justiça e na santidade que vêm da verdade (Ef 4, 24). PASSARAM: O sentido do verbo Parerchomai [<3928>=transire] significa passar ao longo (Mt 20, 30) e, em sentido figurado, esquecer, suprimir, ignorar, não tomar conhecimento, omitir, deixar de existir. É neste sentido, que para Paulo as velhas coisas, ou seja, o AT deixa de existir diante da presença de Cristo. Também o Senhor diz: Todo doutor no reino dos céus é semelhante a um pai de famílias que tira de seu tesouro coisas novas e velhas(Mt 13, 52). Para Paulo, as coisas velhas são as que vêm como tradição de Moisés, especialmente a Torah com seu mandato de circuncisão. NOVAS TODAS: Parece que é a mesma linguagem que emprega o Apocalipse em 21, 5: Eis que faço novas todas as coisas. Com o rolar da História, tudo envelhece, como sucede com a biologia humana, e só podemos iniciar para renovar. No versículo posterior explicará Paulo como Deus renovou a velha religião mosaica.
Pois todas da parte de Deus (vêm), que nos reconciliou consigo por meio de Jesus Cristo e nos deu o ministério da reconciliação(18). Omnia autem ex Deo qui reconciliavit nos sibi per Christum et dedit nobis ministerium reconciliationis. PARTE DE DEUS: Deus é o principal autor dessa renovação que essencialmente, como temos visto em Ef 4, 24, provêm da fidelidade [aletheia= veritas] divina que nos reforma por meio da justiça [dikaiosynë=justiça] e santidade [osietës=sanctitas]. Esse trabalho é feito através da RECONCILIAÇÃO [katallagës<2643>=reconciliatio]. O significado de Katallagës é câmbio (de moedas); o exchange dos ingleses. Também é um reajustamento de contas. No sentido cristão, Deus deixou de lado sua ira contra os pecadores e efetuou um perdão de todas as dívidas [pecados], efetuado de uma vez por Cristo em sua cruz (Rm 5, 10). A palavra sai 4 vezes no NT e unicamente em Paulo. Além das duas vezes nesta perícope, temos Rm 5, 11: Por meio dele [Cristo] temos recebido a reconciliação e Rm 11, 15: O afastamento deles [dos judeus] foi a reconciliação do mundo. Do estado de inimizade [exthra], pois anulando em seu próprio corpo a Lei, seus mandatos e decretos, Ele formou uma nova humanidade, estabelecendo a paz (Ef 2, 15). Quer dizer, que por meio do sacrifício do seu corpo, Cristo estabeleceu uma nova religião [ligação] com Deus em que não eram necessárias a Torah [Lei escrita] nem a Mishná [lei falada]. Reconciliar é também pagar a dívida que é uma satisfação; e no caso, como é de pecados, podemos chamar de expiação. Como no AT a expiação pelo pecado se fazia através de um sacrifício [kipper] mediante a morte de uma vítima, tendo o sangue derramado, como símbolo de sua vida em oferenda. O pecado contamina o homem e interrompe sua amizade com Deus. Como a restauração [reconciliação] depende de Deus, o ofendido, este demanda um castigo pela ofensa. Devia ser a morte do ofensor, pois tal é justo castigo do pecado como rebelião contra o Senhor {não comerás..mas o dia em que dela comerdes, tua morte estará marcada (Gn 2, 17)}. Assim foi o castigo dos anjos rebeldes, cuja vontade de retificar [arrependimento] é impossível por natureza, ao escolher o mal como forma de vida. No homem, imperfeito no conhecimento e débil na vontade, existe a possibilidade de retratação e arrependimento. Por isso, Deus que é amor, oferece ao pecador um meio de reparação que é o sacrifício, no qual o homem demonstra sua culpa e oferece uma expiação: uma morte no lugar de sua própria morte. As oferendas do AT eram imperfeitas e não perdoavam o pecado em si mesmas. Porém, o Filho do Homem ofereceu-se a ser vítima perfeita, como cordeiro que tira o pecado do mundo (Jo 1, 36). O pagamento é considerado por Paulo como a paga devida para libertar um escravo. No caso, esta paga é o Lytron [<3083>=redemptio]ou Apolytrösis [<629>=redemptio], cuja tradução é redenção ou libertação. Nota: como vemos, a libertação bíblica nada tem a ver com a Teologia da Libertação. MINISTÉRIO DA RECONCILAÇÃO: o homem não reconcilia, mas forma parte da reconciliação como ministro, ou servidor da mesma, de duas maneiras: 1) Como pregador do evangelho, que Paulo chama evangelho da paz. Paz com Deus e paz entre os dois povos inimigos: judeus e gentios, ou gregos, como Paulo gosta de dizer (Ef 2, 14); porque ambos formam uma nova família, a de Deus (Ef 5, 18). 2) Como delegado para o perdão, por meio especialmente do sacramento da penitência ou reconciliação, em que os poderes foram recebidos como enviado através da efusão do Espírito que é enviado por Jesus (Jo 20, 21-22) em pleno poder após sua ressurreição (Mt 28, 18). Deus escolheu o homem especial, unido a sua divindade, Cristo Jesus, para obter por seu sacrifício a apolytrosis do pecado do mundo; e este escolheu, entre seus apóstolos e os sucessores, os homens para a reconciliação e, fora disso, não existe reconciliação [katallagë] verdadeira porque não é questão só de arrependimento, mas de aceitação do mesmo por Deus, através do Filho e dos filhos que a este último representam. Com esta reflexão, podemos ver a parcialidade dos que afirmam que basta a contrição individual para que o pecado seja perdoado. Precisa-se de um ministro da reconciliação como meio ordinário. E, portanto, Deus não perdoa se a igreja não intervêm e a Igreja não perdoa se a ela não é pedido o perdão.
