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MAR DE LETRAS

* por Luciano Pires

* Luciano Pires, formado em Comunicação Social, diretor de Comunicação Corporativa da Dana, cartunista premiado duas vezes no Salão de Humor de Piracicaba, colaborador de várias revistas, jornais e sites, conferencista e escritor.
E-mail: luciano@lucianopires.com.br
Internet: http://www.lucianopires.com.br

Acabo de chegar da Bienal do Livro, no Rio de Janeiro, onde participei como um dos debatedores no Café Literário desta noite.

Eu já me preparara para o que veria, pois a Bienal está bastante divulgada. Li entrevistas, assisti matérias, entrei no site. Mas descer no aeroporto e encontrar um motorista de terno me esperando... Ser hospedado num hotel excelente na orla de Copacabana... Preencher aquela fichinha de hóspede e escrever orgulhoso "escritor" no item profissão, já foram um prenúncio de que eu teria muito mais do que esperava. A Bienal está anunciada por todos os lados. É o acontecimento do Rio, aquele mesmo Rio do qual só recebemos notícias de tragédias toda noite pela TV.

O Riocentro parece uma festa. Durante a Bienal serão mais de 600 mil pessoas dentro e fora dos 55 mil metros quadrados dos três pavilhões, fervilhando pelos corredores, estandes, palestras e bate-papos.

Todo dia cerca de 25 mil meninos e meninas entre cinco e 15 anos, sempre em grupos de 40 a 50 estudantes uniformizados e acompanhados de professores percorrem os corredores. "Esse grupo é da terceira série do Ciep Procópio Ferreira, na zona norte da cidade. São meninos de favelas que quase nunca saem de lá", conta uma de suas professoras de leitura, Cristina Pego. "Eles se encantam com tudo que vêem no caminho e associar esse prazer ao livro também é função dessa visita".

As crianças se comportam como se aquilo fosse um parque de diversões.

E é.

Um parque de diversões onde a imaginação é o brinquedo principal.

Um mar de livros. Um mar de letras.

A Bienal é um evento comercial? Claro que sim, e só existe por sê-lo. Não fosse comercial seria uma reunião de meia dúzia de amantes de livros para falar de livros, num nível que nenhum humano comum entenderia.

O caráter comercial e sua utilização da mídia deram à Bienal o mesmo impacto das exposições de Rodin ou Picasso, que arrastaram milhares para Museus. E talvez esse seja o ponto chave.

A mídia dá prestígio a tudo aquilo que adota. A mídia cria modismos. Incentiva e motiva. Mais: transforma qualquer coisa em celebridade.

Daí minha velha tese de que, através da mídia, podemos mudar este país.

Quando a mídia entender que sua função é muito, mas muito mais que simplesmente entreter, informar e incentivar as pessoas a trocar seu dinheiro por produtos, criaremos uma máquina de mobilização que fará milagres.

Como os que eu vi no Rio, nos olhos daquelas crianças mergulhadas num mar de letras. Num tsunami cultural. Vivendo um momento capaz de despertar a paixão pela leitura.

Pois neste Brasil, onde demonstrar ignorância é prática socialmente aceita, "cult", e até motivo de orgulho, isso não é pouco.

É a solução.

Pena que a mídia, preguiçosa e míope, ainda prefere investir nos pocotós.


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