O RECONCILIADOR: Como Deus era em Cristo o reconciliador do mundo consigo, não imputando-lhes as suas transgressões e pondo em nós a palavra da reconciliação (19). Quoniam quidem Deus erat in Christo mundum reconcilians sibi non reputans illis delicta ipsorum et posuit in nobis verbum reconciliationis. Paulo continua a explicação do que é a verdadeira reconciliação, que provêm como causa efetiva do próprio Deus e não do homem; por isso fala de que a reconciliação estava em Cristo, o verdadeiro reconciliador do mundo com Deus. Este título de RECONCILIADOR [Katallassön<2644>=reconcilians] é próprio de Cristo, ou Jesus ressuscitado. Pois se Cristo tem o significado de Messias [ungido], essa unção é definitiva e total em sua atuação entre os homens após o envio do Espírito como afirma João (Jo 7, 39). Em Cristo, Deus condensa o esquema, o autor, os sujeitos, o método e os meios da reconciliação. Como afirmavam os anjos aos pastores, com Jesus nasceu um Salvador, o Cristo Senhor (Lc 2, 11); e, portanto, a paz, produto da reconciliação, entrava de cheio nos planos divinos, que aceitavam os homens como queridos por sua benevolência (Lc 2, 14). Deus amou tanto o mundo que entregou seu Filho Único para que todo homem que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna (Jo 3, 16). É Cristo quem, em sua epístola, declara como vítima de expiação por nossos pecados e não somente pelos nossos [de Israel], mas também pelos do mundo inteiro (1Jo 2, 2). CONSIGO: Esta palavra responde ao grego Eautö [=sibi] que claramente indica quem foi o ofendido [Deus] e quais os ofensores [os homens]; sendo o pecado, ou desobediência aos mandatos divinos, o motivo e causa da ofensa, pois todos pecaram (Rm 3, 23). Nota: Como comentário extra, fora do texto atual, a única maneira do homem obter algum mérito para que seus pecados sejam perdoados é perdoar: perdoa nossas ofensas assim como nós perdoamos nossos ofensores (Mt 6, 12). Palavras que serão comentadas expressamente pelo Senhor : se perdoardes, vosso Pai celeste também vos perdoará mas se não perdoardes também vosso Pai não vos perdoará (Mt 6, 14). Aqui temos a condição exigida ao homem para que a reconciliação seja cumprida em sua perfeição. A PALAVRA DA RECONCILIAÇÃO: Essapalavra não é unicamente o anúncio do evangelho, mas a palavra de perdão tal e como oferece a Igreja, em nome de Cristo, no sacramento da reconciliação. Com a sua morte, o pecado do mundo [em termos gerais e absolutos] é perdoado. Com o sacramento, o pecado individual entra dentro dessa reconciliação geral. De modo que todo pecado pode ser perdoado a não ser o cometido contra o Espírito Santo, que é a Pessoa atualmente dirigindo a providência ou economia divina. O Espírito deve ser quem anima nosso ser transformando-o de natural [psikicos] em espiritual (1 Cor 15, 44) para que seja possível a ressurreição. Se a Ele, ao Espírito, não queremos receber, como pode habitar em nós para nos tornar como diz Paulo, justos e santos na verdade?(Ef 4, 24).
EMBAIXADORES: Por meio de Cristo, pois, somos embaixadores: como chamados de Deus, por nosso meio, os rogamos em lugar de Cristo: reconciliai-vos com Deus (20). Pro Christo ergo legationem fungimur tamquam Deo exhortante per nos obsecramus pro Christo reconciliamini Deo. EM LUGAR DE: Yper [<5228>=pro] tem o significado de 1)preposição de lugar como acima sobre através. Não é nosso caso, pois não ocorre desta forma no NT. 2) como por, a causa de. Orai pelos que vos caluniam (Lc 6, 28) 3) em lugar de, em vez de como em 1Cor 15, 29: batizados en lugar [yper] dos mortos. Ou Cristo morreu em lugar de todos [si unus pro omnibus mortuus est, ergo omnes mortui sunt] (2 Cor 5, 15). Qual delas é a melhor tradução? Creio que escolher a 3ª é uma escolha que não está fora do pensamento fundamental de Paulo nesta períciope. Máxime que Paulo usa o dia [por meio de] no mesmo parágrafo por nosso meio. Logo a tradução seria em lugar de Cristo ou fazendo as vezes de Cristo somos embaixadores porque estes estão em lugar do Senhor ou rei que os manda. Paulo fala de EMBAIXADORES [presbeuö<4243>=legationem fungere] em plural o que indica que existem vários homens que têm esse ministério, e não é próprio unicamente de Paulo. O embaixador está no lugar do rei com plenos poderes para estabelecer a paz ou a guerra, a reconciliação neste caso. Mais ainda repete de novo Yper Xristou como sendo a voz de Cristo que Paulo seu embaixador usa como procuração e mandato: Reconciliai-vos com Deus.
A TROCA: Pois àquele, que não conheceu pecado, por nossa causa, fê-lo pecado para nos tornarmos justiça de Deus nele (21). Eum qui non noverat peccatum pro nobis peccatum fecit ut nos efficeremur iustitia Dei in ipso. Para poder castigar o próprio Filho, inocente e sem culpa alguma, Deus o FEZ PECADO: [Amartian epoiësen]. A frase é célebre e propriamente significa que Deus viu nele o pecado de todos os homens, ou o considerou como se todo ele fosse um proscrito, totalmente cheio de pecado, de modo que em Cristo só viu pecado e assim como nEle viu, no batismo, o Filho amado em quem encontro meu agrado (Mt 3, 17), pois cumpria toda justiça ou desejo do Pai, agora só vê nEle a iniquidade e se afasta de tal modo que Cristo sente esse abandono e deve exclamar Meu Deus por que me tens abandonado?(Mt 27, 40). Deus castigou o justo para perdoar o pecador. Assim a justiça encontrou em Cristo o pecado e nos homens a figura do seu Filho como justificados pelo sacrifício da cruz. Isso é o que Paulo pretende dizer com a frase nos tornamos JUSTIÇA nEle [em Cristo]: Para nos tornarmos Justiça de Deus nEle, ou seja, sem pecado por meio de Cristo, ou melhor, porque Cristo está no nosso lugar ante Deus.
EVANGELHO
(Lc 15, 1-3; 11-32)
INTRODUÇÃO: Os três primeiros versículos constituem uma introdução para apontar os interlocutores de Jesus nas três parábolas que ele pronunciou: a ovelha tresmalhada, a moeda perdida, e o filho pródigo. Das três, hoje encontramos na leitura evangélica a última delas. Em todas encontramos como base a estima e o amor pelo extraviado do dono dos objetos, ou do pai para com o filho. Tudo natural e normal, dentro dos costumes humanos mais puros e simples de todos os tempos. Jesus não identifica o pecador com o malvado, mas com o desgarrado e perdido que é preciso buscar e acolher e em cujo encontro todos devem se orgulhar e regozijar. Pelo que respeita à parábola de hoje, há um substrato que resultava claro na época e que hoje dificilmente podemos avaliar: os dois filhos representam respectivamente as duas facções em que dividiam os antigos a humanidade: os justos perante a Lei, como eram os bons fariseus, e os pecadores entre os quais necessariamente se incluíam os gentios e parte do ham haaretz [povo da terra] que não mostrava muito interesse nos detalhes da Lei. Autores há que afirmam ser esta parábola o evangelho do evangelho. Explica a atitude verdadeira de Cristo que não é outra que a do próprio Deus, como Pai, não unicamente dos bons, mas também, sem distinção, dos que nós chamamos maus. A infinita bondade do Pai Deus [pai antes do que Deus] explica a existência do mal porque encontra no perdão maior alegria do que pode obter da conduta dos poucos ou muitos bons que não exigiriam sua misericórdia. Esta e não outra é a conclusão real da parábola, embora tenhamos uma outra que reflete a mesquinharia do homem: a inveja e o desgosto provocado no homem justo, ao se ver, no ato do perdão do pecador, como preterido e humilhado.
A AUDIÊNCIA: Estavam, pois, se aproximando a Ele todos os publicanos e os pecadores para ouvi-lo (1). Erant autem adpropinquantes ei publicani et peccatores ut audirent illum. Sabemos quem são os PUBLICANOS, dos quais temos falado no III Domingo do advento C. Também em outro comentário temos explicado o significado em Lucas especialmente da palavra PECADOR [amartolos, peccator], que preferimos traduzir como classe, por gentios no seu plural. Autores evangélicos traduzem por descridos. Nisso vemos duas coisas importantes: 1ª, Que amartolos, sendo um nome não pode ser traduzido por pecador, um adjetivo, como é no caso de Pedro ao se declarar ¨Homem Pecador¨,(=aner amartolos eimi em Lc 5, 8). 2ª, Que os evangelistas identificam o nome amartolos, ou em plural amartoloi, com os gentios como vemos em Lc 27, 4, quando Jesus declara que será entregue nas mãos dos pecadores o que é confirmado por Mt 26, 45 e Mc 14, 41. Vamos acrescentar mais um dado final: Paulo falando de si mesmo dirá aos gálatas: Nós somos por natureza judeus e não pecadores, dos gentios (Gl 2,15). De fato, os doutores não criticam Jesus por estar com publicanos, que eram os máximos pecadores entre os judeus; mas por tratar e especialmente comer com os gentios ou pagãos, fato que a Mishná proibia. O amartolos não era, pois o Hattá do AT que sai 18 vezes e significava um pecador contumaz que é sujeito ao castigo por causa de suas práticas (Nm 32, 14); mas era o Harel, o incircunciso. No NT a palavra incircunciso sai pela primeira vez em At 11, em sentido próprio. Pedro tinha entrado na casa de Cornélio, o centurião, e foi censurado, pois entraste na casa de homens que tem prepúcio e comeste com eles¨. Em sentido figurado, o encontramos em At 7, 51, quando Estêvão recrimina os membros do Grande Sinédrio de Jerusalém e os chama de incircuncisos de coração e ouvidos. Paulo fala da circuncisão (peritomé) como condição que alguns punham para entrar no cristianismo, e da incircuncisão (akrobystia). Como amostra temos Ef 2,11: ¨Acordai-vos que vós éreis antes, as nações na carne, os chamados prepúcio por aqueles que se intitulavam circuncisão na carne, por mãos humanas¨. Estas palavras (peritomé e akrobystia) não saem nos evangelhos. Só a palavra éthnos (=raça, povo) e em plural ta éthne significando as nações fora do judaísmo. Daí que nos vejamos inclinados a traduzir amartolos por pagão ou idólatra. Assim entenderemos melhor a acerba crítica dos fariseus e doutores contra Jesus por comer com pagãos. OS GENTIOS: A razão de se separar dos gentios ou idólatras, era dupla: evitar qualquer culto idolátrico e desviar-se de impurezas no trato com os mesmos. 1°) Do primeiro caso, temos a proibição de vinho, vinagre de vinho, vasos de barro, especialmente os chamados de Adriano, e peles com buraco no coração. Também eram proibidos, segundo a Mishná, no tratado de Aborá Sadá (idolatria), os alimentos salgados em sal, e os queijos, especialmente da Bitínia. As razões eram as libações sagradas, às quais os vinhos eram submetidos. Para se ter uma ideia, também os judeus tinham suas libações em que o vinho era oferecido, agitando-o em cruz sobre o altar, primeiro na horizontal e logo na vertical. O vinagre, que antes era vinho, tinha logicamente sido oferecido aos deuses ou penates dentro das próprias casas. Os vasos de barro porque estes podiam ser contaminados pelos líquidos, e estava determinado que fossem quebrados, o que logicamente não faziam os gentios. Já se fossem de pedra, isso não acontecia, e por isso as vasilhas para a purificação eram de pedra (Jo 2,6). Os vasos de Adriano, derivados deste imperador por talvez terem seu nome e sua imagem. Peles com buraco no coração porque eram produtos de um sacrifício em que o coração era retirado antes de morrer o animal. E os queijos, porque acostumavam usar leite coalhado de animais mortos. Também nas casas dos gentios se encontravam deuses penates no mínimo, o que proibia a entrada para um judeu como no caso das asherás, árvores em cuja base estava o ídolo correspondente, impedindo de se assentar na sua sombra. 2°) No segundo caso, temos as impurezas. As casas dos gentios eram impuras. Quanto tempo deve ter habitado o gentio para ser necessária a prescrição? Quarenta dias (indica uma relação com o fluxo menstrual). As mais importantes entre as impurezas eram as procedentes de mortos e de sangue ou ejaculações como blenorragia ou simples masturbação. Logo são os alimentos. Dentre as primeiras temos a regra das mulheres, que se eram gentias não observavam os períodos de menstruação. O pus dos doentes e os esputos também entravam entre os materiais que acarretavam impurezas, de modo que, como exemplo, citamos a proibição de transitar por uma rua em que houvesse mulheres imbecis (que não entendiam a impureza de sua saliva no tempo de menstruação), samaritanas, ou pagãs. Todos os esputos na cidade serão impuros (toharoth). Se considerava uma casa impura quando entrava nela um publicano, um gentil ou uma mulher (esta por causa da menstruação). Os alimentos: Sabemos como determinados alimentos eram também impuros como era a carne de porco. RESULTADO: Os fariseus tinham razão ao criticar Jesus, pois, segundo a Mishná, era praticamente uma imoralidade semelhante trato com os gentios.
FARISEUS E GRAMÁTICOS: E resmungavam os fariseus e os escribas[grammateis] dizendo que este recebe pecadores e come com eles (2). FARISEU é o nome dado a um grupo de judeus devotos da Torá, surgidos no século 2 a.C. A palavra Fariseu provém do grego pharisaioi, que é umatransliteração do aramaico perishaya que por sua vez corresponde ao hebraico perushim, provavelmente ligado ao hebraico parush que basicamente quer dizer separar, afastar, explicar, esclarecer. Assim, o nome perushim é normalmente interpretado como aqueles que se separaram do resto da população comum para se consagrar ao estudo da Torá e das suas tradições. Todavia, sua separação não envolvia um ascetismo, já que julgavam ser importante o ensino à população das escrituras e das tradições dos pais. A origem mais provável dos perushim é que tenham surgido do grupo religioso judaico chamado hassidim (os piedosos), que apoiaram a revolta dos macabeus (168-142 a.C.) contra Antíoco IV Epifânio, rei do Império Selêucida, que incentivou a eliminação de toda cultura não-grega através da assimilação forçada e da proibição de qualquer fé particular. Uma parte da aristocracia da época e dos círculos dos sacerdotes apoiaram as intenções de Antíoco, mas o povo em geral, sob a liderança de Yehudah Makkabi (Judas Macabeu ) e sua família revoltou-se. Os judeus conseguiram vencer os exércitos helênicos e estabelecer um reino judaico independente na região entre 142 a.C.- 63 a.C., quando então foram dominados pelos romanos. Durante este período de 142-63 a.C., a família dos macabeus estabeleceu-se no poder e iniciou uma nova dinastia real e sacerdotal, dominando tanto o poder secular como o religioso. Isto provocou uma série de crises e divisões dentro da sociedade israelita da época, visto que pela sua origem os Macabeus (também conhecidos pelo nome de família como Asmoneus) não eram da linhagem de Davi, não podendo assim ocupar o trono de Israel, e também não eram da linhagem sacerdotal de Tzadok [ou Sadoch]. Grupos reacionários apareceram dentro da sociedade judaica, tentando restabelecer o seu prestígio e poder, ou pelo menos o que eles consideravam como certo, segundo a Lei e tradições judaicas. Assim, foi nesta época que provavelmente apareceram: 1) Os tzadokim(saduceus), clamando ser os legítimos descendentes de Tzadok e portanto os legítimos detentores do sumo-sacerdócio e da liderança religiosa em Israel. 2) Os Perushim (fariseus), oriundos dos hassidim que, geralmente, desiludidos com a política, voltaram-se para a vida religiosa e o estudo da Torá, esperando pela vinda do Messias e do reino de Deus. 3) Os Essênios, oriundos provavelmente também dos “Hassidim” e de um grupo de sacerdotes descontentes com a situação, que se afastaram da sociedade judaica em geral e foram viver uma vida de total consagração ao Criador, na região do deserto, a fim de prepararem o caminho para a vinda do Rei Messias. Os fariseus, opositores dos saduceus, criaram uma Lei Oral, em conjunto com a Lei escrita, e foram os criadores da instituição da sinagoga. Com a destruição de Jerusalém em 70 d.C. e a queda do poder dos saduceus, cresceu sua influência dentro da comunidade judaica e se tornaram os precursores do judaísmo rabínico. Os Perushim se agrupavam em “havurot” [de havurah, derivado de habar ou havar, que significa amigo], associações religiosas que tinham os seus líderes e suas assembleias, e que tomavam juntos as suas refeições. Segundo Flávio Josefo, historiador judeu do 1º século d.C., o número de perushim na época, era de pouco mais de seis mil pessoas (Antiguidades Judaicas 17, 2, 4; § 42). Eles estavam intimamente ligados à liderança das sinagogas, ao seu culto e escolas. Eles também participavam como um grupo importante, ainda que minoritário, do Sinédrio, a suprema corte religiosa e política do Judaísmo da época. Muitos dentre os “perushim” tinham a profissão de sofer (escriba), ou seja, a pessoa responsável pela transmissão escrita dos manuscritos e da interpretação dos mesmos. Duas escolas de interpretação religiosa se desenvolveram no seio dos perushim e se tornaram famosas: a escola de Hillel e a escola de Shammai. A escola de Hillel era considerada mais “liberal” na sua interpretação da Lei, enquanto a de Shamai era mais “estrita”. O cristianismo perpetuou através da história uma visão estereotipada dos “perushim” junto aos escribas e saduceus, como os adversários de Jesus, que ataca duramente seu orgulho, sua avareza, sua hipocrisia e, sobretudo, o perigo de crer que a salvação vem da lei. No entanto, os “perushim” eram uma seita de grande influência em Israel devido ao ensino religioso e político. Aceitavam a Torá escrita e as tradições da Torá oral, na unicidade do Criador, na ressurreição dos mortos, em anjos e demônios, no julgamento futuro e na vinda do rei Messias. Eram os principais mestres nas sinagogas, o que os favoreceu como elemento de influência dentro do judaísmo após a destruição do Templo. São precursores por suas filosofias e ideias do judaísmo rabínico. Mas, em tempos de Jesus, quem eram verdadeiramente os fariseus? Existem três tipos diferentes de fontes históricas para explicar sua origem. 1º) A literatura rabínica. Os rabinos dos séculos II ao VI são considerados como sucessores dos fariseus. 2º) A segunda fonte são os livros de Flávio Josefo (37-100 dC) e 3º) A terceira são os livros do NT. As conclusões destes últimos escritos parecem estar em contradição com as das primeiras fontes. A conclusão final é de que sabemos menos dos fariseus do que se pensava 40 anos antes. Por isso devemos estudar alguns que a si mesmo se intitularam fariseus e não estudar o grupo como uma coletividade uniforme e monolítica. Os escritos cristãos adoecem de universalizar a todos os fariseus como sendo o grupo dos escribas e tendo como nota característica a rejeição de Jesus. Nem todos eram assim. Existe uma crescente opinião de não considerar os sábios tanaíticos [os que redataram a Mishná, Toseftá e Midrases haláquicos] como necessariamente fariseus ou discípulos dos mesmos. Expliquemos: Mishná é a escrita da Lei oral, Toseftá são os comentários suplementares da Mishná e Midrás é o estudo da Torá baseado na interpretação do texto escrito versículo por versículo e até letra por letra. A Halaká trata sobre a lei e preceitos e a Haggadá sobre narrações. Os materiais, logo redigidos por escrito, provém do século I aC até a sua escrita no século III dC. O primeiro indivíduo histórico que podemos considerar propriamente fariseu é um tal Eleazar, figura chave da ruptura entre João Hircano (134-104 aC) e os fariseus. Durante um banquete oferecido por Hircano para os amigos fariseus só Eleazar pediu que Hircano renunciasse a exercer o Sumo Sacerdócio, por não ser descendente de Sadok. Irritado, Hircano mandou açoitá-lo, mas considerando essa pena leve demais, rompeu com os fariseus, dos quais tinha sido discípulo e se aproximou dos saduceus, seus adversários. Nos evangelhos, os dois fariseus que aparecem com nome próprio, são partidários de Jesus: Simão (Lc 7, 40-44) em cuja casa come Jesus. (São também fariseus outros dois hóspedes cujos nomes não são citados, talvez indicando as refeições chamadas havurot). O outro nome é o de Nicodemos que, à noite, visita Jesus ( Jo 3, 1-15) e era membro do Sinédrio (Jo 7, 50-52), onde defende a inocência de Jesus antes de ser condenado e que participa do enterro como discípulo (Jo 19, 39). As outras citações, até 90, em que se nomeiam os fariseus, estes últimos são citados em plural. Nos Atos, Lucas menciona dois fariseus: Paulo e seu suposto mestre Gamaliel, este citado em duas ocasiões: 5, 34 e 22, 3. Ele e seu filho, Simeão ben Gamaliel, certamente são considerados como fariseus por seus conterrâneos. Gamaliel foi favorável a deixar em liberdade os discípulos de Jesus, pois se verdadeiramente procede de Deus [sua doutrina] correremos o risco de lutar contra Deus. Paulo, o segundo nome dos Atos considerado como fariseu e filho de fariseus (At 23, 6), relata em primeira mão sua filiação em Fp 3, 5-6. Ao dizer quanto a Lei fariseu, indica que a interpretação da mesma tinha outros intérpretes, que sabemos eram os saduceus. O próprio Paulo explica como era a interpretação da Lei pelos saduceus, ao escrever: meu excesso de zelo pelas tradições paternas (Gl 1, 14). Parece que esta era a característica da assim chamada seita: a akribeia [precisão] cuidado com a qual a lei era interpretada. No seu discurso perante os judeus amotinados contra ele no templo (At cap 22), Paulo parece indicar que o verdadeiro fariseu não está contra a fé em Cristo. No concílio de Jerusalém encontramos um grupo de cristãos que tinha sido da seita dos fariseus e que haviam abraçado a fé (At 15, 5). Porém dos evangelhos temos uma noção não muito favorável dos fariseus, especialmente quando unidos à classe dos escribas. ESCRIBA: Escriba ou escrivão era a pessoa na Antiguidade que dominava a escrita e a usava para, a mando do regente, redigir as normas do povo daquela região ou de uma determinada religião. Nos livros sagrados para os cristãos e judeus, o termo escriba refere-se aos chamados doutores e mestres (cf. Mateus 22,35; Lucas 5,17), ou seja, homens especializados no estudo e na explicação da lei ou Torá. Embora o termo apareça pela primeira vez no livro de Esdras, sabe-se que tinham grande influência e eram muito considerados pelo povo, tendo existido escribas partidários de diferentes correntes, tais como os fariseus (a maioria), saduceus e essênios. História A classe começa a atuar ainda nos tempos do Antigo Testamento, em que a figura do profeta perde o seu valor. Já no Novo testamento, é possível verificar que a maioria dos escribas se opõe aos ensinamentos de Jesus (cf. Marcos 14,1; Lucas 22,1), que os critica duramente por causa do seu proceder legalista e hipócrita (cf. Mateus 23,1-36; Lucas 11,45-52; 10,46-47), comparando-a à dos fariseus, pois a corrente farisaica era representava pela maioria dos escribas. Após o desaparecimento do templo de Jerusalém no ano 70, seguido do desaparecimento da figura do sacerdócio judaico, sua influência passaria a ser ainda maior. Figuras de destaque Alguns escribas ficariam famosos, tais como Hillel e Sammai (pouco antes de Jesus Cristo), tendo sido ambos, líderes de tendências opostas na interpretação da lei, liberal o primeiro e rigoroso o segundo. Gamaliel, discípulo de Hillel, foi mestre de Paulo (cf. Atos 22,3), tendo existido também outros escribas simpatizantes dos cristãos. (cf. Atos 5,34). Na condena de Jesus os que influíram não eram os fariseus como seita, mas os escribas junto com os chefes sacerdotais e os anciões que constituíam o Sinédrio de Jerusalém (Mt 20, 18 Mc 8, 31 e Lc 9, 22 com palavras do próprio Jesus). Nos oito impropérios contra os escribas e fariseus de Mateus 23, 13-29, sempre o escriba está antes do fariseu e o motivo é precisamente sua hipocrisia , falsidade, dobrez, ou fingimento. PECADORES: Como temos explicado em outras ocasiões, provavelmente em Lucas, é a palavra que substitui pagãos ou idólatras. Segundo a Mishná, todo contato com eles era causa de impureza, que constituía o motivo de que Javé se afastasse do homem que a contraia, como de um pesteado ou malvado indigno de convivência. Em lugares paralelos, Mateus une aos pecadores os publicanos, coisa que também faz Lucas em 5, 30, em ocasião do banquete oferecido, a raiz da conversão de Levi, e a pergunta foi dirigida aos discípulos de Jesus.
A PARÁBOLA: 1ª PARTE: A DEFESA
OS DOIS FILHOS: Disse pois a eles esta parábola, contando(3):Certo homem tinha dois filhos(11). Então disse o mais novo deles ao pai: Pai, dá-me a parte do patrimônio que me corresponde. E dividiu entre eles a fortuna (12). Et ait ad illos parabolam istam dicens Homo quidam habuit duos filhos. Et dixit adulescentior ex illis patri pater da mihi portionem substantiae quae me contingit et divisit illis substantiam. O texto evangélico passa por alto as duas parábolas da ovelha tresmalhada e da dracma perdida e se centra na parábola comumente chamada do filho pródigo. Consideramos as circunstâncias que acompanham a saída do filho menor como forma literária e não fundo alegórico, embora tenha uma base verdadeira na vida real. CERTO HOMEM indica um latifundiário judeu abastado e os dois filhos preparam o ouvinte para a segunda parte da parábola, com a distinção entre as duas condutas, mas com a unicidade do amor do pai, que, como o pastor ou a dona da casa, procura o que estava perdido como objeto primário de sua afanosa angústia. DIVIDIU A FORTUNA: Segundo costumes ancestrais, o pai podia dispor de seus bens de duas maneiras: Ou por testamento que seria válido na hora de sua morte, ou por meio de doação em vida (donatio inter vivos). Embora esta prática fosse desaconselhada em Ecl 33, 19-23, parece ser a mais usual na época. A herança do primogênito devia ser o duplo da soma correspondente a seus irmãos (Dt 21, 17), ou seja, dois terços da herança total. Outros falam que o filho menor nesse caso deveria receber dois nonos do total. O filho recebia unicamente o título de propriedade, enquanto o pai retinha o usufruto dos bens até a sua morte. Se o filho vendia sua parte, o comprador só poderia tomar parte dos bens após a morte do pai, quando o filho vendedor perdia todo direito. A divisão, pois da fortuna ou bens não significa a transferência da propriedade, mas da uma parte da mesma ao filho. Por isso, no final da parábola, o pai atua como verdadeiro proprietário dando ordens aos empregados, mandando matar o melhor terneiro etc.
A FUGA: Assim, após não muitos dias, tendo reunido todas as coisas, o filho mais novo se exilou a uma região distante, e ali dissipou seus bens vivendo desregradamente (13). Et non post multos dies congregatis omnibus adulescentior filius peregre profectus est in regionem longinquam et ibi dissipavit substantiam suam vivendo luxuriose. O genitivo absolutode REUNIR TODOS OS BENS, significa converter os mesmos em dinheiro vivo ou cash. Temos traduzido por EXILAR-SE um verbo que pode ter o significado de emigrar especialmente quando temos que a região almejada é distante. Provavelmente um território da diáspora. Considerava-se que na diáspora havia 4 milhões de judeus e que na Palestina eram um pouco mais de 500 mil. Havia um judeu por cada seis habitantes nesse mundo que se conhece como oikoumene. A emigração era devida não tanto às oportunidades comerciais que oferecia a diáspora, pois os judeus podiam trabalhar no comércio, na banca e como artesãos e entre os romanos só os escravos o faziam. Segundo os costumes judaicos, o mais jovem teria entre 18 e 20 anos, pois não estava casado e aquela era a idade normal do casamento. E lá ESBANJOU SUA FORTUNA [substância segundo texto grego que o latino traduz literalmente]. A maneira de fazê-lo foi uma vida dissoluta, que geralmente é associada ao vinho, jogo e mulheres, como um crápula e da qual o irmão dirá foi dissipada com meretrizes.
A FOME: Depois, pois, dele ter esbanjado tudo, surgiu uma forte fome naquela região e ele começou a passar necessidade (14). Et postquam omnia consummasset facta est fames valida in regione illa et ipse coepit egere. A FOME era uma epidemia frequente na antiguidade. Foi a causa pela qual Jacó enviasse seus filhos ao Egito em busca de provisões (Gn cap 42). Sabemos como Herodes, o Magno, vendeu até sua vasilha de prata para obter trigo num período de fome. Como Paulo trouxe esmolas para Jerusalém para aliviar a fome dos irmãos, provavelmente nos tempos do imperador Cláudio (41-54) que foi testemunhada por Josefo em suas antiguidades.
CUIDADOR DE PORCOS: E tendo saído, se associou a um dos cidadãos daquela região e o enviou a seus campos apascentar porcos(15). Et abiit et adhesit uni civium regionis illius et misit illum in villam suam ut pasceret porcos. O caso é dos mais humilhantes: um jovem judeu, de boa família, se transformando em PORQUEIRO, cuidando de animais que eram considerados entre os mais impuros e degradantes pela Lei (Lv 11, 7). Sabemos da atitude dos sete irmãos aos quais obrigavam a tocar carne de porco ou comer da mesma como outros traduzem (1 Mc 7,1). A atitude rabínica sobre o cuidador de porcos, está magnificamente expressa nesta imprecação: Maldito o criador de porcos e maldito quem instrui a seu filho na sabedoria grega. Além disso, não poderia santificar o sábado e estava disposto a renegar de sua religião por causa da impureza constante.
A REALIDADE: E desejava encher o seu ventre das glandes [bolotas] que comiam os porcos e ninguém dava a ele ( 16). Et cupiebat implere ventrem suum de siliquis quas porci manducabant et nemo illi dabat. O único alimento que tinha eram as glandes ou bolotas do carvalho, que os judeus chamavam alimento de bestas. Mas ninguém dava a ele. É um tanto irreal, ou kafkiano como dizem, pensar que ele não pudesse comer de um fruto que naturalmente cai dos carvalhos e é de livre escolha no chão inculto da floresta.É uma maneira exagerada de descrever a fome intensa do jovem da narração parabólica. Ou talvez por considerar essa alimentação de um fruto que não lhe pertencia como um roubo.
O ARREPENDIMENTO: Voltando, pois, em si disse: Quantos jornaleiros do meu pai abundam de pães, porém eu pereço de fome (17). In se autem reversus dixit quanti mercennarii patris mei abundant panibus ego autem hic fame pereo. VOLTAR EM SI significa em termos bíblicos arrepender-se ou fazer penitência. São duas as causas principais que o incitam ao arrependimento: a diferença entre a comida atual, e o pão abundante. E a outra é a comparação entre ele, um filho e os jornaleiros do campo que percebiam um mínimo de jornal, e não obstante estavam em condições muito melhores. Como ele depois dirá ao pai, quer ser tratado como um desses jornaleiros e não como filho.
O PROPÓSITO: Tendo-me levantado, irei a meu pai e lhe direi: Pai, pequei contra o céu e diante de ti (18). E de modo algum sou digno de ser chamado teu filho, faz-me como um de teus jornaleiros (19). Surgam et ibo ad patrem meum et dicam illi pater peccavi in caelum et coram te. Et iam non sum dignus vocari filius tuus fac me sicut unum de mercennariis tuis. TENDO-ME LEVANTADO, em aoristo, é uma maneira de falar dos semitas, quesempre estavam sentados nas tendas e era assim que falavam e decidiam seus compromissos. A menção do céu está no lugar de Deus e as duas preposições contra e diante são mera variação literária. De fato o jovem admite seu pecado que sempre tem uma origem na desobediência feita a Deus, e sabe que causou uma grande aflição a seu pai. A frase é uma fórmula estereotipada do AT como em Êxodo 10, 16 quando o faraó admite seu erro: Pequei contra Javé e contra vós. Ele tinha perdido todo direito a ser considerado como filho ao receber a herança na vida do pai e não podia pedir ajuda do mesmo. Por isso pede que seja tratado como um dos jornaleiros que trabalhavam no campo do pai. Assim devemos traduzir o faz-me [ou trata-me] como a um de teus jornaleiros.
O ENCONTRO: E tendo-se levantado, veio para seu pai; estando ele ainda longe o viu seu pai e se enterneceu (nas entranhas); e tendo corrido caiu sobre seu colo e o beijou repetidamente (20). Et surgens venit ad patrem suum cum autem adhuc longe esset vidit illum pater ipsius et misericordia motus est et adcurrens cecidit supra collum eius et osculatus est illum A descrição do pai, como se adiantando ao filho antes deste pedir seu perdão, e do sentimento expressado pelo verbo que significa um sentimento profundo que comoveu intimamente seu interior, o verbo correr ao encontro do filho, o abraço antes deste pronunciar uma só palavra e o beijo repetido que seria cumular de beijos, indicam como o pai esperava o filho e estava disposto a esquecer e perdoar. São detalhes que vão além do aspecto puramente literário para descrever o fundo do amor paterno em toda sua intensidade.
A CONFISSÃO: Lhe disse o filho: Pai, pequei contra o céu e diante de ti e em modo algum sou digno de ser chamado teu filho(21 Dixitque ei filius pater peccavi in caelum et coram te iam non sum dignus vocari filius tuus. As palavras do filho são calcadas do seu propósito que vimos no parágrafo dos versículos 18 e 19.
REAÇÃO DO PAI: Disse o pai a seus escravos: Trazei a veste [stolë <4749> stole], a principal; vesti-o; e dai um anel na mão dele, e calçado nos seus pés(22). E, tendo trazido o terneiro engordado, matai e, comendo, regozijemos (23). Dixit autem pater ad servos suos cito proferte stolam primam et induite illum et date anulum in manum eius et calciamenta in pedes. Et adducite vitulum saginatum et occidite et manducemus et epulemur. A palavra que o latim traduz propriamente por servi, que na época apontava aos escravos, mas que, nas línguas vernáculas, perdeu seu primitivo significado ao confundi-lo com os servos da terra medieva, com o qual se dulcifica o verdadeiro significado. José recebe do faraó como seu grande visir um vestido novo, um anel e um colar de ouro no pescoço (Gn 41, 42). A veste chamada estola era um distintivo das classes sociais altas, um vestido longo até os calcanhares, impróprio da túnica dos trabalhadores, curta até as coxas. Era a túnica talar ou estola, o vestido talar próprio dos oficiais e das mulheres, que chegava até os calcanhares, pois talares eram chamadas as asas de que estavam dotadas as sandálias de Mercúrio para melhor correr. Mercúrio era o deus grego do comércio e mensageiro dos outros deuses. A veste que o pai pede para o filho era a estola primeira ou principal, que alguns traduzem como de festa. Hoje diríamos a melhor de todas. No oriente significa uma distinção especial. Pois não existiam condecorações. O anel não era um adorno, mas um sinal de distinção e de que pertencia a um determinado clã, e era próprio das pessoas distinguidas que com ele assinavam documentos e selavam as cartas ou missivas. E o calçado, sandálias em geral, era próprio dos senhores, pois os escravos, em cuja categoria queria ser contado o filho, andavam descalços. A morte do terneiro, com artigo determinado, indica um dia especial de festa, pois era o animal cevado, ou alimentado especialmente para o engorde, que era reservado para os grandes dias de festa, como o casamento de um filho, ou o nascimento do primogênito. Ele era a base de um banquete especial, numa sociedade em que a carne não era alimento comum. O pai quer que todos reconheçam no jovem arrependido o filho, anterior a seus desvarios. Restitui-lhe o estado anterior, como se nada tivesse acontecido. Mais que perdão o pai oferece uma total reabilitação, superando toda expectativa possível. A razão desta conduta a explicará imediatamente no versículo seguinte.
RAZÃO DA ALEGRIA DO PAI: Porque este, o meu filho, estava morto e reviveu; e perdido era e foi encontrado. E começaram a regozijar-se (24). Quia hic filius meus mortuus erat et revixit perierat et inventus est et coeperunt epulari. Era a mesma alegria do pastor, da mulher dona-de-casa, por recobrar o que se pensava perdido; mas agora era maior, porque é a alegria do pai que pensava nunca mais volver a ver o filho, pois estava como morto para ele. Era ter um filho vivo, após pensar tê-lo perdido para sempre. E assim, sem mais demora, começaram a gozar da alegria comum. Ao banquete acompanhava a música com coros de palmas e baile dos varões presentes. Este seria o fim da parábola; mas ela tem uma segunda parte também dirigida aos espectadores, fariseus e escribas, não tanto para demonstrar por que Jesus aceitava pecadores, mas para recriminar a conduta deles como totalmente infundada e maldosa por causa da inveja.
2ª parte: A CENSURA
O FILHO MAIOR: Estava, pois, o seu filho, o maior, no campo e, como voltasse, se aproximou da casa, escutou a música e as danças (25). Então tendo chamado um dos servos dele perguntou que seriam aquelas coisas (26). Erat autem filius eius senior in agro et cum veniret et adpropinquaret domui audivit symphoniam et chorum. Et vocavit unum de servis et interrogavit quae haec essent. A jornada de trabalho terminava com a luz do sol, e era quando começava o jantar, a comida principal, e a hora do início dos banquetes. Estes estavam acompanhados de um coro de músicos que dançavam ao som de palmas e pandeiros com uma certa algaravia própria da exaltação sentimental dos orientais. Esta música e gritos ouviu o filho maior no meio do silêncio da entrada da noite, próprio dos tempos antigos. Estranhando, perguntou a causa de tudo isso.
A PERGUNTA: Ele então lhe disse: porque teu irmão veio, e matou teu pai o novilho cevado porque o recebeu saudável (27). Isque dixit illi frater tuus venit et occidit pater tuus vitulum saginatum quia salvum illum recepit O empregado, que o texto grego chama de pais [<3816>], cujo significado primeiro é menino, infante, filho, e que pode ter frequentemente o significado de criado, servo, especialmente quando o serviço é dentro da casa, responde fielmente à pergunta do seu amo.
INDIGNAÇÃO DO FILHO: Enfureceu-se, portanto e não queria entrar. Por isso o pai dele saiu rogando-lhe (28). Ele, pois, tendo respondido, disse a seu pai: Eis que todos estes anos te sirvo e nunca preteri mandato teu e a mim jamais deste um cabrito para que com meus amigos me regozijasse (29). Quando, pois, este teu filho, o que há devorado teu patrimônio com meretrizes, veio, mataste para ele o novilho cevado (30). Indignatus est autem et nolebat introire pater ergo illius egressus coepit rogare illum. At ille respondens dixit patri suo ecce tot annis servio tibi et numquam mandatum tuum praeterii et numquam dedisti mihi hedum ut cum amicis meis epularer. Sed postquam filius tuus hic qui devoravit substantiam suam cum meretricibus venit occidisti illi vitulum saginatum. A indignação do filho o afasta do banquete, da alegria de ver de novo seu irmão e o obriga a se indispor com a conduta do pai. Ele se nega rotundamente a admitir o irmão, seja qual fosse a atitude deste último e as condições em que se encontrava atualmente. Possivelmente a herança estava no meio dos dois irmãos. O pai teve que sair da casa e lhe dizia com boas palavras, ou seja, lhe rogava. O filho dá razões de peso para demonstrar que sua indignação tinha um motivo realmente forte: Tenho te servido fielmente. E qual tem sido a resposta? Nem um cabritinho me deste para comemorar numa festinha alegre, um dia com meus amigos. E contrasta a conduta do pai com respeito a ele, com a conduta atual com a qual o pai recebe o outro filho, a quem não quer chamar de irmão [este teu filho], como se ele, o irmão correto, não tivesse sido nunca tratado como filho pelo pai. E dá uma razão negativa para ser considerado verdadeiro filho: há devorado teu patrimônio com meretrizes. A conduta do irmão era duplamente vergonhosa: dilapidar o patrimônio do pai e fazê-lo de modo vexatório: com meretrizes, sem cabeça, sem proveito nenhum, como um pervertido. O contraste entre as condutas dos irmãos é evidente. O contraste na conduta do pai para com os dois filhos é palpável. Que espera o pai dele, o filho correto, a não ser a indignação e a repulsa mais justa e mais lógica como resposta?
AS RAZÕES DO PAI: Ele então lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo e todas as minhas coisas são tuas (31). Regozijar-se, pois e dançar convém, porque este, o teu irmão, estava morto e reviveu, e perdido estava e foi encontrado (32). At ipse dixit illi fili tu semper mecum es et omnia mea tua sunt. Epulari autem et gaudere oportebat quia frater tuus hic mortuus erat et revixit perierat et inventus est. O pai começa por usar um nome que indica ternura, teknon [<5043>] em oposição a huios [<5207>]. Este último não está unido a um afeto particular, mas indica unicamente o fruto de uma geração paternal. Já teknon é o filho querido, como descendente, como aquele que em si leva a imagem do pai, é o filho a quem se dedica amor e ternura. O pai afirma que não unicamente o bezerro cevado, mas tudo é dele, seu filho preferido. Mas nesse momento e circunstâncias existia uma poderosa razão para uma alegria extraordinária: Teu irmão estava praticamente morto, desaparecido e agora o encontramos de novo vivo e saudável. Não é isto um fato extraordinário e único para comemorarmos do modo mais alegre e festivo possível? CONCLUSÃO: Era preciso (dei em grego), necessário. Dos três verbos em que o grego indica uma certa obrigação (dei, chre e ofei) o dei é o mais incisivo, pois indica uma obrigação moral inevitável como quando Jesus afirma que o Filho do homem devia padecer para assim entrar na sua glória (Lc 24, 26). Era, pois, uma obrigação moral iniludível, não só admitir o filho extraviado, mas alegrar-se e recebê-lo com festa grande, porque era como quem recebesse um filho que estava praticamente morto e se salva do último transe.
REFLEXÕES: Jesus conta uma série de parábolas para indicar que sua conduta não está determinada por leis saídas de uma tradição humana (Mt 15, 6), mas pelo mais elementar procedimento que segue à lei natural das coisas. Será a ovelha ou a moeda perdidas, e agora a conduta do pai que tem dois filhos. Nos três casos Jesus entra como figura simbólica que encontra o que estava aparentemente e irremediavelmente perdido e em cuja busca se empenha até conseguir de novo o extraviado. A alegria do encontro supera as dificuldades da busca e é razão suficiente para a exultação do momento (15, 32). OS DOIS FILHOS: O motivo é porque a liberdade, o desejo de viver sem preocupações e com o máximo de desfrute é próprio dos mais novos e as despesas com os vícios de ostentação e luxúria facilmente dilapidam fortunas. Essas coisas não são objeto direto da parábola. A fome e o pastoreio dos porcos servem para destacar o infortúnio do filho rebelde. Jesus salientará a perda do filho como morto, diante do irmão e a nova vida quando encontrado de volta. A restituição do pai, que o trata como filho que nasce de novo, é o importante na parábola. Mas quem são os dois filhos e a que status correspondem eles? Pensamos não existir modelo preciso para afirmar representações específicas nas personagens da parábola. O importante era o retrato que se faz do amor do pai. Mas caso cheguemos a outras conclusões sobre a conduta dos filhos, acreditamos que o início do capítulo pode dar uma pista para a interpretação alegórica de sua identidade e suas respectivas condutas. Por isso é razoável pensar que o maior, obediente desde o nascimento e leal ao pai, é figura dos fariseus e doutores da lei. Em verdade eles eram fiéis à mesma, até nos pequenos detalhes (Mt 23, 23), introduzidos pela tradição. Homens santos que tinham dois grandes defeitos: a sua hipocrisia (Lc 12, 1) e a sua ostentação ou vaidade (Mt 6, 1). O filho menor representa o idólatra, o gentio. Era rejeitado e até odiado pelo judeu ortodoxo, porque, como temos visto antes, existia entre as duas raças ou classes um muro de separação, que Jesus destruiu na cruz, acabando com esse ódio secular (Ef 2, 14-16). Receber o filho que chamamos pródigo, como verdadeiro, era incompreensível para quem se tinha mantido a vida inteira fiel e observante. O PAI: Será Deus, ou será Jesus? Cremos que a parábola não pode se transformar numa alegoria em que cada personagem é uma figura simbólica de uma realidade. Por isso, mantenhamos a parábola no seu justo termo e pensemos que o pai é um pai comum que realmente ama seus filhos e sente a perda de um deles de modo a não poder resistir à alegria de encontrá-lo de novo. O pai está na mesma linha que o pastor que encontrou a ovelha desgarrada, que a mulher que achou a moeda perdida. Logicamente podemos pensar numa figura alegórica, o próprio Deus segundo aquilo que se diz: ¨Se vós que sois maus sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o vosso Pai que está nos céus dará coisas boas aos que lhas pedem¨(Mt 7,11).
PISTAS:
1)Jesus defende sua implicação com os ¨pecadores¨(gentios em particular) como parte do perdão que é acolhimento aos mesmos, oferecendo o exemplo do pai que recebe o filho perdoando-o totalmente, como se nada acontecesse ou melhor o encontro fosse com um filho bom. É um perdão sem limites, nem recriminações a uma conduta anterior por mais péssima que tivesse sido, pois é um filho que volta e merece ser amado e acolhido.
2) Jesus mostra o verdadeiro rosto de Deus, o Deus em quem devemos acreditar porque é o Pai que Jesus amava e que nos revelou como nosso Pai. Na parábola se revela como o amor que deseja salvar o que estava perdido. Ele deixa que o filho se perca. Mas sempre espera a sua volta, para recebê-lo sem recriminar sua conduta anterior.
3) Aparentemente o pai se despreocupa do filho que o abandonou. Porém não é assim. Ele sabe esperar, pois conhece que não pode forçar uma vontade alheia, mas reforçar um arrependimento, uma conversão que brotará do íntimo de uma consciência que finalmente reconhece seu erro e detesta sua conduta anterior. É então que o acolhimento é puro amor: esse dia é festa e júbilo.
4) Perante a opinião comum que pensa que uma vida só é digna se na balança os atos positivos de bem superarem os atos de delinquência e pecados, devemos supor que uma vida é positivamente julgada por Deus quando um ato bom pode nela ser contemplado. O mal não prescreve quando o bem, um ato mesmo solitário de bondade pode desequilibrar a balança do julgamento.
5) Podemos agir de duas maneiras diferentes: Criticando o perdão, resmungando sobre a aparente superioridade do mal que nos rodeia, como faziam os fariseus, ou esperando como o pai para que alguém retorne arrependido, dispostos a acolher como Jesus fez, amando os pecadores embora entregasse sua vida em sacrifício pelo pecado.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
CAMPANHA DA VELA VIRTUAL DO SANTUÁRIO DE APARECIDA
CLIQUE AQUI, acenda uma vela virtual, faça seu pedido e agradecimento a Nossa Senhora Aparecida pela sagrada intercessão em nossas vidas!
QUE DEUS ABENÇOE A TODOS NÓS!
Oh! meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno,
levai as almas todas para o céu e socorrei principalmente
as que mais precisarem!
Graças e louvores se dê a todo momento:
ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento!
Mensagem:
"O Senhor é meu pastor, nada me faltará!"
"O bem mais precioso que temos é o dia de hoje! Este é o dia que nos fez o Senhor Deus! Regozijemo-nos e alegremo-nos nele!".
( Salmos )
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